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Promotores do combate ao crime organizado alertam que Lei do Abuso esvazia até cerco ao PCC

Núcleos Gedec e Gaeco do Ministério Público de São Paulo que se dedicam a investigações contra a criminalidade violenta, corrupção e carteis divulgam duro manifesto contra o projeto aprovado na Câmara

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Foto do author Pepita Ortega
Foto do author Fausto Macedo
Por Pepita Ortega e Fausto Macedo
Atualização:

Os promotores dos núcleos Gedec e Gaeco do Ministério Público de São Paulo que se dedicam exclusivamente ao combate ao crime organizado, à corrupção e aos carteis divulgaram nesta sexta, 16, manifesto em repúdio à Lei do Abuso que a Câmara aprovou. Eles alertam que uma consequência da medida será o esvaziamento de suas atividades, o que inclui o cerco sem tréguas ao PCC, a violenta facção criminosa que espalha seus tentáculos pelo País.

Promotores do MPSP que se dedicam ao combate ao crime organizado divulgaram manifesto em repúdio à Lei do Abuso que a Câmara aprovou. Foto: MPSP/Divulgação

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Segundo os promotores 'percebe-se que o propósito inequívoco da iniciativa é impedir, acuar, dificultar e inviabilizar o exercício responsável, eficiente e eficaz da atividade investigativa, repressiva e punitiva do Ministério Público e de outros órgãos e Instituições reconhecidas e admiradas pela sociedade'.

Para eles, 'o efeito prático imediato, talvez não divisado pelos congressistas, é o prejuízo às investigações contra grandes organizações criminosas dedicadas também ao tráfico e a crimes que envolvem violência, como é o caso do Primeiro Comando da Capital - PCC, e outros grupos semelhantes, como redes de pedofilia ou que exploram a atividade sexual de crianças e adolescentes'.

Os promotores que subscrevem o manifesto integram os quadros de dois núcleos de grande expressão da Promotoria paulista, o Gedec e o Gaeco.

O Gedec tem como função essencial a recuperação de ativos ilícitos, a repressão aos delitos contra a ordem econômica, em especial o de formação de cartel e a repressão ao delito de lavagem de dinheiro.

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O Gaeco é o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado.

Os promotores destacam que 'para que a atividade investigativa e repressiva possa ser exercida em sua plenitude, os responsáveis precisam ter serenidade, equilíbrio e, sobretudo, segurança de que o resultado de seus trabalhos, sujeitos a controles internos e externos, não implicará em represálias ou vinganças indevidas'.

Para eles, com a aprovação do projeto da Lei do Abuso, intimidações 'passam a ganhar maior espaço'.

Eles observam que 'ao pretender, por meio de lei, tornar crime diversas atividades típicas e comuns àqueles que investigam e visam combater e reprimir os diversos abusos e crimes verificados em detrimento da sociedade, como uso de algemas, realizações de prisões, efetivação de buscas, o recado dado é claramente uma forma de frear os avanços e a busca constante pela responsabilização dos criminosos, do combate ao crime do colarinho branco e às organizações criminosas, sejam os envolvidos com tais atividades poderosos ou não'.

LEIA A NOTA DE REPÚDIO DOS PROMOTORES DO GEDEC E DO GAECO À APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI Nº 7.596/2017

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"Nós, Promotores de Justiça, integrantes dos 15 Núcleos do Gaeco e do Gedec, do Ministério Público do Estado de São Paulo, frente à aprovação no Congresso Nacional do Projeto de Lei nº 7.596/2017, que cuida dos chamados crimes de abuso de autoridade, vimos, por meio da presente Nota, manifestar o mais profundo repúdio ao texto encaminhado para sanção Presidencial.

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Com efeito, para além de questionamentos atinentes aos aspectos constitucionais de diversos dispositivos, não só no tocante ao mérito mas também no que diz respeito à tramitação, percebe-se que o propósito inequívoco da iniciativa é impedir, acuar, dificultar e inviabilizar o exercício responsável, eficiente e eficaz da atividade investigativa, repressiva e punitiva do Ministério Público e de outros órgãos e Instituições reconhecidas e admiradas pela sociedade.

Não obstante questões pontuais retratadas no projeto aprovado, que fogem por completo à normalidade e esmagadora maioria dos casos, que já ensejam, sem qualquer alteração legislativa, as devidas apurações e responsabilizações, o que se vislumbra e busca é atingir justamente os trabalhos comumente levados a efeito pelos integrantes dos grupos especiais, como os Gaecos e o Gedec, dedicados a combater o crime organizado, a corrupção, a lavagem de capitais e crimes praticados pela internet ou em ambiente virtual.

Por certo, com o aprimoramento de diversas técnicas investigativas e com o avanço das Instituições e da própria sociedade, na compreensão da complexidade dos fenômenos e mecanismos que envolvem a criminalidade organizada, os resultados mais recentes apontam para o combate cada vez mais contundente contra a corrupção de agentes públicos e representantes eleitos pelo voto.

Assim, ao pretender, por meio de lei, tornar crime diversas atividades típicas e comuns àqueles que investigam e visam combater e reprimir os diversos abusos e crimes verificados em detrimento da sociedade, como uso de algemas, realizações de prisões, efetivação de buscas, dentre outros, o recado dado é claramente uma forma de frear os avanços e a busca constante pela responsabilização dos criminosos, do combate ao crime do colarinho branco e às organizações criminosas, sejam os envolvidos com tais atividades poderosos ou não.

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Não bastasse, a possibilidade de responsabilização civil e pessoal, pela prática pura e simples dos deveres de ofício, exercidos sempre sob o controle do Poder Judiciário e das respectivas Corregedorias, com previsões abertas e abstratas, representa atitude somente concebível em regimes autoritários e impositivos, nos quais a defesa da sociedade, a critério dos governantes, pode ou não ser aceita, conforme os interesses que lhes atender, mesmo que dissociados do desejo da população.

O efeito prático imediato, talvez não divisado pelos Congressistas, é o prejuízo às investigações contra grandes organizações criminosas dedicadas também ao tráfico e a crimes que envolvem violência, como é o caso do Primeiro Comando da Capital - PCC, e outros grupos semelhantes, como redes de pedofilia ou que exploram a atividade sexual de crianças e adolescentes.

Para que a atividade investigativa e repressiva possa ser exercida em sua plenitude, em atenção aos anseios e interesses da sociedade, os responsáveis precisam ter serenidade, equilíbrio e, sobretudo, segurança de que o resultado de seus trabalhos, sujeitos a controles internos e externos, não implicará em represálias ou vinganças indevidas, que, com a aprovação do Projeto de Lei, passam a ganhar maior espaço.

Investigar, buscar a responsabilidade de criminosos, sejam eles quem forem, combater o crime de colarinho branco e as organizações criminosas, com o constante receio de ter as conclusões de trabalhos complexos e dedicados sujeitas não mais aos controles já existentes, mas também à possibilidade de responsabilização criminal, civil e administrativa, dentro de previsões genéricas, abstratas e sujeitas a uma variante de interpretações, certamente é mecanismo suficiente para inibir e dificultar as atividades que, especialmente nos últimos tempos, tem sido apoiadas e incentivadas por todos os setores da sociedade.

Por esse motivo, por meio do presente manifesto, comunicamos que caso sancionado o texto, nos moldes em que lançado, restará completamente esvaziada a atividade rotineira e complexa por nós realizada, sob o receio de sempre que envolvidos interesses de pessoas de relevo ou com ingerência política, haver, no mínimo, o transtorno de se defender, seja em ações penais, seja em ações cíveis, pelo fato de realizar unicamente aquilo para o que representamos a sociedade."

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