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Sindicalismo 4.0 e a revolução tecnológica

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Por Eduardo Pragmácio Filho
Atualização:
Eduardo Pragmácio Filho. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A Quarta Revolução Tecnológica afeta diretamente trabalhadores, empresas, governos e sindicatos. Aliás, tecnologia é a companheira histórica do sindicalismo, pois foi em razão da chamada Questão Social, advinda da primeira Revolução Industrial, na passagem para o século 19, que surgiu o direito do trabalho, a consciência de classe e, consequentemente, o sindicato. Naquela época, a reunião de vários trabalhadores (critério objetivo), nas grandes fábricas insalubres, despertou uma consciência de classe (critério subjetivo), fazendo surgir um novo sujeito coletivo, a classe operária, representada pelos sindicatos.

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Dessa realidade oitocentista para cá muita coisa mudou: foram criadas as linhas de produção em um esquema fordista e taylorista (segunda revolução industrial), houve em seguida a adoção da robótica e da telemática nas fábricas que se dispersaram pelo mundo (terceira revolução industrial), e, hoje, com o advento da cibernética, da inteligência artificial, da nanotecnologia etc. parece haver uma reviravolta no mundo do trabalho. Fala-se da Indústria 4.0, da Quarta Revolução Tecnológica (note-se: não é somente industrial), de um direito do trabalho 4.0 e, por consequência, de um sindicalismo 4.0.

No Brasil, esse histórico de conflitos, lutas e conquistas, que ocorreram no velho mundo, foi, de certa forma, burlado. A estrutura sindical brasileira foi concebida pelo governo na Era Vargas, com total influência corporativista e fascista, lastreando-se na unicidade sindical, na organização por categoria e na contribuição compulsória, pilares que permaneceram até os dias de hoje.

A Lei 13.467/17 acabou, no entanto, com um desses pilares, o da contribuição compulsória, o que fez ruir todo o edifício da estrutura sindical brasileira, tanto laboral como patronal. Sem a receita compulsória, os entes sindicais precisam se reinventar, sobretudo para sua manutenção e existência. Irá ocorrer, com certeza, fusão e incorporação de sindicatos, com expansão de categorias e áreas geográficas, no sentido do fortalecimento e sobrevivência. Os sindicatos com verdadeira representatividade tomarão a dianteira e serão os pioneiros nas mudanças.

Como já disse em outra oportunidade, o Estado deve fomentar uma grande arena para o diálogo, com o cuidado de não criar uma exclusividade de representação, principalmente pelo critério numérico de representação, o que poderia inibir a atuação de entidades menores e verdadeiramente representativas, pois, afinal, o Estado Democrático de Direito protege também as minorias, constituindo-se em um Estado que fomenta a inclusão e rejeita a exclusão e outras práticas discriminatórias.

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No sindicalismo 4.0, a reinvenção é perene. Um exercício de reflexão deve ser feito: que tipo de sindicato deve existir e atuar e para quem? Nesse sentido, como bem disse Eduardo Perone, em maio de 2019, no 35.º Congresso dos Sindicatos dos Lojistas que ocorreu em Fortaleza, tais quais as empresas os sindicatos devem ser ágeis, leves e práticos, adotando uma governança diferente, inovadora, tecnológica e focada no cliente: o representado. Um modelo disruptivo.

Seja para sindicatos patronais ou laborais, em tempos em que assembleias podem ser convocadas e realizadas por meio de aplicativos como o WhatsApp (veja-se, por exemplo a greve dos caminhoneiros de 2018 ou a recente paralisação dos motoristas do Uber), as lideranças devem estar atentas a essas mudanças, que demandam consistência diretiva, oxigenação e implementação de políticas. Os entes sindicais precisam reconquistar seus representados e puxar para si o comando e a orientação da nova empreitada.

É preciso ter consciência que a nova estrutura sindical brasileira continuará sendo um conjunto de entidades, intimamente interdependentes, cada uma com uma função relevante, um organismo vivo e mutante, articulando-se os papéis e as relações de poder nesse sistema.

Os representados (trabalhadores e empresas) são também clientes, para quem os serviços e produtos prestados pelas entidades devem ser entregues de forma ágil, transparente e com qualidade. Essa visão inovadora transforma o mero papel institucional e de representação do sindicato, tornando-o um player do mercado. Afinal, o sindicato será uma espécie de hub de serviços e negócios, onde trabalhadores e empresas terão acesso a parcerias, novas tecnologias e mercados e condições ajustadas das relações de trabalho.

Sem proatividade, muitas entidades morrerão de inanição. As que possuem representatividade, legitimidade, deverão usar as novas tecnologias para encantar, conquistar e fidelizar clientes (os representados) e realizar as melhores práticas de gestão, com transparência e participação democrática.

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*Eduardo Pragmácio Filho é doutor em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pesquisador do Getrab-USP, sócio do escritório Furtado Pragmácio Advogados e autor do livro A boa-fé nas negociações coletivas trabalhistas

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