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Queiroz Galvão representa 'todos os pecados' combatidos pela Lava Jato

Empreiteira alvo da 33ª fase, Operação Resta Um, que tem o terceiro maior volume de contratos sob investigação na Petrobrás, teria pago propinas por meio de doações oficiais, repasses de dinheiro e contas secretas para PT, PP, PMDB e PSDB; juiz apontou risco às investigações e de continuidade dos esquemas de corrupção ao mandar prender dois ex-executivos do grupo

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Foto do author Fausto Macedo
Foto do author Julia Affonso
Por Ricardo Brandt , Fausto Macedo , Julia Affonso e enviado especial a Curitiba
Atualização:
 

A Operação Lava Jato atinge em sua 33ª fase, deflagrada nesta terça-feira, 2, a terceira empreiteira com maior volume de contratos na Petrobrás, que integrava o cartel acusado de adotar a corrupção "como regrado jogo" na estatal, a Queiroz Galvão. Dois ex-executivos que atuariam em conluio com agentes públicos e políticos foram presos sob a suspeita de manterem em prática crimes na estatal e em outros contratos do governo, além de oferecerem riscos às investigações.

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"O contexto não é de envolvimento episódico em crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, mas de atuação profissional, longa e sofisticada, no pagamento de propinas em contratos públicos, com utilização de expedientes de ocultação e dissimulação relativamente complexos, inclusive com o emprego de contas em nome de off-shores no exterior para repasse de propinas", registra juiz federal Sérgio Moro, ao decretar as prisões e buscas da operação.

Com R$ 20 bilhões em contratos na Petrobrás sob investigação da Lava Jato, a Queiroz Galvão é a última das grandes empresas que teriam estruturado o cartel, dividindo obras, com regras de estatuto de campeonato de futebol - origem do nome da 33ª fase, Operação Resta Um. Odebecht, OAS, Camargo Corrêa e UTC já têm executivos alvos de ações penais, na Justiça Federal, em Curitiba.

Foram cumpridos 23 mandados de busca e apreensão, 2 de prisão preventiva, 1 de prisão temporária e 5 de condução coercitiva em cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás, Pernambuco e Minas Gerais.

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Pelo menos R$ 20 milhões de propinas foram identificados no inquérito, até aqui.

Foram detidos na 33ª fase os ex-executivos do grupo Ildefonso Colares Filho e Othon Zanoide Moraes Filho, que chegaram na sede da Polícia Federal do Rio, na zona portuária, por volta das 10h30. O juiz Sérgio Moro decretou ainda prisão temporária para Marcos Pereira Reis, que era o diretor Financeiro da Quip S/A, empresa que tem a Queiroz como sócia, encarregado diretamente em ordenar os pagamentos de propinas por meio de transações financeiras no exterior. Ele está fora do País e ainda não foi detido.

Os dois ex-diretores presos já haviam sido alvos de pedidos de prisão, em novembro de 2014, quando foi deflagrada a 7ª fase da Lava Jato - primeiro avanço contra membros do grupo empresarial do esquema de corrupção na Petrobrás. Eles foram detidos temporariamente e liberados. Os dois também não haviam sido denunciados criminalmente pela Procuradoria, nos primeiros pacotes de acusações contra o grupo.

Ficaram de fora "pela necessidade de colher melhores provas do pagamento de propina por ela", registrou Moro, ao decretar as prisões. "Desde então o quadro alterou-se, pelo acúmulo progressivo de provas."

 Foto: Estadão

Provas. Foram levantadas provas de que a empreiteira teria atuado no esquema de corrupção da Petrobrás, como as obras das refinarias Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, Refinaria do Vale do Paraíba (Revap), em São Saulo, e Refinaria Duque de Caxias (Reduc), no Rio, além de negócios na construção com Complexo Petroquímico do Rio (Comperj).

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A Procuradoria da República e a Polícia Federal apontam que a Queiroz Galvão praticou todos os tipos de crimes alvos da força-tarefa da Lava Jato: corrupção, lavagem de dinheiro por meio de doações partidárias e eleitorais oficiais, remessas ao exterior em contas de offshores, contratos fictícios com doleiros e operadores financeiros, obstrução de apurações, cartel e majoração de preços na estatal.

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"Todos os pecados, toda espécie de crime", disse o procurador Regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima, em entrevista, em Curitiba, ao apontar que a Queiroz Galvão é um exemplo do esquema sistematizado de corrupção no governo.

Um dos fatos recentes que pesaram na decisão foi a atuação de Colares e Moraes para auxiliar e incentivar o ex-diretor Financeiro da Queiroz Galvão Augusto Amorim Costa em deixar o País, em novembro de 2014, três dias depois de serem soltos das primeiras prisões temporárias.

"Desde então Augusto Amorim Costa permanece refugiado no exterior. O fato de subordinado de Ildefonso Colares Filho e de Oton Zanóide de Moraes e pessoa especificamente envolvida no repasse de propinas ter se refugiado no exterior após o início das investigações é mais um indicativo de risco à investigação e à instrução, soando o ato como dissipação de provas."

Moro considerou nas provas haver "risco à instrução e à investigação, considerando a conduta pretérita de obstrução da CPI da Petrobrás, a produção de documentos falsos para justificar falsamente fatos penais relevantes e o fato de subordinado dos investigados ter deixado o país em circunstâncias que sugerem dissipação de provas". "Presente, portanto, um dos fundamentos da preventiva, risco à investigação e à instrução."

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Partidos. Com as prisões de dois ex-executivos do grupo, a força-tarefa chega aprofundas as apurações iniciadas em 2014, em obras de refinarias, petroquímica e plataformas da estatal, que podem atingir, além do PT e PP, o PMDB e o PSDB.

 

Além de pagamentos de propina para os ex-diretores da Petrobrás Paulo Roberto Costa (Abastecimento) e Renato Duque (Serviços), contratos fictícios com os doleiros Alberto Youssef e Leonardo Meirelles, doações ao PP, PT e PSDB. O senador Sérgio Guerra (morto em 2014), que era presidente do partido em 2009, teria recebido R$ 10 milhões para abafar um CPI no Congresso, que investigava os contratos da Petrobrás.

O dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, também confessou em delação premiada que a Quip S/A, em que a empreiteira era sócia da Queiroz Galvão, pagou R$ 2,4 milhões para o PT via doação não oficial para a campanha de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006.

A Queiróz Galvão também foi citada na delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que citou o presidente em exercício Michel Temer (PMDB) em propina da para campanha eleitoral em São Paulo. Segundo o delator, houve uma suposta operação de captação de recursos ilícitos, envolvendo Temer e o senador Valdir Raupp (PMDB-RR), para abastecer, em 2012, a campanha do então candidato Gabriel Chalita (ex-PMDB, atualmente no PDT) para a Prefeitura de São Paulo. A empreiteira teria repassado R$ 1,5 milhão para o esquema.

Machado, que era indicado do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), no cargo que ocupou de 2013 a 2015 na Transpetro, relatou à Procuradoria-Geral da República que em conversas com o padrinho político e com o ex-senador José Sarney (PMDB-AP), em fevereiro, foi mencionado o receio em relação a uma delação premiada dos executivos da Queiroz.

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Para o procurador Carlos Fernando, da força-tarefa da Lava Jato, "o problema da corrupção não é partidário". "O problema da corrupção é estrutural da política brasileira", declarou Carlos Lima. "Temos fatos envolvendo campanhas do PT e também esse caso do PSDB, que era oposição. Isso nos mostra que o problema da corrupção não é partidário."

 

Novas provas. A Queiroz Galvão era investigada desde agosto de 2014, quando o primeiro delator da Lava Jato, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa citou o envolvimento de seus executivos no esquema de cartel e corrupção na estatal. O doleiro Alberto Youssef confirmou e apontou ter conhecimento de uma contabilidade de US$ 24 milhões de dívida da empreiteira com a propina para o PP.

"Foram encontrados novos contratos fictícios, um deles de US$ 1,2 milhão com empresa de Leonardo Meireles", afirmou a delegada Renata da Silva Rodrigues, da equipe da Lava Jato.

Para o juiz, a medida de prisão preventiva "serve para coibir que um modelo de prática de corrupção para obtenção e execução de contratos públicos seja aplicado ou espalhado em contratos com outras entidades estatais".

Segundo ele, os "crimes foram praticados subrepticiamente", utilizando-se de uma "rede de contas secretas no exterior para repasses de propinas ainda não "desmantelada". "Não há medida cautelar alternativa apta a afastar o risco à ordem pública, já que sequer há notícia do desmantelamento dessa rede", sustentou Moro. "Ademais, quanto ao risco às investigações e à instrução, não há medida cautelar alternativa que possa coibir de forma eficaz novas tentativas de afetação do processo com, por exemplo, o suborno de agentes envolvidos no processo, falsificação de documentos e dissipação das provas."

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Críticas. O juiz da Lava Jato afirmou, no despacho, que "embora as prisões cautelares decretadas no âmbito da Operação Lavajato recebam pontualmente críticas, o fato é que, se a corrupção é sistêmica e profunda, impõe-se a prisão preventiva para debelá-la". "Sob pena de agravamento progressivo do quadro criminoso. Se os custos do enfrentamento hoje são grandes, certamente serão maiores no futuro."

A força-tarefa reuniu nos autos da Operação Resta Um elementos de que os dois executivos presos nesta terça-feira mantiveram "vínculos formais" com a Queiroz Galvão. "Sem olvidar a provável manutenção do controle de fato, observando que a empreiteira é uma das poucas que não realizou qualquer movimentação séria no sentido de negociar  algum acordo de leniência."

Para Moro, "embora o Judiciário seja o guardião das liberdades fundamentais, também tem o dever de proteger vítimas de crimes, indivíduos e toda a sociedade, da reiteração delitiva, máxime em um quadro, em cognição sumária, grave de corrupção sistêmica".

"Excepcional no presente caso não é a prisão cautelar, mas o grau de deterioração da coisa pública revelada pelos processos na Operação Lavajato."

COM A PALAVRA, A QUEIROZ GALVÃO:

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COMUNICADO À IMPRENSA

"A Construtora Queiroz Galvão informa que, na manhã de hoje, a Polícia Federal realizou uma operação de busca e apreensão em algumas de suas unidades. Alguns ex-executivos e colaboradores foram alvos de medidas cautelares. A empresa está cooperando com as autoridades e franqueando acesso às informações solicitadas."

Construtora Queiroz Galvão

 

COM A PALAVRA, O PT:

"O PT refuta as ilações apresentadas. Todas as operações financeiras do partido foram realizadas estritamente dentro dos parâmetros legais e posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral."

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