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Racismo obstétrico: o preconceito que marca desde o nascimento

Por Jacqueline Beltrami de Jesus
Atualização:

Jacqueline Beltrami de Jesus. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

As mulheres negras têm duas vezes mais riscos de morrer durante o parto, de acordo com dados do Ministério da Saúde de 2008 a 2017, obtidos pela Gênero e Número. O número pode ser visto como um dos resultados do racismo obstétrico, que junta a violência obstétrica e o racismo dentro das salas de parto.

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Por definição, a violência obstétrica é enfrentada por pessoas que dão à luz, na qual são submetidas a inúmeros atos de violência que abrangem tratamento desumano, abuso médico e violações pela equipe médica que está acompanhando a gestante, podendo acontecer no pré-natal, no parto e no pós-parto. Já o Racismo médico (que abrange toda a equipe médica envolvida) ocorre quando a raça do paciente influencia as percepções do médico e ou equipe, bem como o tratamento relativo ao diagnóstico, podendo colocar o paciente em risco.

O termo é novo na sociedade atual, principalmente na brasileira, mas na verdade trata-se de um reflexo da estigmatização histórica da gestação de mulheres negras. No período escravocrata, por exemplo, a reprodução dessas mulheres era usada para sustentar a economia escravagista, através do uso de mulheres escravizadas no desenvolvimento do estudo ginecológico, bem como a ocorrência de procedimentos de esterilização sem autorização. De acordo com levantamento realizado pela Revista AzMina com mais de 100 mulheres negras, 67,2% disseram ter sido vítimas de racismo durante o atendimento médico e 16,4% afirmaram que o tratamento hostil que receberam talvez tenha sido por conta da cor da pele, sendo que com mais da metade das mulheres entrevistadas ocorreu justamente na obstetrícia.

A prática do racismo obstétrico ameaça a vida das mães, de seus filhos e de toda experiência neonatal, pois não limita ao exercício médico de diagnóstico ou à realização de procedimentos sem necessidade ou consentimento, mas constrói um ambiente de negligência, desdém e desrespeito às escolhas particulares e ao plano de parto definido com a gestante, lhe causando dor física e psicológica, e podendo acontecer em instituições médicas públicas ou privadas.

As mulheres recebem o tratamento pautado no racismo obstétrico, interpretado por suas experiências em sociedade, como segregação, capitalismo racial, preconceito e experimentação médica, baseados no passado na qual foram demonizadas, estereotipadas, violentadas e policiadas, influenciando o comportamento inclusive na hora do parto.

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É de suma importância que mulheres realizem as denúncias e procure ajuda jurídica caso tenham sofrido racismo obstétrico ou que tenham se sentido desrespeitada no momento do parto ou pós-parto. A pauta do racismo presente na saúde vai além dos profissionais envolvidos, passando pela questão estrutural e institucional, sendo desde a formação destes médicos até os protocolos estabelecidos pela instituição de saúde com a construção de políticas públicas que possam conscientizar e erradicar essa prática nos hospitais públicos ou particulares.

Todas as mulheres têm direito a um parto seguro, com dignidade e respeito, não se baseando em raça, nacionalidade, cultura ou religião.

Artigo produzido para o mês da consciência negra por inciativa da Comissão de Igualdade Racial da OAB SP

*Jacqueline Beltrami de Jesus é coordenadora do Núcleo de Direito  Antidiscriminatório da Comissão da Jovem Advocacia da OAB SP

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