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Projeto de lei em SP que proíbe diversidade sexual em publicidade para crianças fere a Constituição

Por Marco Antônio Sabino
Atualização:
Marco Antonio Sabino. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Nos próximos dias, a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) deve votar o projeto de lei 504, de 2020, que proíbe a diversidade sexual em publicidade que se relacione a crianças. O projeto, de autoria da deputada Marta Costa (PSD), veda, no Estado de São Paulo, qualquer publicidade que contenha alusão a preferências sexuais e movimentos sobre diversidade sexual relacionada a crianças.

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A deputada defende sua iniciativa considerando dois pontos: o desconforto emocional de inúmeras famílias causado por esse conteúdo e a baixa capacidade das crianças de discernimento para lidarem com questões sexuais.

A Associação Brasileira de Licenciamento de Marcas e Personagens (Abral) entende que essa iniciativa fere a Constituição federal, por ter como objeto a propaganda comercial, que é de competência privativa da União. Além disso, também agride o dispositivo constitucional que trata da liberdade de expressão das comunicações, isso sem falar na norma fundamental que celebra a igualdade.

O projeto de lei é uma fonte de reflexão e os resultados dessa votação podem demonstrar que País estamos construindo. Dos muito pontos relevantes, o que trata da liberdade de expressão parece ser o catalisador das questões igualitárias e das questões constitucionais. Um passo atrás, estamos falando de censura, o que embaralha ainda mais a discussão. É direito de anunciantes criar a publicidade no âmbito de ampla liberdade, como estabelece a Constituição, sobretudo quando é fundamental que a publicidade reflita a sociedade de hoje em dia.

Provavelmente, alguns dos leitores desse artigo defendem, com todo a legitimidade, a ideia contida no PL. Contudo, é preciso reflexão no caso concreto, porque o projeto implica a restrição de um preceito vital de nossas vidas - a liberdade de expressão -, porque é direito dos anunciantes tratar de temas atuais com ampla liberdade. A pergunta que fica é que se, hipoteticamente, a autora estendesse esse conteúdo para um tipo de religião, de partido político, de time de futebol ou de raça? Qual seria a resposta?

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Conviver com a liberdade de expressão não é para amadores, principalmente em países democráticos como o nosso. É um exercício difícil, de arranjos e tolerância com as diferenças que nem sempre parecem justas, mas são, principalmente, para aqueles que entendem e defendem suas raízes.

O PL flerta com uma perigosa usurpação autoritária da autodeterminação de pais na educação de seus filhos. São os pais os responsáveis por determinar o que seus filhos podem ou não consumir ou a que conteúdos podem ser expostos, com primazia. Além disso, o PL tende a ser inócuo, já que a diversidade é uma feliz realidade de nossa sociedade. Se a criança não puder ver o casal transgênero na publicidade, deverá vê-lo na praça, no parque, na escola.

Há quem defenda, por exemplo, que a publicidade de produtos e serviços consumidos por crianças seja proibida totalmente. É uma censura, já que nem a Constituição baniu a publicidade de qualquer produto lícito. Sustentam, como no projeto de lei, que o conteúdo pode gerar desconforto emocional a inúmeras famílias e, vejam só, também na baixa capacidade das crianças de discernimento para lidarem as mensagens expostas. É um ponto de vista.

Os defensores da censura esquecem que o Brasil atualmente está sob a égide de um modelo jurídico misto, avançado e eficiente. Somos regidos por um arcabouço composto por 22 normas que regem o tema, mais do que o Reino Unido, com 16 normas, e os Estados Unidos, com 15.

Além disso, a regulamentação existente hoje está presente tanto na Constituição Federal como no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que cumpre com grande competência seu papel, com regras aplicáveis a todos os anunciantes, justamente com o objetivo de regulamentar a publicidade, inclusive a de produtos destinados às crianças.

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É mais do que suficiente para regular aquilo que precisa ser regulado. Se a deputada quer contribuir com a discussão, poderia olhar para esse arcabouço jurídico e aperfeiçoá-lo dentro das regras democráticas. Ajudaria no debate e não ultrapassaria os delicados limites da censura.

*Marco Antônio Sabino é membro do Conselho da Associação Brasileira de Licenciamento de Marcas e Personagens (Abral) e head de Mídia e Internet do Mannrich e Vasconcelos Advogados

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