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Quando o feedback efetivo se transforma em assédio moral

Por Daniele Monteiro
Atualização:
Daniele Monteiro. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Cada vez mais assuntos relacionados ao assédio moral vêm ganhando força. As vozes de Renata, João, Maria, Francisco e José ecoam pelas paredes das empresas, clamando por ajuda e implorando para serem vistos e ouvidos.

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Indiscutivelmente, a forma como uma empresa trata os seus funcionários reflete diretamente na qualidade e produtividade do serviço prestado, bem como, a forma como os colaboradores se relacionam com os demais e se portam no ambiente de trabalho.

O feedback é uma ferramenta de extrema importância, utilizada por líderes e gestores, cujo principal objetivo é ajudar uma equipe ou um determinado funcionário a se desenvolver. Mas calma! É necessário destacar que para que o feedback seja de fato efetivo, é fundamental que aconteça de forma estruturada, em um local reservado, seguro, onde o funcionário não seja exposto aos demais colegas. Além disso, para que a conversa seja oportuna, é importante que seja iniciada com os pontos positivos, caso haja, e ao serem sinalizadas as falhas, é indispensável que alternativas também sejam apresentadas pelo líder.

Neste contexto, o direito de fala do funcionário é essencial, fazendo com que ele se sinta seguro, parte integrante do time e consiga perceber que as portas estão abertas para ele, não o deixando coagido. No entanto, é necessário que a empresa fique atenta e observe se o feedback efetivo não evolui para um assédio moral.

O feedback efetivo, em muitos casos, pode ser considerado uma linha tênue para o assédio moral. É uma ferramenta poderosa, que deve ser utilizada de forma adequada, onde o funcionário consiga entender o que de fato a empresa espera dele e, o mais importante, que o empregado entenda que possui liberdade para se manifestar sobre as suas percepções e expectativas dentro daquele contexto.

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A principal diferença entre um feedback efetivo e o assédio moral é que no primeiro não há uma situação humilhante, constrangedora, ameaçadora e que possa ferir a dignidade do colaborador, ainda que haja uma cobrança de melhor desempenho de suas atividades laborativas.

Assim, se o superior hierárquico de forma estruturada, convida um funcionário à sua sala e apresenta imperfeições nas atividades laborativas, chamando a sua atenção para que melhore o seu desempenho e este tipo de comportamento é o mesmo direcionado ao time, isso é um feedback efetivo.

Necessário, portanto, observar se durante a conversa, o superior hierárquico recorre a críticas excessivas e adjetivos negativos, expondo o seu funcionário a condições vexatórias, e esta situação se repete constantemente de forma reiterada, sistemática e permanente. Outro ponto que precisa de atenção é verificar se o superior não se comporta da mesma forma com os demais funcionários. Essa distinção pode ser considerada assédio moral disfarçado de feedback efetivo.

As empresas, em pleno século XXI, não podem mais fechar os olhos para as questões relacionadas ao assédio moral vivenciado por milhares de funcionários. Este tema precisa ser tratado de forma cautelosa, clara, específica e contundente.

O assédio moral fez (e ainda faz) parte do cotidiano de muitas empresas, e infelizmente, era uma prática comum, tolerável e aceita. Hoje, graças às redes sociais e palestras, o tema vem ganhando ainda mais repercussão, fazendo com que a informação chegue aos assediados e o eco dessas vozes afete, diretamente, a reputação das empresas e do assediador.

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É preciso ficar atento, enfrentar de frente a questão, de forma incisiva, dar a mesma importância dos casos mais sensíveis aos mais complexos e investigar, colocar um ponto final. O combate à prática abusiva tomou força e foi impulsionado pelo movimento #metoo, que viralizou nas redes sociais do mundo todo, onde homens e mulheres compartilham inúmeras histórias de assédios e abusos sofridos.

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Cabe às empresas atentar-se à postura de seus funcionários, principalmente os com altos cargos, pois na medida em que a empresa é inerte à conduta abusiva, poderá também ser responsabilizada, e não apenas o colaborador que a praticou.

Mas empresas, cuidado! A omissão é perigosa. Ela é resultado da concretização do assédio no mundo corporativo e, em alguns casos, o dano à reputação e à imagem da empresa é devastador, trazendo enormes prejuízos em todas as esferas.

Muitas empresas ainda têm a dificuldade em identificar um assediador, e pior, não possuem a expertise necessária para explicar ou lidar com situações que muitas vezes são "veladas", pois acreditam não ser necessário implementar, investir em  treinamentos, palestras, deixando de levar a devida informação de como tratar esse assunto dentro de um ambiente corporativo.

Sabemos que a legislação é omissa, pois ainda não definiu o assédio moral, mas podemos nos socorrer das doutrinas e das decisões dos Tribunais que são claras e o definem como uma conduta abusiva que pode acontecer tanto pelo superior hierárquico em relação a um funcionário (vertical descendente), como o contrário (vertical ascendente).

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Além disso, o ato também pode acontecer entre colegas de trabalho que ocupam a mesma posição, classificado como assédio horizontal, atentando contra sua dignidade e implicando a desestabilização psicológica do funcionário.

Esta conduta é caracterizada quando ocorre uma perseguição e o assediado recebe claramente um tratamento diferenciado dos demais, isso seja pela cobrança do cumprimento de metas ou a realização de um trabalho acima dos limites impostos aos outros, bem como, pelo simples fato de ser excluído dentro do ambiente macro, levando-o a querer pedir demissão, pois fica insuportável conviver diariamente com aquela situação imposta, havendo claramente um vício de consentimento.

Fato é que o universo corporativo não pode mais fechar os olhos e ser omisso com as questões de assédio moral que acontecem em seus domínios.

Nesse viés, é preciso dizer chega, colocar um ponto final, garantindo um ambiente de trabalho seguro e confiável. É preciso virar a chave ao tratar do assunto, quebrando tabu, avaliando a relação do seu grupo de colaboradores, e claro, o mais importante, acompanhar de perto a postura, conduta e prática dos seus líderes em relação ao tema, pois o papel da empresa não é fazer justiça, mas sim, zelar por um ambiente de trabalho sadio, seguro e por uma cultura livre de assédio.

*Daniele Monteiro é advogada e pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho

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