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Restauração florestal recupera área impactada por barragem de Fundão

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Por Sebastião Venâncio
Atualização:
Sebastião Venâncio. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em Mariana em 2015, causou impactos no solo e na vegetação, principalmente nos primeiros 113 quilômetros, onde foi observado depósito de rejeitos. O evento movimentou a comunidade científica e suscitou pesquisas pioneiras em universidades brasileiras. Estudiosos da área, até então, não tinham observado nada semelhante. Portanto, não existiam referências, bibliografias e nem históricos prontos.

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Em um primeiro momento, especulou-se que a retirada dos rejeitos seria a melhor solução para recuperar as áreas atingidas. Porém, considerando o enorme impacto ambiental da remoção, foram estudadas novas alternativas.

Uma delas parte de uma parceria entre a Fundação Renova e o Laboratório de Restauração Florestal da Universidade Federal de Viçosa (LARF-UFV), firmada em 2018, que tem possibilitado o monitoramento da restauração florestal das áreas atingidas pelo rejeito.

Uma das frentes dos estudos foi aplicada no trecho atingido próximo à barragem e demonstrou bons resultados. Em uma área de 41,5 hectares, foram plantadas 41 mil mudas de espécies nativas para restauração ativa da área impactada. Foi observado um bom crescimento das plantas a partir de tecnologias de ponta empregadas na restauração. Uma delas é o uso do hidrogel, um tipo de polímero que aumenta a capacidade de armazenamento de água e nutrientes pelo solo.

A técnica evita erosão na margem do rio, o que dificulta a descida dos rejeitos ao curso d'água e minimiza a turbidez. Assim, a formação gradual da mata ciliar também contribui para o retorno da biodiversidade.

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Em outra frente, foi feito um estudo de monitoramento da restauração natural passiva. Após cerca de quatro anos do rompimento, revelou-se o grande potencial de regeneração natural de florestas nativas, mesmo sobre rejeito. Apesar de pobre em alguns nutrientes, ele não representa um impedimento para a regeneração natural por não conter substâncias tóxicas às plantas.

Em muitas áreas, observa-se uma cobertura florestal pioneira densa, não sendo necessária intervenção, uma vez que a proximidade de fragmentos florestais poderá garantir o enriquecimento natural com espécies mais tardias da sucessão.

A equipe observou abundante regeneração natural em trechos com os maiores depósitos de rejeito, principalmente na região mais próxima da barragem de Fundão, onde ainda existem fragmentos florestais remanescentes próximos. Dessa forma, a regeneração natural tem sido condicionada a uma relação entre distância desses fragmentos florestais e as áreas impactadas pelo rejeito. Por exemplo, trechos mais próximos aos remanescentes de florestas nativas apresentam mais regeneração natural.

Em outras áreas, onde existem fragmentos florestais próximos, mas com gramíneas exóticas, espécies que cobriram os rejeitos antes da regeneração das nativas, o processo tem sido mais lento. Mas, mesmo nestas condições, tem sido necessário apenas a condução da regeneração para acelerar a sucessão.

Nos levantamentos realizados a partir de 2018 nas parcelas permanentes implantadas, o estudo tem focado em indicadores como produção de restos vegetais, número de indivíduos e de espécies regenerantes e banco de sementes do solo com rejeito, matéria orgânica, fertilidade química e níveis de compactação.

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Em um dos trechos impactados onde foi observada regeneração natural avançada, foi encontrado um valor elevado de restos de vegetação, superior inclusive ao da floresta do entorno, que serviu de comparação. Essa constatação foi atribuída ao rápido crescimento e alta produção de folhas grandes por espécies pioneiras abundantes na área.

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Também foram amostradas 38 espécies no estrato de regeneração natural e 145 espécies no banco de sementes do rejeito. Cabe destacar que o banco é um ótimo indicador do potencial de regeneração natural de áreas alteradas.

Outra etapa do projeto constatou que o banco de sementes do rejeito varia fortemente em função da sua profundidade. Ocorre uma elevada densidade nos primeiros 2,5 cm, sendo drasticamente reduzida a partir dessa profundidade.

A pesquisa tem revelado ainda que, nas paisagens cobertas com pastagem de braquiária agressiva sobre o rejeito e com ausência ou isolamento de fragmentos florestais, a regeneração natural não seria suficiente para garantir a restauração florestal. Nesses locais, o reflorestamento com plantio de espécies nativas regionais está sendo bem-sucedido pela Fundação Renova.

Em suma, o conjunto de ações de restauração florestal ativa e passiva tem possibilitado uma rápida cobertura do rejeito; a melhoria na sua fertilidade e o aumento da diversidade nas áreas atingidas. E, como em muitas áreas já não se encontravam florestas nativas mesmo antes do rompimento pelo longo histórico de degradação, ocorrerá um ganho em Mariana e potencialmente na bacia do rio Doce.

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*Sebastião Venâncio, doutor em Botânica pela Unicamp, é professor titular do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa e coordenador do Laboratório de Restauração Florestal da UFV

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