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Reforma tributária: e o papel das empresas

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Por Fernando Silveira
Atualização:
Fernando Silveira. Foto: Divulgação

A reforma do modelo de tributação de empresas no Brasil é um tema antigo e, de certo modo, até desgastado. Muitos empresários e técnicos chegam demonstrar descrença com relação a uma mudança significativa, mesmo com o destaque que o assunto teve nas eleições de 2018, ao longo dos últimos 2 anos e, mais recentemente, com a presidência de Artur Lira na Câmara.

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Entretanto, a situação fiscal do país e o contexto político (intensificado pela CPI do COVID-19) fizeram com que a Reforma Tributária se tornasse de fato um tema prioritário, seja pela necessidade de ajuste nas contas públicas para fazer frente aos gastos da pandemia, ou para sinalizar ao mercado a seriedade no tratamento do balanço fiscal, como condição de reduzir custo de dívida, e atrair investimentos.

Nesse cenário, empreendedores e executivos são chamados mais uma vez a analisar as propostas de reforma em discussão e a responder a seus investidores e demais stakeholders as seguintes perguntas: qual é a reforma provável a ser implementada? Essa proposta trará mais benefícios para economia de modo geral? E quais serão os efeitos para os resultados do seu negócio?

Entendimento sobre três cenários

Sobre a reforma provável, devemos ter em perspectiva ao menos três caminhos claramente possíveis. A PEC n. 45/19 propõe talvez a reforma mais disruptiva, com a criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de âmbito nacional, unindo IPI, ICMS, PIS/COFINS e ISS, com tributação no destino e alíquotas individuais para União e Estados e Municípios. Essa proposta prevê um período de transição de 10 anos, mas promete, ao final, um modelo baseado em pagamento único, com poucas ou nenhuma exceção e com um modelo de incentivos via transferência de renda e não mais a redução de tributos.

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A PEC 110/19 prevê a união, além dos tributos unificados na PEC/45, do IOF, CIDE-Combustíveis e Salário-Educação. Esta proposta permite a criação de incentivos para alimentos e outros setores. Seu prazo de transição é de 5 anos e ela abrange ainda outras mudanças na legislação tributária, tais como a extinção da CSLL, a transferência da competência do ITCMD para os municípios e a ampliação da base do IPVA.

Correndo em paralelo e como favorita, vem a proposta de reforma do governo federal, que teve início com a apresentação o PL n. 3887/20, que propôs a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para unificar e simplificar o PIS/COFINS. Mais recentemente o governo passou a apoiar ainda a PEC 128/19, que propõe tributação de dividendos, a criação de um imposto sobre movimentações financeiras (nos moldes da CMPF) e a criação de um chamado IVA Dual (um IVA para União e outro para Estados e Municípios).

Posicionamento e voz

Diante da multiplicidade de caminhos e da complexidade dos temas, empreendedores e executivos podem se ver atônitos sobre como se posicionar. Industriais e varejistas, que sofrem pesadamente com o ICMS e com o PIS/COFINS, parecem ser mais próximos da ideia de uma tributação mais simples sobre o consumo, que é proposta pelas PECs 45 e 110/19. Já prestadores de serviços, baseados em mão de obra intensiva, se mostram receosos com o possível aumento dos débitos sobre suas receitas sem o correspondente aumento nos créditos sobre suas compras - considerando que a folha de pagamento não gera direito a créditos de impostos.

Parte do setor de serviços parece gostar da ideia de um tributo sobre movimentações financeiras para subsidiar uma redução dos tributos sobre a folha. O que se defende é que uma redução nos encargos previdenciários poderia resultar no aumento do número de contratações, e consequentemente, impulsionar um ciclo virtuoso econômico. Essa premissa traz certo risco, porque deixa de levar em consideração que parte do desestímulo ao emprego formal vem das regras trabalhistas e não apenas do custo previdenciário.

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Tecnologia como uma grande aliada

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A divisão entre um IVA único nacional ou dois IVAs, um federal e outro para Estados e Municípios, passa pela discussão sobre os prejuízos que a multiplicidade de tributos traz para a atividade empreendedora. Muitos defendem que o fator que mais repele a atividade empreendedora e os investimentos no Brasil não é a carga tributária em si, mas sim, a complexidade da gestão de tributos e a insegurança jurídica na aplicação das regras. Para essa causa, o remédio deve ser a adoção de tecnologia e a simplificação das regras de pagamento e informação dos tributos.

Uma reforma que faça diferença no dia a dia das empresas precisa acabar com a confusão de códigos obrigatórios como CEST, CST, CFOP, EAN, NCM, CNAE, e precisa simplificar a forma com que o fisco acessa os dados dos contribuintes. É preciso que o fisco passe a enxergar o contribuinte como seu cliente e a proporcionar a ele formas fáceis e simples de apurar e recolher seus tributos. É fundamental que as exceções e regimes especiais sejam restringidos a casos realmente excepcionais, e que tais exceções sejam transparentes. É preciso que a administração tributária use as tecnologias disruptivas e a cultura digital para proporcionar um sistema que coloque o Brasil à frente na rota dos investimentos.

O cenário de aprovação da CBS e o caminho de reforma proposto pelo governo parece estar se aproximando de uma resolução. Diante disso, as empresas se vêm cada vez mais próximas de ter que se posicionar sobre qual caminho defender, tanto do ponto de vista do seu negócio quanto do ponto de vista de benefício para a sociedade como um todo. As discussões sobre os melhores caminhos serão mais ricas e o resultado final terá mais legitimidade quanto mais empreendedores e executivos forem capazes de colocar suas dores e participar ativamente no processo. Afinal, sempre que regras de negócio são definidas apenas por burocratas, quem sai perdendo é o empreendedorismo como um todo.

*Fernando Silveira é advogado especialista na Área Tributária e CEO da Nutax Digital

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