A Justiça do Trabalho de São Paulo autorizou a demissão coletiva, e sem negociação prévia, de 255 trabalhadores da churrascaria Fogo de Chão por causa dos efeitos econômicos causados pela pandemia. Desligamentos começaram em março do ano passado. A decisão da juíza da 7ª Vara do Trabalho, Juliana Petenate Salles, foi proferida na terça-feira, 20. Magistrada também negou os pedidos individuais de reintegração ao quadro de funcionários do restaurante.
De acordo com a denúncia feita pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a empresa de restaurantes teria realizado uma demissão coletiva de trabalhadores em março de 2020, no início da pandemia de covid-19. Inicialmente, o órgão havia afirmado que a companhia não teria realizado o pagamento das verbas rescisórias ao grupo, o que foi efetivado ao longo do processo.
Conforme pontuou a magistrada na ação, desde a reforma trabalhista de 2017, a legislação trabalhista não exige que desligamentos em massa sejam negociados de forma prévia. "É bem verdade que a doutrina e a jurisprudência pátrias traçam duras críticas ao mencionado dispositivo legal, visto ser inegável e reprovável o retrocesso que essa norma representa e de suas disposições terem vulnerabilidade à parte trabalhadora hipossuficiente ao afastar o raciocínio construído e consolidado anteriormente, a partir da ordem justrabalhista vigente à época", justificou.
Ao analisar o pedido do MPT de reintegração e pagamento de danos morais ao grupo de funcionários, a juíza avaliou que o restaurante foi duramente afetado pela crise econômica imposta pela pandemia de covid-19. "Nesse contexto, é evidente que a atividade econômica preponderante desenvolvida pelas Requeridas e, por conseguinte, o quotidiano laboral dos empregados que atuavam em tais estabelecimentos, foram abrupta e exponencialmente atingidos a partir de março de 2020", afirmou.
"Verifique-se, neste sentido, que as Rés demonstraram documentalmente que permaneceram fechadas por meses, bem como que houve redução em seu faturamento, mas não sustentaram que houve extinção da empresa ou de todos os seus estabelecimentos", declarou a magistrada em outro ponto do processo.
ADVOGADOS ANALISAM O CASO
A reportagem do Estadão ouviu alguns advogados da área trabalhista que não atuam na causa. Eles analisaram detalhes da ação. Indo ao encontro da decisão proferida pela justiça do trabalho, o sócio coordenador do escritório Nelson Wilians Advogados, Rodrigo Marques - especialista em Direito Trabalhista-, relembra que não existe necessidade de autorização prévia de entidade sindical. "É de conhecimento público que a pandemia decorrente do coronavírus impactou direta e fortemente o setor de atuação da Fogo de Chão, assim, a citada empresa ao efetivar as demissões deverá comprovar de forma correta e devida que todas as obrigações e direitos foram fiel e integralmente quitadas de forma tempestiva", analisa Marques.
De acordo com a advogada trabalhista e sócia do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados, Mariana Machado Pedroso, a autorização de demissão coletiva está respaldada pela atualização da legislação realizada após a reforma trabalhista. "A decisão da Justiça trabalhista envolvendo a churrascaria está em linha com a atual redação da CLT, que equiparou as dispensas coletivas às individuais, não exigindo qualquer formalidade além do pagamento das respectivas verbas rescisórias", explica.
Assim como Marques, o especialista em Direito do Trabalho e sócio do Peixoto & Cury Advogados, Carlos Eduardo Dantas Costa, ressalta que diante do cenário econômico e da redução no faturamento a empresa precisou realizar os desligamentos, o que é garantido pela lei. "No caso concreto, é evidente que o negócio da Fogo de Chão foi impactado pela pandemia e, se a empresa chegou à conclusão de que as dispensas eram necessárias, ela deve ter assegurada a possibilidade de exercer seu direito", relata.
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A decisão é notável, especialmente se considerado o particular ambiente da pandemia. Primeiro porque, como deve ser, respeita a lei vigente independentemente da simpatia que o juiz tenha ou não por ela; depois, por demonstrar que a empresa jamais agiu fora da lei; finalmente, mostra o perfil teratológico, bizarro e isolado da decisão proferida pela 52a Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, que, dentro da normalidade, tende a ser reformada pelo tribunal.