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Procuradoria diz que exigência de documentos em projeto de 'fake news' abre brechas para coleta de dados pessoais

Ministério Público Federal enviou nota técnica ao Senado afirmando que proposta não encontra amparo em legislações internacionais e não apresenta contrapartida para segurança de usuários

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Por Paulo Roberto Netto
Atualização:

O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou nota técnica ao Senado sugerindo, entre outros pontos, a supressão do artigo do projeto de lei das 'fake news' que prevê o uso documentos de identidade, como RG ou passaporte, para a criação de contas em redes sociais. De acordo com a Procuradoria, a medida abre brechas para a coleta de dados pessoais e não encontra amparo em legislações internacionais.

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"Embora exija que a empresa provedora demande e receba documentos, o dispositivo proposto não contém nenhuma obrigação de guarda e sigilo quanto a esses dados, e nem de proibição de seu uso, ou punição para casos de abuso", apontou o MPF. "A concessão indiscriminada às empresas do direito, e mesmo do dever, de acessar mais dados dos usuários, dados estes que não são essenciais para o exercício das funções às quais elas se destinam, sem exigir nenhuma contrapartida de segurança e confidencialidade, contraria o anseio da sociedade para maior preservação dos dados pessoais".

A nota foi redigida pelo suprocurador-geral Carlos Frederico Santos e enviada ao Senado após o projeto ser pautado para votação nesta quinta, 25. O texto elaborado pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA), presidente da CPI das Fake News e relator do projeto, tem sido criticado por apresentar propostas que podem cercear a liberdade de expressão e a defesa de usuários na internet.

Santos alegou que o artigo que exige a apresentação de documentos é facilmente burlável, visto que tal obrigação não impedirá um usuário brasileiro de criar uma conta no exterior, onde a lei não terá vigência. Mais que isso, a medida limitará a atuação de pequenas e médias empresas de tecnologia que não terão recursos para se adaptar à mudança. O MPF também foi contra a exigência de criação de base de dados no Brasil, pois a proposta dificultaria a entrada de novas empresas.

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"O efeito prático será aumentar a concentração (de empresas) atualmente existente, o que implicará em evidente prejuízo aos usuários e consumidores", apontou.

O senador Angelo Coronel (PSD-BA), relator do projeto de lei das 'fake news'. Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Censura. Outro dispositivo da lei considerado inconstitucional é a proibição de veiculação de campanhas que ridicularizem candidatos durante as eleições. Segundo o Ministério Público Federal, da forma como está redigido, o trecho pode cercear a liberdade de expressão e atacar o trabalho de humoristas.

"No Estado Democrático de Direito e, especialmente, na seara eleitoral, a liberdade de expressão é corolário fundamental para a manutenção da democracia. E no processo eleitoral, as críticas com deboche, sarcasmos ou em tom jocoso, fazem parte do jogo eleitoral e a verdade é um valor de certa forma relativizado", apontou o subprocurador.

O texto relatado por Coronel tem sido criticado por entidades de defesa da liberdade de expressão e da imprensa. Em nota, 46 organizações não-governamentais pediram o adiamento da votação e ampliação dos debates.

"A última versão do texto não é capaz de cumprir com o suposto objetivo de combater a desinformação, ao estimular a concentração no âmbito digital - por meio de imposição de obrigações desproporcionais às empresas provedoras de serviços de Internet - e a autocensura, por meio da excessiva vigilância e da ampla criminalização de discursos", afirmam as entidades.

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Segundo as organizações, o Brasil pode criar um 'precedente preocupante' para os demais países que discutem regulações para restringir a desinformação. A nota foi assinada por entidades como a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, Open Knowlegde Brasil, Electronic Frontier Foundation e Repórteres Sem Fronteiras.

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