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Soluções para o saneamento básico

Por Luís Ricardo Martins
Atualização:
Luís Ricardo Martins. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Marco Legal do Saneamento representa um passo extremamente importante para o Brasil encarar um de seus maiores problemas, que continua sem solução apesar de sua reconhecida relevância. Os números dão a dimensão e urgência para resolver a situação do saneamento básico, um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento do País: 35 milhões de brasileiros não têm acesso a água tratada, 100 milhões (mais de 47% da população) vivem sem contar com coleta de esgoto, e apenas 46% dos esgotos são tratados.

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Trata-se de um quadro há muito tempo conhecido, mas para o qual infelizmente pouco se tem feito. É nesse sentido que a Lei nº 14.026/2020, aprovada no ano passado e que ficou conhecida como o marco para o setor, tem importância histórica. Um dos pontos de destaque estabelecidos por essa legislação é a universalização, ou seja, o acesso aos serviços de saneamento básico para todos os cidadãos, até 2033. É uma necessidade premente, entre outros motivos pelo que representa para melhoria da saúde da população (tema que ganhou especial destaque desde que a pandemia de Covid-19 se espalhou).

A aprovação de um arcabouço legal que dá suporte às iniciativas para acabar com o problema, é louvável, mas restou uma questão: como será possível obter recursos que viabilizem esse novo cenário? Como sabemos, os governos têm recursos escassos (quando não inexistentes) e certamente, embora tenham participação relevante no processo, não conseguirão arcar com a necessidade de investimentos nessa área.

Existe, no entanto, uma solução para esse problema: o País pode contar sim, também desta vez, com o único agente que tem recursos para fazer investimentos de longo prazo: as entidades fechadas de previdência complementar, conhecidas como fundos de pensão. Por característica de sua atividade, essas entidades buscam alternativas para investir a longo prazo, também como forma de garantir o cumprimento de sua meta, que é garantir recursos aos participantes que poupam durante anos para ter direito a uma aposentadoria melhor.

Com um patrimônio acumulado próximo a R$ 1 trilhão e um histórico de pagamento em dia de R$ 70 bilhões por ano para seus participantes, o sistema tem solidez comprovada ao longo de mais de 40 anos de presença na economia brasileira. Juntando-se a esse volume a busca por investimentos de longo prazo, forma-se o quadro ideal para aplicações em infraestrutura, em que o saneamento tem papel de destaque.

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Por isso, os fundos de pensão saudaram a aprovação do Marco Legal do Saneamento. Ele fornece mais segurança jurídica para quem investe e tem vários pontos dignos de aplausos. Existe, no entanto, uma preocupação: o projeto original previa a prorrogação por mais 30 anos dos atuais contratos feitos por municípios com companhias estaduais de saneamento, sem licitação. Na prorrogação seriam incluídas metas de universalização do saneamento. Mas o trecho foi vetado pelo presidente da República.

Se o veto for confirmado, é provável que os municípios, que atualmente são clientes das empresas estaduais, tomem a frente nas novas licitações de empresas para os serviços de água e esgoto. Grandes cidades ou consórcios de municípios poderão contratar empresas privadas para esses serviços. Dessa forma, as companhias estaduais de saneamento poderão encolher ou até mesmo, em alguns casos, ficar inviabilizadas, com reflexos negativos para continuidade e sustentabilidade de seus fundos de pensão.

Além disso, é importante lembrar que, ao contrário do que aconteceu na desestatização do setor elétrico, as mudanças para o saneamento não levarão necessariamente à privatização das empresas estatais. Com isso, as companhias estaduais de saneamento poderão ficar enfraquecidas.

Essas questões não impedem que se reconheça os vários itens positivos do Marco Legal do Saneamento. No entanto, é preciso atenção para evitar que esses efeitos da nova legislação não sejam reduzidos em função dos problemas que ela pode causar, e não apenas para as entidades fechadas de previdência complementar. Não foi fixado, por exemplo, um prazo para adaptação às novas regras. Também é preciso lembrar que o saneamento é deficitário para vários municípios, mas que esse problema é resolvido normalmente por uma estatal - risco que dificilmente será assumido por uma empresa privada.

Diante dessas preocupações, a Abrapp, que representa os fundos de pensão, tem-se reunido com suas associadas envolvidas nesse setor para debater o tema, apontando as vantagens e também mostrando os riscos dos pontos polêmicos do Marco Legal do Saneamento. A oportunidade de resolver uma questão de tanta urgência e relevância não pode ser desperdiçada pela falta de ajustes pontuais e necessários. Estamos diante da possibilidade de investir e porque não acabar com a falta de saneamento que tanto mal causa à nossa população. Se não o fizermos corretamente corremos o risco de jogar fora uma oportunidade que talvez não se repita. E os brasileiros não podem continuar convivendo com a falta de saneamento básico que lhes traz tantos problemas de saúde, ainda mais quando temos de conviver com uma pandemia que resiste e continua a causar tantos danos.

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*Luís Ricardo Martins é presidente da Abrapp (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar)

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