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Regulamentação dos dispositivos eletrônicos para fumar no Brasil: o que esperar?

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Por Beatriz Gagliardo
Atualização:
Beatriz Gagliardo. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Estamos em 2020 e os vaporizadores, chamados ineditamente pela Anvisa de dispositivos eletrônicos para fumar, chamam a atenção não só na grande mídia, como também nas redes sociais. O assunto tem sido cada vez mais abordado por especialistas do setor, da área médica e da população em geral. Posicionamentos nas redes sociais, entrevistas, vídeos, podcasts, uma gama sem fim de ferramentas está sendo usada para debater o tema. E é assim que deve ser.

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Apesar do debate ser apropriado, há uma realidade que não pode ser ignorada: Temos visto, na prática, o comércio e o livre consumo de uma gama cada vez maior de dispositivos, dos mais variados tipos e que cabem em todos os bolsos. Produtos sem registro nem pesquisas, que são vendidos de forma aberta, sem informação e sem controle, não gerando impostos e, infelizmente, buscados como alternativa aos cigarros convencionais. Um problema.

Aqui no Brasil, a comercialização desses produtos é tida como ilegal, uma vez que, desde 2009, existe uma resolução da Anvisa que ao mesmo tempo proíbe a "comercialização, a importação e a propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar", mas também admite a possibilidade que empresas possam pedir o seu registro e a sua liberação "dependerá da apresentação de estudos toxicológicos e testes científicos específicos que comprovem as finalidades alegadas".

Apesar de já ter previsto essa possibilidade de registro, a norma foi elaborada baseada no princípio da precaução, com a justificativa - apresentada na época - de não existirem dados ou pesquisas científicas suficientes para a regulamentação segura. Cabe ressaltar que ainda em 2009, não havia muito conhecimento sob o tema.

No entanto, após 11 anos, muita coisa mudou na ciência, no mundo e no Brasil. A Philip Morris, por exemplo, tem falado em âmbito global sobre sua missão em busca do Futuro sem Fumaça. A meta da empresa é parar de vender cigarros comercializar apenas produtos de risco reduzido.

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Mas o que isso significa? Significa que a empresa que detém a marca de cigarros mais valiosa e consumida do mundo tem trabalhado há anos com mais de 400 cientistas de 30 nacionalidades diferentes para pesquisar e desenvolver novas tecnologias de produtos de risco reduzido sem combustão para substitui-la. Isso é impactante! Imaginem, por exemplo, a Coca-Cola anunciar que vai deixar de fabricar coca cola. Continuando a trajetória da PMI, em 2016, finalmente apresenta o seu primeiro produto em escala global, o IQOS, produto de tabaco aquecido que não é mais acendido com um isqueiro, mas aquecido através de um aquecedor eletrônico a uma temperatura controlada de 350 graus Celsius, bem abaixo daquelas atingidas durante a combustão de um cigarro convencional, eliminando totalmente ou reduzindo drasticamente a grande maioria dos componentes tóxicos prejudiciais à saúde do fumante.

Quatro anos depois do seu lançamento, esse produto já está presente em 52 países e ajudou até o momento cerca de 13.6 milhões de fumantes que, de outra maneira, continuariam fumando. No total, já foram produzidos 18 estudos clínicos e não clínicos, bem como dezenas de artigos científicos publicados em jornais especializados, sobre esse tema: uma inovação e tanto para uma indústria tradicional focada na produção de cigarros à combustão.

Mas essa transformação proposta pela empresa só será possível se todos os tomadores de decisões também compreenderem a importância do papel de uma boa regulamentação da produção e comercialização desses produtos no mercado brasileiro. Vale ressaltar que a regulamentação equilibrada, sensata e baseada no estudo dos riscos que esses produtos sem fumaça podem trazer, combinada com outras restrições aos cigarros convencionais, pode ajudar a combater de maneira mais eficaz e rápida os danos causados pelo fumo ao compararmos com outras ações como o aumento da tributação e outras medidas regulatórias tradicionais.

A regulamentação deve seguir o papel de convencer as pessoas a não começarem a fumar e incentivar a cessação total. No entanto, também deve-se considerar os dados que mostram que milhões de pessoas continuarão fumando e deveriam ter a oportunidade de escolher por uma alternativa comprovadamente de menor risco. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, em 2025 mais de 1 bilhão de pessoas seguirão utilizando o tabaco a combustão. Os produtos de risco reduzido têm um papel complementar na política pública. Não são concorrentes à política de cessação, tanto é que alguns países, como a Inglaterra, adotam esta abordagem complementar.

Nesta cesta de regulação, devem ser levados em conta o perfil de risco e a diferenciação dos produtos, suas peculiaridades, pontos positivos e desafios para o controle sanitário.

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No geral, a história mostra que a inovação antecede a regulação, o que é normal, porém, a inação ou a proibição por si só, sem olhar a realidade, pode trazer efeitos indesejados ao longo do curso, como o uso descontrolado ou desregulado de um produto ou serviço, sufocando ainda investimentos. Por outro lado, uma regulamentação específica de um produto pode ser muito benéfica ao incentivar a inovação por meio de investimentos em pesquisa e desenvolvimento.

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Na metade do ano passado a Anvisa revisitou o tema e percebeu que fechar os olhos para essa realidade não é mais possível. Foi aberto o processo de revisão da norma. No entanto, o que se vê até agora, pelo menos segundo os dados públicos, ainda é o pouco avanço do tema, cronograma de trabalho sendo revisto e adiado periodicamente e uma rara discussão passional e sem cunho científico por parte de atores da sociedade.

É um tema complexo, polêmico, que divide opiniões, mas que precisa ser debatido abertamente. Como disse o ex-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, em seu discurso em 2018: "isto é todo um debate que esta Agência precisa fazer com seriedade, com profundidade. (...) mas também não utilizemos a complexidade do tema como uma barreira para a atividade regulatória".

Se esta mesma agência já regula e permite a comercialização de um produto de tabaco consumidos pela combustão, como o cigarro, por que não permitir produtos de tabaco similares consumidos pelo aquecimento e que reduz a formação de substâncias nocivas em 90 a 95%, aproximadamente.

Tenho certeza de que a Anvisa tem total capacidade de conduzir esta discussão e produzir uma regulamentação equilibrada e que leve em consideração os produtos de tabaco aquecido como uma alternativa menos nociva aos adultos que ainda querem permanecer fumando. E que o ideologismo político não seja a razão para protelar essa importante decisão para nosso país.

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*Beatriz Gagliardo é gerente de Assuntos Regulatórios da Philip Morris Brasil

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