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Projeto de Lei 367/2020: a indispensável adequação do TIT/SP à sistemática de precedentes vinculantes do CPC

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Por Pedro Demartini e Anderson Mainates
Atualização:
Pedro Demartini e Anderson Mainates. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Após cinco anos de vigência da Lei 13.105/2015, doutrina e jurisprudência assentam maior compreensão e familiaridade quanto às inovações promovidas pelo novo Código de Processo Civil (CPC), havendo ampla percepção quanto às suas principais diretrizes estruturais, dentre as quais a valorização da segurança jurídica aplicada à jurisprudência.

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O anseio do legislador, ao positivar um arcabouço capaz de instituir a cultura de precedentes na legislação processual civil, visa, em última análise, equalizar as respostas do Judiciário à expressiva e desafiadora litigiosidade brasileira, porém sem desamparar expressões inequívocas da segurança jurídica, como a isonomia, a previsibilidade, a estabilidade e a uniformidade das decisões.

Seguindo um movimento iniciado pela sistemática de repercussão geral e súmulas vinculantes, instituída pela Emenda Constitucional 45/2004, bem como pela introdução dos recursos repetitivos no revogado CPC/1973, o legislador definiu que determinadas decisões judiciais revestir-se-ão de paradigmas obrigatórios, vinculando a decisão do julgador (art. 927 do atual CPC).

Não por acaso, a legislação processual considera não fundamentada a decisão judicial que deixar de seguir precedente ou jurisprudência invocada pela parte, sempre que não demonstrada a distinção do caso analisado ou a superação do entendimento (art. 489, § 1º, VI, do CPC). E tal disposição é complementada pelo peremptório comando do art. 926 do CPC, o qual determina que os tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente.

Assim, visando fomentar a valorização da segurança jurídica aplicada à jurisprudência, o CPC aparelhou-se dos instrumentos de coletivização de julgamento previstos no art. 927, atribuindo às conclusões extraídas de leading cases eficácia vinculante aos demais casos idênticos.

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Nota-se, assim, que não é atual a necessidade de revisão e adequação da legislação aplicável às decisões proferidas pelos órgãos administrativos de julgamento tributário, sobretudo no que concerne às hipóteses de vinculação de precedentes.

Em São Paulo, a competência e os limites de atuação dos órgãos administrativos de julgamento, vinculados à Secretaria da Fazenda, encontram suas balizas na Lei 13.457/2009 que, em seu art. 28, dispõe que somente haverá observância de precedentes judiciais acaso firmados em ação direta de inconstitucionalidade; por decisão definitiva do STF em via incidental (após suspensão da norma pelo Senado); ou em enunciado de súmula vinculante.

Apesar de haver uma tentativa de uniformização de decisões proferidas nas esferas administrativa e judicial, fato é que não há uma compatibilização, sequer razoável, com os instrumentos de coletivização de julgamentos previstos na legislação processual civil.

Nesse contexto, há um ano tramita na Assembleia Legislativa de São Paulo o Projeto de Lei (PL) 367/2020, de autoria do Dep. Sergio Victor e relatoria do Dep. Heni Ozi Cukier. O PL visa, dentre outras medidas, adequar a legislação do processo administrativo tributário às disposições do CPC, acrescentando hipóteses de vinculação de decisões judiciais proferidas em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas, recursos extraordinário ou especial (repetitivos), ou súmulas do STF, do STJ ou do Órgão Especial do TJ/SP.

A proposição de alteração legislativa representa importante medida em busca da observância dos precedentes judiciais, sobretudo se considerado que o Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (TIT/SP), reiteradamente, profere decisões contrárias à pacífica orientação jurisprudencial:

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Tais exemplos denotam a urgência de adequação do processo administrativo tributário à teoria dos precedentes. A observância dos instrumentos de coletivização de julgamentos do CPC impediria tanto divergências dos julgados administrativos em relação aos judiciais, como divergências na própria interpretação da norma.

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Importante ressaltar que os processos administrativos e judiciais não remontam sistemas distintos. São, em verdade, partes de um único sistema processual, o qual permite a aplicação supletiva e subsidiária dos dispositivos do CPC ao processo administrativo (art. 15 do CPC) e, assim, a vinculação das decisões administrativas aos precedentes judiciais.

Por outro lado, a manutenção de decisões administrativas contrárias à jurisprudência acarreta sérios prejuízos ao Erário, o que se constata sob diferentes óticas. De início, órgãos administrativos são movimentados por anos para que, ao final, seja mantida uma autuação fiscal descabida. Busca-se, então, tutela jurisdicional em processo no qual, sabidamente, a Fazenda Pública sucumbirá, haja vista a obrigatoriedade de observância de precedentes no judiciário (art. 927 do CPC). Por fim, a Fazenda arcará com custas e honorários de sucumbência.

Diante desse cenário, muito mais do que prestigiar a celeridade processual, a adoção de precedentes judiciais no processo administrativo tributário denotaria a observância dos princípios constitucionais da legalidade, da eficiência pública e da moralidade administrativa, fomentando a confiança no sistema jurídico a partir da boa-fé objetiva da Administração Pública, bem como da previsibilidade das relações.

Assim, à guisa de uma importante diretriz estrutural do CPC, que busca conferir segurança jurídica a partir de precedentes, as alterações propostas no PL 367/2020 reforçam a isonomia, a uniformidade e, no que concerne à vinculação dos precedentes obrigatórios, representam imprescindível avanço no combate à litigiosidade administrativa tributária e, acima de tudo, à danosa discricionariedade dos gastos públicos.

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*Pedro Demartini e Anderson Mainates , sócios da área de Tributário do escritório Souto Correa

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