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Projeto faz modernização necessária na Lei de Recuperação e Falência

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Por Felipe Granito e Thiago Regis F. Donato
Atualização:
Felipe Granito e Thiago Regis F. Donato. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

No auge de sua "adolescência", a Lei 1.101 de 2005, ao que tudo indica, passará por uma importante mudança com a aprovação do Projeto de Lei (PL) 6229/05. Após amplo debate, a Câmara dos Deputados, no dia 25 de agosto, aprovou o PL de autoria do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), que reforma alguns pontos da popularmente conhecida Lei de Recuperação e Falência. Agora, o projeto segue para análise no Senado.

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Sabe-se que a jovem lei necessita de uma reforma para atualização, uma vez que grande parte do processo recuperacional hoje é regido pela jurisprudência. Assim, em meio a uma crise econômica sem precedentes, o poder legislativo se movimenta para aprovar importantes mudanças. Dados da Boa Vista Serviços, em um levantamento feito com base em informações colhidas no Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), registram, em maio de 2020, um aumento de 68,6% nos pedidos de recuperação judicial no Brasil.

Nesta toada, as mudanças na Lei de Recuperação e Falência demonstram-se cada dia mais necessárias e urgentes. Se aprovado no Senado, o PL, dentre outras, traz como principais inovações: (I) incentivo à concessão de crédito para a empresa em recuperação. Há previsão de que os créditos oriundos de empréstimos concedidos à empresa recuperanda possuem preferência aos demais, inclusive com a constituição de garantia de bens pertencentes ao ativo não circulante do próprio devedor ou de terceiros; (II) descontos e prazos maiores para parcelamento de débitos tributários com a União, sendo o prazo de parcelamento previsto de 120 (10 anos). Ainda prevê que os créditos tributários são passíveis de transação tributária (contribuinte legal, Lei 13.988/20) com possibilidade de redução de até 70% da dívida; (III) incentivo à negociação extrajudicial: abre-se previsão de suspensão das execuções contra a recuperanda em até 60 dias para negociação extrajudicial; (IV) possibilidade de ser apresentado um plano de recuperação pelos credores, em caso de rejeição do plano indicado pelo devedor; (V) os créditos trabalhistas, se aprovados pelo sindicato, passam a se sujeitar à recuperação extrajudicial; (VI) previsão de nomeação de um profissional para constatar as reais condições de funcionamento da devedora, consolida-se a chamada perícia prévia, já bastante usada na jurisprudência; e, VII) inexistência de sucessão ou responsabilidade por dívidas a credor ou a investidor.

Visto as principais mudanças, pode-se analisar que o PL reafirma o caráter econômico da recuperação judicial, principalmente no tocante ao Plano de Recuperação Judicial, vez que define que agora os próprios credores podem apresentá-lo em certa situação. Além disso, diante da recente decisão proferida pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, a respeito da exigência de certidão negativa de débitos fiscais para concessão da recuperação judicial - ainda sem caráter persuasivo, sendo mera orientação - mostra-se de extrema importância a previsão de um maior parcelamento e até mesmo desconto nos débitos com a União.

Outra importante análise é em relação à negociação extrajudicial, que consolida a recente orientação do Conselho Nacional de Justiça. Este ponto, inclusive com a previsão de suspensão de execuções, mostra-se de extrema importância para a empresa recuperanda, blindando-a além do já previsto stay period e de atos expropriatórios que inviabilizariam seu funcionamento. Além disso, aumenta consideravelmente as chances de superação da crise momentânea, dando espaço para a negociação e mediação empresarial, desafogando o judiciário brasileiro.

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Fundamentalmente, destaca-se, como principal mudança prevista no PL, a busca pela resolução de um grave problema que as empresas recuperandas encontram: a oferta de crédito. O Observatório de Insolvência da PUC-SP apontou recentemente que apenas 18,2% das empresas encerram o processo de recuperação sem decretar falência, sendo que, 57,1% das empresas não cumprem o plano de recuperação, ficando em um limbo sem capacidade de investimento e geração de caixa.

Sabe-se que a modernização é, quase sempre, necessária para a empresa superar a crise econômico-financeira momentânea que se encontra e, para isso, faz-se necessário investimentos. Nesse contexto, a previsão de preferência de créditos oriundos de empréstimos concedidos à recuperanda em eventual falência, em teoria, facilita o acesso ao crédito com menores juros e melhores condições de pagamento, dando condições à citada modernização e consequente, com uma boa gestão, superação da crise, alcançando o objetivo do processo recuperacional.

No mesmo sentido, de tentar dar maior circulação de créditos e valores no processo recuperacional, como exposto, o PL prevê a inexistência de sucessão de responsabilidade por dívidas para credores ou investidores. Tal mudança busca dar mais segurança a um grande e importante mercado de investimento em outros países como nos Estados Unidos, o mercado de compra e venda dos chamados distressed deals, no Brasil "ativos estressados". Tal dispositivo legal confere segurança jurídica a tal operação, o que, consequentemente, deve gerar uma maior movimentação neste segmento financeiro, impactando diretamente na recuperação da economia brasileira.

Agora, o projeto de lei encontra-se no Senado Federal, sendo o cenário positivo para a sua aprovação. A Recuperação Judicial é um remédio para a empresa que passa por crise financeira e econômica, devendo ser interpretada à luz do princípio da preservação da empresa, buscando proteger a função social que a empresa desempenha na sociedade, efetivando a proteção ao emprego, à renda e aos tributos gerados.

Concluindo, o PL 6629/05, busca modernizar e adequar o processo recuperacional brasileiro para que importantes necessidades demonstradas ao longo desses 15 anos de vigência da Lei de Recuperação e Falência sejam atendidas. Em uma analogia, a adolescente lei atingiu sua puberdade, um período de importantes mudanças, que facilitaram o seu principal objetivo: a preservação das atividades econômicas viáveis, que giram a delicada economia brasileira.

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*Felipe Porfírio Granito é advogado, sócio do GCBA Advogados Associados. Mestre em Direito Processual Civil na PUC-SP. Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Magistratura (EPM). Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor universitário

*Thiago Regis F. Donato integra a equipe do escritório GCBA Advogados Associados

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