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Quem é responsável pela possível morte ou sequela pós-vacina quando empresário obriga funcionário a se vacinar?

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Por Marcelo Lucas
Atualização:
Marcelo Lucas. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Polêmicas envolvendo a vacinação contra a Covid-19 no Brasil parecem não ter fim. Seja demora no começo, seja falta de dose, sejam especulações em relação à comprovação ou qual seria a melhor fabricante, entre tantas outras. Mas a mais recente envolve outro aspecto que merece muita atenção: a demissão de um empregado por falta de vacina.

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Observa-se: um empregador tem o direito de demitir um funcionário se ele escolhe não se vacinar contra o coronavírus? Ou o empregador pode, em um processo seletivo, optar por um candidato vacinado em vez do outro?

É preciso inicialmente relembrar a Constituição Brasileira de 1988, nossa Carta Magna, que diz na cláusula pétrea que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". Portanto, já inferimos como inconstitucional a obrigação da vacina e de forma discriminatória a escolha de um candidato a um emprego por essa questão.

Adiante: na qualidade de importador e distribuidor de vacinas (ou de qualquer outro produto medicinal) ao cidadão, o Estado se enquadra na definição de fornecer, prevista no art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, motivo pelo qual deve observar fielmente a Lei Federal 8.078/1990 , que o aprovou.

Dessa forma, na condição de consumidor, o cidadão tem o direito de exigir o cumprimento da referida lei para obter informação clara e precisa sobre o que consome, bem como para invocar a sua liberdade de escolha, fundada no princípio da autonomia da vontade, ou autodeterminação.

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Num caso específico que o processo tramita na 13ª Vara Cível Federal do DF tem como pedido principal a suspensão dos incisos da portaria do Ministério do Trabalho e Previdência que proíbe empresas de demitirem, por justa causa, pessoas que não estão imunizadas contra a Covid-19. A norma também define como discriminatória a não contratação de candidatos que não tomaram vacina. A portaria nº 620 foi publicada no Diário Oficial no dia 1º de novembro

"Ao empregador é proibido, na contratação ou na manutenção do emprego do trabalhador, exigir quaisquer documentos discriminatórios ou obstativos para a contratação, especialmente comprovante de vacinação, certidão negativa de reclamatória trabalhista, teste, exame, perícia, laudo, atestado ou declaração relativos à esterilização ou a estado de gravidez", diz a portaria.

A portaria também cita o artigo 7º da Constituição Federal que proíbe qualquer prática discriminatória no ato de contratação por motivos de "sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros", considerando que o pedido de certificado de vacinação, bem como a demissão por justa causa motivada pela recusa, são também "segregacionistas".

Em outro caso concreto, a Prefeitura de São Paulo em uma ronda para identificar servidores que não se vacinaram contra a Covid-19, identificou três funcionários comissionados que recusaram a imunização contra a Covid-19. Eles foram demitidos. Os desligamentos foram publicados no Diário Oficial do município. A decisão de demitir as pessoas foi amparada por um decreto publicado este ano, que tornou obrigatória a vacinação contra a Covid-19 de servidores e funcionários públicos municipais.

E esta semana uma grande empresa aérea começou a exigir que todos os funcionários se vacinem contra a Covid-19. Segundo o presidente da companhia, haverá exceção apenas para casos em que, por exemplo, o funcionário não se vacine por alguma recomendação médica.

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Esse ponto é muito importante a qual foi mencionado no começo do artigo e merece destaque, pois mesmo empresas que obrigam a vacinação de funcionários também colocam exceções "em caso de recomendação médica", pois ninguém quer ter a responsabilidade de mandar um funcionário se vacinar sem saber se ele pode ter alguma reação adversa.

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E se tiver? Quem terá a responsabilidade? Já houve notícias de uma grávida que perdeu o bebê após tomar a vacina. Não há comprovação de que tenha sido causado pela vacina, mas também não há comprovação contrária. E não se pode julgar quem tem medo de uma possível reação negativa ou sequela.

As fabricantes das vacinas, por exemplo, fizeram com que o governo federal assinasse, durante a compra das vacinas, termo isentando as empresas de quaisquer reações adversas e/ou sequelas na população. Ora, se nem a fabricante tem a responsabilidade, quem terá? E com essa isenção, como obrigar um brasileiro a vacinar?

Para o ministro Onyx Lorenzoni, do Trabalho, a prática de empresas ou órgão pela demissão viola a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), além de artigos da Constituição Federal, dentre eles o 5°, a qual já citei, "pois nenhum cidadão ou trabalhador deve ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

Em maio deste ano, uma ex-auxiliar de limpeza de um hospital perdeu ação judicial em que contestava a demissão por justa causa em razão de não ter se vacinado contra a Covid-19. Nesse caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região entendeu que a imunização compulsória "é perfeitamente legal".

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A campanha de vacinação em maio estava no começo ainda. Sem respostas concretas à população, principalmente à mais carente. Se essa auxiliar se vacinar e tiver sequela quem vai arcar com a responsabilidade? O patrão ou a empresa? Ou ninguém? Ela certamente poderia se vacinar se tivesse alguma comprovação científica da fabricante da vacina. Mas nem mesmo essa empresa dá garantia. Quem dará?

Dessa forma, diante da própria Constituição é proibido obrigação de algum cidadão se vacinar, principalmente com vacinas experimentais, que são os casos das vigentes no Brasil. E não existem comprovação científica definida. Em suma, é preciso destacar também que não existe lei federal obrigando os brasileiros a se vacinarem. Logo, não deve existir punição a quem escolhe não se imunizar.

*Marcelo Lucas é advogado especialista em matérias públicas e privadas, CEO do escritório Marcelo Lucas Advocacia, com atuação no Brasil e em Dubai, e presidente da Comissão de Integração com a Sociedade Civil da OAB-DF

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