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Quem pagará a conta?

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Por Stéfano Ribeiro Ferri
Atualização:
Stéfano Ribeiro Ferri. FOTO: DIVULGAÇÃO  

No apagar das luzes, há poucos dias do recesso parlamentar, causa apreensão o fato de que uma ala do Governo Federal combine esforços para a confecção de Decreto Presidencial, calcado na Instrução Normativa nº 4, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) - que dispõe sobre os requisitos mínimos de segurança cibernética a serem seguidos no estabelecimento das redes 5G - com o objetivo de restringir a participação da fabricante chinesa Huawei do fornecimento da tecnologia 5G no país, cujo leilão é esperado para 2021.

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O alvoroço salta aos olhos e deve ser analisado com cautela pelo Palácio do Planalto, pois, qualquer passo em falso pode provocar danos significativos ao setor de telecomunicações, como, por exemplo, desequilíbrio de custos e atrasos no processo de transformação digital do país, prejudicando não apenas as empresas brasileiras atuantes no segmento, mas, também, o consumidor final.

A questão deve ser observada de forma ampla, considerando que os reflexos de uma decisão precipitada poderão ser sentidos em outras áreas fundamentais ao desenvolvimento econômico - basta saber que a China não é nada menos que o principal parceiro comercial do Brasil, sendo responsável por 40% das exportações brasileiras no primeiro semestre de 2020, gerando a cifra estratosférica de US$ 20,5 bilhões.

Uma preocupação com os riscos à proteção da tecnologia 5G foi demonstrada pelo Ministro do GSI, Augusto Heleno, ponderando a necessidade de prevenção de ataques cibernéticos e ações de espionagem. O âmago da questão pode até ser legítimo - não se perca de vista o recente ataque à rede de informática do Superior Tribunal de Justiça (STJ) - desde que não se misture com questões ideológicas.

Sabe-se que o Governo Federal, no dia 10 de novembro de 2020, aderiu aos princípios da iniciativa "Clean Network" - lançada pelo governo de Donald Trump, como forma de incentivo para que países retirem de suas redes de telecomunicações fornecedores "não confiáveis", sob os auspícios de promover um ambiente seguro para a nova tecnologia. Na verdade, a epístola carrega o interesse recôndito dos EUA em assumir a dianteira na competição pela liderança tecnológica, à guisa de preocupação com a segurança cibernética mundial.

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Por mais que existam entusiastas de plantão, adeptos da teoria da conspiração e do terraplanismo, o debate deve ser feito de forma objetiva. Veja-se que até mesmo as principais empresas do setor - que participarão do leilão da tecnologia 5G - ameaçaram acionar o Poder Judiciário caso a Huawei seja banida do país, para buscar indenização em face do governo por investimentos já realizados utilizando a tecnologia chinesa.

Não obstante, causa estranheza que eventual banimento seja feito por Decreto Presidencial (medida unilateral e de exceção), e não por lei, ignorando a forte presença da companhia chinesa nas redes 3G e 4G no país - somando-se a isso o fato de que a tecnologia 5G será estruturada sobre as redes 4G - de modo que banir qualquer empresa já atuante no Brasil exige troca de equipamentos e aumento de custos, o que tem de ser observado detalhadamente pelo governo.

Se o debate deve ser pautado por elementos concretos, a posição a ser adotada pelo Palácio do Planalto deve ser salomônica, priorizando sempre o caráter técnico das decisões, o livre mercado, o estimulo à concorrência e a proteção do setor privado, para que o prejuízo maior não seja suportado pelo consumidor final.

*Stéfano Ribeiro Ferri, sócio do Ortiz & Ferri Advogados. Pós-graduando em Direito Corporativo pelo Ibmec

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