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Procuradoria Federal avança na era da consensualidade fiscal

Por Eduardo Muniz Cavalcanti e Tereza Amorim
Atualização:

Eduardo Muniz Cavalcanti e Tereza Amorim. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A adoção de métodos alternativos de resolução de conflitos junto à Fazenda Pública tem se mostrado medida eficiente, apontando para a superação da intransponibilidade do crédito público diante dos ótimos resultados[1] obtidos com a transação em âmbitos tributário e não-tributário. Os dados atestam: a transação é uma verdadeira ferramenta para atender ao interesse público, mediante concessão, em seu formato atual, de descontos nos acréscimos legais (juros e multa) para a satisfação do crédito principal, tido como irrecuperável ou de difícil recuperação.

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Focaremos, neste artigo, nas transações de créditos não tributários, inscritos na dívida ativa das autarquias e fundações federais, cuja cobrança compete à Procuradoria-Geral Federal (PGF). Na transação, esclarecemos de imediato: não se incluem as multas de natureza penal.

De acordo com os balanços patrimoniais do exercício de 2021 da (i) Agência Nacional de Mineração - ANM[2] e do (ii) IBAMA[3], estima-se que os valores atualizados da dívida ativa dessas autarquias alcançam, aproximada e respectivamente, (i) R$ 1,9 bilhão e (ii) R$ 18 bilhões. Neste caso, a contabilidade do IBAMA revela um dado importante: a maior parte da dívida ativa é composta por créditos de difícil recuperabilidade, dada a provisão na conta "Ajustes para Perdas em Créditos a Longo Prazo".

Para os créditos de recuperação duvidosa devidos por pessoas físicas ou jurídicas, a Advocacia-Geral da União (AGU) editou a Portaria nº 249/2020, alterada pela Portaria nº 40/2022, concedendo descontos nos acréscimos legais da dívida e fixando requisitos e condições para a proposta de transação individual, em observância às balizas fixadas na Lei nº 13.988/2020. A citada Lei prevê, ainda, a transação por adesão, o que pressupõe a abertura de edital pela Procuradoria.

A mensuração da recuperabilidade dos créditos pela AGU/PGF levará em consideração o custo-benefício da cobrança com base nos seguintes elementos: (i) o tempo em cobrança ou o esgotamento dos meios ordinários para tanto; (ii) a suficiência e liquidez das garantias eventualmente associadas aos créditos; (iii) a existência de parcelamentos ativos, ou o histórico de parcelamentos; e (iv) a capacidade de pagamento do devedor. A incapacidade não será reconhecida quando se constatar eventual penhora (ou bens e/ou direitos penhoráveis, ou dados em garantia) em valor superior ao valor consolidado da dívida.

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A incapacidade de pagamento do devedor será avaliada com base na documentação que instruirá a proposta de transação individual, sem prejuízo da Procuradoria requerer outros documentos caso entenda cabível.

Entre os documentos listados na atual redação da Portaria nº 249/2020, destacamos (i) a relação completa dos créditos inscritos em dívida ativa das autarquias e fundações públicas federais em nome do devedor, como também a relação de todas as ações judiciais em que o devedor e a União e/ou as suas autarquias/fundações são parte; (ii) a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira; (iii) a declaração de que o sujeito passivo ou responsável tributário, durante o cumprimento do acordo, não alienará bens ou direitos sem proceder à devida comunicação prévia; e (iv) a declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física ou Jurídica dos últimos três anos do devedor principal ou declaração de que não dispõe de bens ou direitos no País.

A competência para análise e celebração da transação variará conforme o valor da dívida, de acordo com os limites de alçada firmados na Portaria AGU/PGF nº 498/2020. Para dívidas de até R$ 500.000,00, a competência será dos Procuradores Federais oficiantes no processo judicial; até R$ 2.000.000,00, por autorização dos Procuradores responsáveis pela respectiva seccional; até R$ 5.000.000,00, dos Procuradores-Chefes nos Estados; até R$ 10.000.000,00, dos Procuradores Regionais Federais; até R$ 50.000.000,00, do Procurador-Geral Federal; acima de R$ 50.000.000,00, do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado cuja área de competência a que o assunto estiver afeto.

Tanto para pessoa física quanto para pessoa jurídica, o valor de entrada na transação individual deve ser equivalente a 5% do valor atualizado da dívida. Os descontos sobre os acréscimos legais variarão conforme o número de parcelas para quitação do saldo e conforme a natureza do devedor (se pessoa jurídica ou física). O ônus sucumbencial e os encargos legais serão reduzidos na mesma proporção dos descontos concedidos para o crédito principal.

Para a definição do prazo para pagamento e das reduções, as regras aplicáveis às pessoas físicas alcançam as microempresas, empresas de pequeno porte, instituições de ensino, santas casas de misericórdia, sociedades cooperativas ou demais associações da sociedade civil.

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Para melhor visualização dos benefícios econômicos com a transação, tomemos como exemplo uma dívida de R$ 1.000.000,00:

 

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Quanto ao procedimento, a proposta de transação individual deve ser formalizada por meio do Protocolo Eletrônico da AGU, no sistema Sapiens Dívida.

A transação junto à PGF/AGU é, por certo, um passo à frente na relação entre particulares e entes públicos, pautada na maior abertura para a negociação do crédito com um olhar atento às peculiaridades e dificuldades dos devedores. Na balança Indisponibilidade do Interesse Público x Eficiência na Arrecadação, a consensualidade tem se revelado um forte instrumento, garantindo o custeio das entidades e a consequente concretização dos fins para os quais foram instituídas.

*Eduardo Muniz Machado Cavalcanti, advogado tributarista sócio-fundador da Bento Muniz Advocacia e Procurador do Distrito Federal. Mestre em Direito Público com ênfase em Direito Tributário e Financeiro pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professor de Direito em cursos de Graduação e Pós-Graduação. Foi procurador da Fazenda Nacional, procurador federal e procurador do Estado de Minas Gerais. Ex- membro do Comitê de Acompanhamento, Avaliação e Seleção do CARF. Possui livros e artigos publicados

*Tereza Amorim, pós-graduanda em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (FGV/SP). Bacharel em Direito pela Universidade de Pernambuco. Advogada na Bento Muniz Advocacia 

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[1] Como exemplo, destacam-se a transação do Botafogo junto à PGFN e a transação da OI junto à PGF/ANATEL.

[2] Disponível em: https://www.gov.br/anp/pt-br/acesso-a-informacao/receitas-e-despesas/demonstracoes-contabeis. Acesso em 14/02/2022, às 16h20.

[3] Disponível em: https://www.gov.br/ibama/pt-br/acesso-a-informacao/auditorias/20220207_Balanco_Patrimonial_Ibama_2021.pdf. Acesso em 14/02/2022, às 16h15.

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