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Prevenir a corrupção: um assunto para a agenda governamental?

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Por Murilo Borsio Bataglia
Atualização:
Murilo Borsio Bataglia. FOTO: INAC/DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O enfrentamento à corrupção deve ser algo constante nos diferentes governos. E são diversas as formas de realizá-lo: prevenindo, detectando e punindo. Pensando nisso, este artigo busca lançar o olhar sobre uma dessas frentes: a prevenção. Pergunta-se: quais são as ações adotadas para prevenir o fenômeno corrupto? Como o Brasil se encontra em termos de capacidade para enfrentá-lo? Esse tema ocupa a agenda? Para essa breve análise, destacam-se iniciativas que têm cuidado dessa vertente, e expõem-se alguns índices e dados preocupantes.

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Em termos de prevenção da corrupção[1], convenções internacionais anticorrupção ratificadas pelo Brasil reservam parte de seus textos para as medidas preventivas: citam-se a transparência pública, códigos de ética, acesso à informação, participação da sociedade, e independência de instituições de controle (como o Judiciário e Ministério Público).

O Brasil vinha avançando nessas perspectivas, por meio da CGU; aprovando legislações como a Lei de Acesso à Informação, Lei Anticorrupção; elaborando e atualizando planos de governo aberto e planos de dados abertos para os órgãos públicos; criando portais e programas como o Portal da Transparência e o Programa Time Brasil. Estas são apenas algumas iniciativas que promovem uma mudança de cultura, enfatizando a transparência e a busca por mecanismos de conformidade.

Em maio de 2021, outra iniciativa de prevenção foi lançada: o Programa Nacional de Prevenção da Corrupção (PNPC). Elaborado pela CGU e TCU, é uma das ações da ENCCLA. O objetivo é reduzir comportamentos corruptos, a partir de avaliações que revelam pontos vulneráveis e orientações sobre melhores práticas na Administração Pública. Gestores públicos de todas as esferas federativas e dos três Poderes inserem dados no Sistema e-Prevenção, recebendo diretrizes para aperfeiçoamentos. (CGU, 2021).

Se por um lado há ações dos órgãos de controle que buscam a prevenção da corrupção, por outro, há atitudes, em grande parte, de representantes políticos, que ameaçam esses avanços. No que se refere à transparência pública, podem ser listadas tentativas de restringi-la com:

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- ampliação de pessoas capazes de impor sigilo a uma informação pública (ultrassecreta e secreta) pelo Dec. 9.690/2019, revogado pelo Dec. 9.716/2019;

- alteração de procedimentos para respostas a pedidos de acesso à informação na pandemia, pela MP n. 928/2020, invalidados pelas ADIs 6353 e 6347 no STF;

- mudanças em formatos de divulgação de dados de contaminações e mortes relacionados à COVID-19, impedidas por decisões do STF (ADPFs 690, 691 e 692);

- imposição de sigilo ou restrições de acesso em processos de ex-ministros, e operações policiais;

- não direcionamento de orçamento para realizar o censo demográfico, revertido pelo STF (ACO 3508); (BATAGLIA; FARRANHA, 2021).

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Tais fatos são corroborados por meio de pesquisas como o Índice de Capacidade de Combate à Corrupção - CCC (jun/2021), que busca avaliar capacidades de países da América Latina nesse enfrentamento. O Brasil apresentou a maior queda dentre os países analisados: de 5,52 para 5,07[2], saltando de 4º para 6º lugar. Influenciaram nisto: redução de independência das agências anticorrupção, relação entre Executivo e Legislativo, qualidade da democracia, e queda na transparência.  Cita-se também o Relatório Global de Expressão, que revela declínio acentuado e acelerado do Brasil em termos de liberdade de expressão e de imprensa, caindo 43 pontos em 10 anos. (AS/COA, 2021; ARTIGO 19, 2020).

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Diante dessas ações e indicadores, retoma-se questionamento: em que lugar está o enfrentamento da corrupção na agenda governamental? A vontade política e as ações de burocracias estariam alinhadas para prevenir esse comportamento, favorecer a transparência e promover capacidades institucionais?

Acredita-se que órgãos de controle têm realizado seu papel, promovendo ações e para prevenir e detectar desvios de recursos e irregularidades. No entanto, as vontades e decisões políticas de setores do Legislativo ou do Executivo podem interferir neste cenário, colocando em risco os avanços conquistados.

Prevenir a corrupção e enfrentá-la, de modo geral, perpassa também pela vontade política em apoiar ou ao menos não impedir ou não interferir negativamente em ações institucionais de órgãos especializados. Essa prevenção se revelaria ao promover ações que reforçassem a capacidade de instituições, destinando recursos humanos e orçamentários a órgãos com esse intuito, e mobilizando ações normativas para implementar a transparência, e não o contrário. A corrupção precisa ser controlada, e, para isso, é necessário que seja, responsavelmente e de fato, uma pauta na agenda governamental.

[1] Dessa forma, por opção metodológica, não é objetivo deste artigo discorrer sobre punições voltadas às irregularidades e desvios que ocorreram, por exemplo, no enfrentamento da pandemia.

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[2] Quanto mais próximo da nota 10, melhores indicadores de capacidade para enfrentar a corrupção.

*Murilo Borsio Bataglia é professor da Universidade de Brasília (CEAM/IPOL/UnB), doutorando e mestre em Direito pela UnB

*Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção

Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Acesse aqui todos os artigos, que têm publicação periódica

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