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Saúde digital: remédio contra os extremos do Brasil

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Por Guilherme Weigert
Atualização:
Guilherme Weigert. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Brasil é um país continental e de extremos. Fato que não é diferente quando falamos de saúde. Cerca de 60% dos médicos brasileiros estão concentrados em apenas 39 municípios, do total dos 5.570 existentes. Só o estado de São Paulo conta com 28% do total desses profissionais.

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Segundo dados da Demografia Médica de 2020, as diferenças são notadas também entre as próprias capitais e municípios do interior dos diversos estados. Nas capitais, há 5,65 médicos por mil habitantes, enquanto a população nas cidades do interior conta com 1,49 médico por mil habitantes.

Na média de 2,4 médicos por mil habitantes em 2020, o Brasil assemelha às taxas registradas na Coreia do Sul, México, Polônia e Japão, mas está abaixo da taxa de 3,5 médicos por mil habitantes, que é a média dos 36 países selecionados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Diante desse desequilíbrio, a saúde digital tem se mostrado uma grande aliada no acesso à saúde, derrubando barreiras e aproximando médicos e pacientes. Por meio de plataformas de telemedicina, soluções especializadas e dispositivos móveis é possível a interação de médicos com pacientes de qualquer região, inclusive as mais distantes dos grandes centros urbanos.

Já existe, por exemplo, um programa de atendimento médico remoto, dentro da aldeia Boa Vista, localizada a três horas de distância de Altamira, localizada na Área Indígena Juruna no município de Vitória do Xingu, sudoeste do Pará. Em uma base montada dentro da aldeia, com a instalação de uma antena de internet e um notebook, estão sendo realizadas consultas virtuais voltadas a prevenção e saúde de cerca de 40 indígenas que vivem no local. Também é possível oferecer atendimento médico para presos, para os quais os agentes de saúde selecionam os internos que precisam de ajuda médica e agendam a consulta online.

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As aplicações da tecnologia, como aliada à democratização do acesso à saúde, são inúmeras. Além de se chegar a lugares distantes, também é possível ampliar a abrangência de um atendimento especializado. Imagine uma mulher grávida de uma pequena cidade no interior do Nordeste que precisa se consultar com um médico geneticista. Atualmente, segundo o mesmo estudo de Demografia, existem no país somente 332 médicos especializados em genética, o que significa algo menor de que 0,1% dos especialistas, com presença em apenas 0,7% dos municípios brasileiros. Essa mesma mulher, poderia agendar uma consulta virtual sem sair de sua casa, da sua cidade ou do seu estado, e ter seu caso analisado com um profissional especializado que pode atendê-la direto de São Paulo, por exemplo.

Além de todo potencial de trazer equidade entre médicos e pacientes, a saúde digital pode resolver um dos problemas mais comuns nos hospitais - as idas desnecessárias ao Pronto Socorro. Mais de 90% das pessoas que vão ao PS não precisariam ir, já que é um lugar para atendimentos de alta complexidade e para pessoas em situação de alto risco (como derrames, infartos ou fraturas). Os atendimentos poderiam ser realizados por clínicos ou especialistas, em outras situações mais seguras ou remotamente.

A teleconsulta vem exatamente para facilitar esse procedimento. Dados comprovam que em 80% das consultas realizadas por meio de plataformas tecnológicas, os pacientes têm sua causa resolvida na primeira avaliação, entre 10 e 15% são direcionados para um atendimento com um especialista e apenas 5% são encaminhados ao Pronto Socorro.

Durante a pandemia, período em que as pessoas tiveram mais receio de ir até ao hospital, a aplicação de teleconsultas teve um aumento exponencial e mostrou-se muito eficaz no trabalho de triagem, atendimento e acompanhamento de pacientes. Com a telemedicina, os médicos puderam ir, virtualmente, até a casa de cada paciente com segurança e eficácia em seu atendimento.

A telemedicina veio para ficar, isso é fato. Mas, é claro que ela nunca vai substituir consultas presenciais necessárias. O tato, contato e exames físicos são a base da Medicina e isso não é substituível. A saúde digital vem para complementar o relacionamento entre médicos e pacientes e o uso de dispositivos estão se tornando grandes aliados para driblar muitas situações, nas quais o atendimento a distância só seria possível com um exame físico presencial. Felizmente, são dispositivos fáceis de encontrar em farmácias e permitem fazer, por exemplo, a aferição de pressão e pulso, frequência cardíaca e até calcular a curva de oxigenação do corpo, além de muitas outras informações.

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Por isso, para mim, a saúde digital vem para revolucionar o setor, tido até então como conservador. Ela gera valor para qualquer especialidade médica, derruba barreiras geográficas, facilita o acesso, proporciona maior comodidade com segurança e empodera o paciente, engajando-o na gestão da sua própria saúde.

A sociedade continuará necessitando de serviços que há séculos são consumidos, o que já faz no entretenimento e transporte, por exemplo. O que muda é a forma como ele é realizado, migrando da Blockbuster para a Netflix ou do táxi para o Uber. Alguém tem alguma dúvida de como será a nova forma de consumir saúde no futuro próximo?

*Guilherme Weigert é médico cardiologista e CEO da Conexa Saúde

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