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Sandbox regulatório: estamos prontos para brincar no parquinho em 2020?

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Por Eric Hadmann Jasper
Atualização:
Eric Hadmann Jasper. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A relação entre o Estado, com seus poderes de legislar, implementar políticas públicas e fiscalizar o dia-a-dia da atividade econômica, e o Mercado, esse espaço social onde agentes econômicos realizam trocas voluntárias, pode ser conflituosa, colaborativa e, por vezes, até simbiótica. Um tema que exemplifica perfeitamente o moderno relacionamento entre Estado e Mercado é o chamado sandbox regulatório.

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O tema é oportuno porque recentemente (4.12.2019, para ser exato) a Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovou o Projeto de Lei n. 399/2019 que instituiu o primeiro sandbox regulatório brasileiro. Apesar de não estarem claros os setores econômicos afetados pela norma distrital ou como a iniciativa será operacionalizada, fato é que o legislador local se junta ao Banco Central (BC), à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Superintendência de Seguros Privados (Susep) que, a partir de 2020, terão sandboxes regulatórios em operação. No caso do BC, há consulta pública aberta para comentários da sociedade até 31.1.2020.

A definição de um sandbox regulatório é bem mais simples que a sua operacionalização. Esses "parquinhos" jurídicos representam a criação, pelo Estado, de um espaço seguro no qual empresas e consumidores testam novos produtos antes de serem oferecidos ao mercado de forma geral. Nesses espaços, o regulador atenua temporariamente determinados requerimentos infralegais para empresas previamente selecionadas. Tais empresas, por sua vez, testam produtos inovadores com consumidores reais e, assim, aumentam-se as chances de novos entrantes, maior competição, mais qualidade e menores preços.

Como o diabo está nos detalhes, a operacionalização de um sandbox regulatório representa uma série de desafios. Por exemplo, as minutas de regras de sandbox regulatório do BC (a consulta pública se encerrará em 31.1.2020) preveem a publicação de um edital de chamamento de projetos "inovadores" e a autoridade poderá limitar o número de empresas que poderão participar do ambiente de testes. A mera aprovação ou reprovação para participar de um sandbox poderá, portanto, representar o sucesso ou fracasso de uma fintech. Por isso, além de participar ativamente da consulta pública do BC, é essencial que as empresas iniciem preparativos para apresentação de projetos ao governo.

A participação no processo seletivo de sandbox do BC, CVM ou Susep também pode ser utilizado de forma estratégica. Caso uma empresa se candidate ao sandbox regulatório e tenha seu pedido negado pelo regulador com base no fato de que seu produto não está no escopo de competência da autoridade pública, isso pode significar que a oferta do produto ao consumidor estaria liberada pois ausente necessidade de regulação. Entendo que é pouco provável que as autoridades permitam a existência dessa lacuna. Tal preocupação é acentuada pelo fato de que fintechs e insurtechs são, por definição, empresas que não se adequam a modelos regulatórios predeterminados.

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Mas o sandbox não é apenas vantajoso para as empresas inovadoras e o consumidor final. O regulador também se beneficiará do diálogo mais direto com empresas e suas soluções "disruptivas". O Estado aprenderá com o Mercado a lidar melhor e de forma mais ágil com mudanças comerciais. Idealmente, o resultado de um bom sandbox é uma nova empresa autorizada a atuar no mercado amplo ou uma mudança regulatória que permita a nova entrada.

Espera-se, portanto, que o Mercado contribua com as iniciativas do Distrito Federal, BC, CVM e Susep, bem como pressione outros órgãos reguladores a adotar soluções similares. Empresas também devem se preparar para participar dos chamamentos públicos de sandbox, caso contrário arriscam ficarem de fora do próximo ciclo de inovação. Por fim, espera-se do Estado clareza sobre os objetivos, critérios de entrada e saída do sandbox e a fundamental análise dos resultados dessa nova política pública.

*Eric Hadmann Jasper é professor do Instituto Brasiliense de Direito Público e sócio do Gico, Hadmann & Dutra Advogados

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