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Reforma tributária: quem ajudará o Terceiro Setor?

Por Chico Müssnich e Franciny de Barros
Atualização:
Chico Müssnich e Franciny de Barros. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O ano de 2020 começou com a expectativa de definições importantes no sistema tributário nacional, fruto da tão debatida reforma tributária, com possível tração dos projetos em andamento e apresentação do prometido projeto do Governo. Preocupa, porém, que todos eles sigam, no melhor cenário, ignorando a filantropia, com oneração de doadores e donatários.

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Logo no primeiro trimestre a pandemia da covid-19 desacelerou não só a economia, como o crescimento do setor privado e também o ritmo das expectativas. De positivo, a pandemia impulsionou o sentimento de união e solidariedade em busca de um mesmo bem comum: a saúde física, econômica e mental de toda a sociedade, preenchendo um espaço que, mais uma vez, o Estado não foi capaz de ocupar.

Auxiliar a sociedade realizando parte do papel que caberia ao Estado é a especialidade das organizações sociais do terceiro setor. Mas o Estado garante o mínimo necessário para que estas entidades realizem tão importante papel? Não reduzir o patrimônio e a renda destas entidades com arrecadação tributária e desonerar as doações é o mínimo que se espera.

A imunidade tributária é garantida pela Constituição Federal às entidades educacionais e de assistência social sem fins lucrativos, ainda que existam diversas discussões sobre a aplicabilidade e as restrições impostas pela legislação infraconstitucional. A legislação federal estabeleceu a isenção tributária para entidades filantrópicas, de cunho recreativo, cultural e científico e às demais associações civis sem fins lucrativos.

Atualmente, as diversas normas que impõem requisitos e restrições às organizações do terceiro setor dificultam muito mais do que incentivam, inclusive para a captação de doações. Ao invés de simplesmente não tributar e facilitar o fluxo de recursos do setor privado para o Terceiro Setor, a legislação impõe limites e requisitos que, em conjunto com o escrutínio das autoridades fiscais, burocratizam e restringem a cooperação entre os setores. Nesse emaranhado jurídico, nem mesmo os tribunais têm conseguido diminuir a dificuldade enfrentada pelas instituições na rotina de comprovações e certificações.

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E já que uma das promessas da reforma tributária sempre foi a simplificação, esperava-se que essas questões seriam resolvidas. Parece que não.

As propostas de emendas constitucionais (PEC) 45 e 110, que tramitam no Congresso Nacional, e seu imposto sobre bens e serviços (IBS), não tratam do tema, até porque objetivam esvaziar benefícios fiscais. Já a tímida proposta do Governo e sua contribuição sobre bens e serviços (CBS), que seria um novo PIS/Cofins, passa pelo tema apenas de raspão. Hoje, o que se tem no horizonte é, no máximo, a manutenção das imunidades e nada mais. Nada mais mesmo, porque aparentemente o regime de isenção para as demais entidades filantrópicas não está no texto do projeto do governo e pelo visto nem no radar. Assim como não está no radar a simplificação para o setor (por ora apenas sugerida por tímidas Emendas à PEC 45) ou qualquer medida de incentivo às doações.Como os principais projetos de reforma tributária objetivam reduzir e agrupar vários dos atuais tributos em um imposto e/ou contribuição sobre o consumo - bens e serviços - ao não excepcionar as entidades filantrópicas e suas atividades meio, ou oferecer incentivos aos doadores e consumidores de seus serviços, a nova tributação aumentará ainda mais o custo da solidariedade no Brasil.

Bilhões foram doados pela iniciativa privada em prol do combate à pandemia. Então por que não impulsionar esse sentimento e a manutenção desta cultura excepcionando da incidência tributária as atividades meio das entidades sem fins lucrativos? Por que não possibilitar que os recursos destinados gerem crédito (de IBS ou CBS) ou sejam dedutíveis para fins fiscais? Ou ainda, por que muitos Estados ainda não garantem ou (pior) dificultam a não incidência do ITCMD sobre as doações às entidades sem fins lucrativos?

Não é fácil propor, muito menos implementar, uma reforma tributária abrangente e ao mesmo tempo precisa. Daí a importância da participação e do debate de toda a sociedade, já que o nosso sistema legislativo permite a correção e o aperfeiçoamento das propostas enquanto elas não são convertidas em lei. O que não nos parece razoável é se esquecer de um setor tão importante da economia e que tem tido um papel essencial no desenvolvimento social do Brasil, exatamente no momento em que o país mais precisa.

*Chico Müssnich é sócio-fundador do BMA - Barbosa, Müssnich, Aragão; Franciny de Barros é sócia da área de Direito Tributário no BMA - Barbosa, Müssnich, Aragão

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