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Recuperação judicial no Botafogo: é possível?

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Por Odair de Moraes Jr.
Atualização:
Odair de Moraes Jr. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Diante a possibilidade do Botafogo se tornar uma sociedade anônima, também foi cogitada a probabilidade de um dos maiores clubes do Rio de Janeiro acionar a lei de falências e recuperação judicial para se reestruturar financeiramente. Considerando que, em uma interpretação literal, a recuperação judicial somente pode ser aplicada em sociedades empresárias, não incluindo entidades associativas, fundações ou federações, estas ainda assim podem utilizar da lei 11.101 para se reestruturar financeiramente e pagar os seus credores?

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Como exemplo de entidades que obtiveram êxito na solicitação de recuperação judicial podemos citar o primeiro caso que aconteceu no Brasil, em 2006: o Hospital Casa de Portugal. Isso somente foi possível pois, mesmo sendo uma entidade sem fins lucrativos, o hospital também é considerado um agente econômico, ou seja, gera receitas, tributos, passivos, empregos. Assim como clubes de futebol.

Então por que algumas entidades desportivas, como o Botafogo, ainda não solicitaram recuperação judicial mesmo diante de grande crise financeira?  Um dos motivos é a insegurança da governança sucessora não seguir com o que foi acordado, trazendo consequências para o responsável que assinou o plano de recuperação judicial.

Se uma nova gestão assumir e não cumprir com o que foi compactuado com o presidente antecessor, as responsabilidades recairão naquele que assinou o plano, ainda que não seja mais o responsável pelo clube. Este problema pode ser resolvido com a alteração do estatuto expondo que, se deferido o processo de recuperação judicial, automaticamente o mandato do governante do clube fica atrelado até final do cumprimento da recuperação judicial.

Outro motivo importante é que a recuperação judicial é vista como um demérito, como se colocasse ainda mais em pauta a má gestão do clube, tendo como resultado a perda de patrocínios. Além disso, o medo do risco de falência decretada caso não seja possível seguir com o plano também prevalece. Na prática o que ocorre é exatamente o contrário: a recuperação judicial demonstra seriedade e a preocupação da entidade de se recuperar, além da legislação brasileira proteger o devedor, vigorando o princípio da preservação da atividade.

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Ainda assim, o Botafogo coloca a recuperação como plano B, pois a prioridade é transformar a entidade em sociedade anônima. Transformar o Botafogo em S/A é a salvação? Isso depende exclusivamente da gestão. Importante mencionar que, na transformação de uma entidade sem fins lucrativos para um clube empresa, as responsabilidades são diferentes e os sócios respondem em sua totalidade por diversos problemas como má gestão, reclamações trabalhistas, falta de pagamentos de tributos, entre outros. A transformação de uma S/A separa a parte social do clube com a atividade predominantemente exercida, no caso, o futebol, fazendo com que ambos sejam contaminados com dívidas.

Ponderar os riscos em transformar uma entidade desportiva em uma sociedade anônima, adiando solicitação de uma recuperação judicial, devem ser consideradas na tomada de decisão, pois ter uma gestão compromissada e responsável em quitar as dívidas é primordial para que a crise financeira não seja irreversível.

No momento em que algum clube assumir integralmente e com seriedade os bônus e os ônus trazidos pela legislação, abrirá caminhos para que outras sigam os mesmos passos para se reestruturar financeiramente. Os entraves políticos e a preocupação da responsabilidade dos governantes, que hoje evitam essa possibilidade, devem ser superados para que possam significar a reestruturação do clube. E quanto mais rápido, melhor.

*Odair de Moraes Jr., advogado especialista em recuperação judicial e direito empresarial e sócio do escritório paulistano Moraes Jr. Advogados

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