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STF corrige distorções e evita dupla cobrança de IR na pensão alimentícia

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Por Flávia Fagundes e Luis Eduardo Tavares do Santos
Atualização:
A estátua da Justiça, em frente ao Supremo Tribunal Federal. Foto: Dida Sampaio / Estadão

O Supremo Tribunal Federal decidiu no último dia 3 de junho, por maioria (6 votos a favor e 3 contra), que não há que se falar em incidência de Imposto de Renda da Pessoa Física por aquele que recebe pensão alimentícia. A decisão do Supremo é, a nosso ver, correta. No julgamento, foi analisada a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 5.422), ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

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Ainda não há o trânsito em julgado desta decisão, quando não é mais possível apresentar recursos. Qualquer medida tendente ao não recolhimento do tributo, por ora, dependerá de autorização judicial, sendo necessário consultar um advogado para verificar a viabilidade de não sujeição ao imposto.

Até a decisão do Supremo, o que havia na legislação tributária era verdadeiro bis in idem sobre o valor recebido como pensão alimentícia. Esse valor, pago em dinheiro a título de alimentos ou de pensão alimentícia (estabelecida com base no direito de família - não se cogita o mesmo entendimento a pensões alimentícias derivadas de ilícito, por exemplo), já havia, evidentemente, sido tributado daquele que aufere sua renda, paga o tributo e destina parte desta renda ao cumprimento de seu dever de prestar alimentos. Portanto, ao se tributar os valores recebidos a título de alimentos também daquele que o recebe - o alimentado -, se estaria tributando a mesma renda uma segunda vez.

O art. 153, III, da Constituição Federal determina que, na instituição de tributos pela União (o caso do Imposto sobre a Renda), a materialidade alcançada seja a renda. Isso significa que apenas quando do auferimento de renda que enseje efetivo acréscimo patrimonial é que poderá, então, haver a incidência tributária. Foi exatamente essa a linha de raciocínio adotada pelo ministro Dias Toffoli no julgamento e relatoria da ADI nº 5.422:

"Alimentos ou pensão alimentícia oriunda do direito de família não são renda nem provento de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas simplesmente montantes retirados dos rendimentos (acréscimos patrimoniais) recebidos pelo alimentante para serem dados ao alimentado. Nesse sentido, para o último, o recebimento de valores a título de alimentos ou de pensão alimentícia representa tão somente uma entrada de valores" - trecho do voto, grifos originais.

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O ministro foi bastante elucidativo ao comparar a situação de um casal com filho, sendo o provedor da família apenas um dos cônjuges. Após a separação do casal, são fixados alimentos a serem pagos pelo mantenedor ao filho e ao consorte separado, que passaram a morar em outra casa. Na primeira situação, o cônjuge e o filho podem ser incluídos como dependentes do provedor na declaração do IRPF. Na segunda situação, ex-cônjuge e filho, apesar de não poderem ser considerados da mesma forma na declaração do contribuinte - como dependentes -, continuam a dele depender financeiramente.

Veja-se que, por este exemplo, o montante total destinado ao pagamento da pensão alimentícia tem a mesma finalidade daquela quantia que era paga antes da separação do casal. No entanto, pela legislação vigente e antes da decisão, referido montante seria tributado tanto na efetiva percepção da renda por aquele que paga, quanto no momento do recebimento pelo alimentado, sem qualquer justificativa legítima para tal.

Trata-se, portanto, de importante precedente tributário que, mais uma vez, obriga os entes federados a curvarem-se ao determinado pela Constituição Federal quanto à "efetiva percepção de renda.

Nos processos judiciais em que se discute a fixação de pensões alimentícias originárias do direito de família, ou seja, alimentos entre genitores e filhos e avós e netos, por exemplo, a discussão sobre a parte obrigada ao pagamento de imposto de renda sobre a pensão alimentícia sempre foi constante. Isto, porque, em um processo desta natureza, é necessário que a pessoa que pede alimentos elenque as suas despesas e comprove os seus respectivos valores, de modo a dar subsídios ao juiz na fixação do valor dos alimentos.

Flávia Fagundes e Luis Eduardo Tavares do Santos. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Antes do julgamento da ação pelo Supremo, aquele que recebia os alimentos era a parte obrigada ao pagamento do IR. Por esta razão, muitos embates judiciais ocorriam se era possível o acréscimo ao valor dos alimentos da alíquota de imposto de renda que sobre ele incidia. Com isso, o valor total da pensão alimentícia era a somatória das necessidades do alimentando efetivamente comprovadas, acrescido do respectivo imposto de renda.

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Outro ponto relevante deste julgamento é o fato de que os alimentantes, que recebem rendimentos tributáveis, tinham deduções da alíquota de IR incidente sobre os seus rendimentos, quando este era obrigado ao pagamento de pensão alimentícia originária do direito de família.

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Ou seja, antes do julgamento, o alimentante pagava pensão alimentícia por meio de depósito em conta e recolhia menos IR sobre seus rendimentos. Já o alimentando recebia e pagava o imposto, devolvendo, no final das contas, uma parte da pensão recebida ao alimentante. Com a decisão do Supremo, essa discussão deixar de existir, propiciando maior agilidade no julgamento das ações que versam sobre pensão alimentícia de natureza de direito de família.

Outra questão constantemente debatida girava em torno dos pagamentos de despesas do alimentando de forma direta pelo alimentante, ou seja, ao invés do pagamento da pensão alimentícia por meio de depósito em conta, as partes pretendiam pagar diretamente as despesas do alimentando, tais como as mensalidades escolares, atividades extracurriculares, plano de saúde, entre outras, que normalmente são pagas via boleto bancário.

Esta forma de pagamento da pensão alimentícia, chamados alimentos in natura, evitava a incidência de IR sobre a pensão alimentícia. Tal prática, no entanto, não é somente benéfica sobre o ponto de vista do imposto, mas também para que o alimentante saiba que os seus recursos estão, efetivamente, sendo destinados em benefício do alimentando, e, ainda, de modo a facilitar o pagamento da pensão alimentícia.

Não é incomum que os alimentantes se sintam desconfortáveis em pagar os alimentos por meio de depósito em conta, especialmente quando tais pagamentos são feitos na conta do outro genitor, como quem o alimentante terminou a relação e/ou não mantém vínculo de confiança. Desta forma, também por esta razão, entendemos que os pagamentos diretos das despesas devem, sempre que possível, serem determinados na fixação da pensão alimentícia.

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*Flávia Fagundes é advogada em Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados - RBTSSA

*Luis Eduardo Tavares do Santos é advogado especializado em Direito da Família e sócio do escritório Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados - RBTSSA

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