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Reforma do ITCMD em curso

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Por Pablo Francisco dos Santos e Fabrizio de Lima Pieroni
Atualização:
Pablo Francisco dos Santos e Fabrizio de Lima Pieroni. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Recentemente, o ITCMD, tributo de competência estadual e incidente sobre doações e sucessões causa mortis, encontra-se no centro dos debates no cenário jurídico nacional.

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Duas decisões recentes, proferidas por nossas cortes superiores, deflagraram o interesse pelo assunto. O STF, ao julgar em 26/02/2021 o Tema n.º 825 de Repercussão Geral, reconheceu a impossibilidade de que Estados e Distrito Federal editassem leis próprias para a exigência do tributo sobre doações e heranças provenientes do exterior, à míngua da existência de lei complementar federal sobre o assunto. Prevaleceu o entendimento de que, na falta de lei complementar, os Estados e Distrito Federal não poderiam fazer uso da competência legislativa plena, instituindo, por lei local, o ITCMD incidente sobre indigitados fatos geradores.

O STJ, por sua vez, em julgamento realizado no dia 28/04/21, desferiu outro golpe mortal contra a competência tributária dos Estados e Distrito federal no tocante ao ITCMD. Ao julgar o Tema n.º 1048 de Recursos Repetitivos, o Tribunal da Cidadania reconheceu que, no caso de doações, o termo inicial da contagem para lançamento do tributo seria o primeiro dia do ano seguinte àquele da ocorrência do fato gerador (art. 173, I, do CTN), e não o momento em que a Fazenda Pública estadual ou distrital viesse a tomar conhecimento do evento.

Diante deste quadro, voltou à baila a necessidade da edição da lei complementar sobre o ITCMD prevista no art. 155, § 1º, III, da CF/88, cuja omissão do Congresso Nacional já supera a casa dos trinta anos. E, para alento dos erários estaduais e distrital, foi proposto em 04/05/2021 o Projeto de Lei Complementar (PLP) de n.º 67/2021, de autoria do Deputado Ricardo Barros, que procura equalizar estas e outras questões, uniformizando a disciplina do ITCMD em todo o território nacional.

No tocante aos dois temas objeto dos recentes julgamentos, o PLP n.º 67/2021 encaminha soluções que, a nosso ver, mostram-se adequadas. Relativamente à competência para a exigência do tributo nos casos em que o doador tenha domicílio ou residência no exterior e, ainda, nos casos em que o "de cujus" possuía bens, era residente ou domiciliado ou tenha o seu inventário processado no exterior (objeto do Tema 825 de Repercussão Geral), a disciplina é dada pelo art. 3º do PLP, que trata, com regras distintas, os casos de sucessão causa mortis e doação.

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Tratando-se de sucessão por morte, os critérios adotados variam de acordo com a natureza do bem (móvel ou imóvel), sua localização (Brasil ou exterior), o domicílio do falecido (Brasil ou exterior) e o local onde se processou o inventário. Em resumo, tem-se: (i) tratando-se de imóvel no Brasil, a competência é da unidade federativa em que situado; (ii) bem imóvel no exterior com falecido domiciliado no Brasil, a unidade federativa de seu domicílio; (iii) bem imóvel situado no exterior e falecido domiciliado no exterior, a unidade federativa do domicílio do sucessor no Brasil; (iv) bem móvel situado no Brasil ou exterior e falecido domiciliado no Brasil, a unidade federativa de seu domicílio; (iv) bem móvel situado no Brasil ou exterior e falecido residente no exterior, a unidade federativa de seu sucessor.

No caso de doação, os critérios são basicamente os mesmos: (i) tratando-se de imóvel, o tributo compete à unidade federativa em que situado, quer seja o donatário residente no Brasil ou exterior; (ii) no caso de imóvel no exterior, em que o donatário seja domiciliado no Brasil, a competência é da unidade federativa em que domiciliado; (iii) por fim, tratando-se de bem móvel, a unidade federativa do domicílio do donatário, quer esteja o bem no Brasil ou no exterior.

A proposta também cuida do termo inicial para lançamento do ITCMD, acolhendo, aparentemente, a argumentação dos Estados, em sentido contrário ao quanto decidido pelo STJ no julgamento do Tema n.º 1048. O art. 23, II, do PLP basicamente repete a redação do art. 173, I, do CTN, mas exige que o termo inicial se dê com base nas informações necessárias à formalização do crédito tributário, obtidas do contribuinte ou disponibilizadas à Administração Tributária, como ocorre, hoje, com o convênio celebrado entre Estados e a Receita Federal. Se o contribuinte tem o dever instrumental de informar à Administração Tributária a ocorrência do fato gerador do ITCMD, sua omissão não pode imputar ao Estado a grave consequência da decadência.

Como se vê, o projeto procura resolver gargalos regulatórios no tocante ao ITCMD, dando solução a problemas que tem gerado grande repercussão social, a exemplo da notícia recentemente veiculada pelo Jornal Folha de São Paulo (edição de 10/10/2020) de que determinada família teria repatriado 50 bilhões de reais dentro de um processo de sucessão patrimonial.

*Pablo Francisco dos Santos, procurador do Estado de SP, mestre e doutor em Direito Empresarial pela PUC-SP e professor de Direito Empresarial na PUCCAMP

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*Fabrizio de Lima Pieroni, procurador do Estado de São Paulo, mestre em Direito, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo e diretor de Assuntos Legislativos da ANAPE

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