Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Pós-verdades afastando o real debate da educação inclusiva no Brasil

PUBLICIDADE

Por Janaina Rodrigues
Atualização:
Janaina Rodrigues Pereira. FOTO: GUSTAVO MORITZ Foto: Estadão

Nunca é demais relembrar que o Estado Democrático Brasileiro está alicerçado em objetivos que buscam a construção de uma sociedade solidária, com redução das desigualdades sociais e a promoção do bem de todos, o que nos permite afirmar ser a educação inclusiva uma medida necessária ao alcance de uma sociedade democrática.

PUBLICIDADE

A atuação do Estado na inclusão, nos termos do Ministro Edson Fachin, trata-se de ação positiva de dupla via, não incidindo, somente, sobre pessoa com deficiência, mas também ao direito de todos os demais cidadãos ao acesso a uma arena democrática plural (ADI 5.357).

Sob o viés pedagógico, a educação inclusiva é contextualizada sob a perspectiva de uma educação para todos, onde todas as singularidades de pessoas com deficiência ou não são trabalhadas em sala de aula.

Argumentos sobre o custo da inclusão; impossibilidade de convivência; necessidade de ambiente especial segregado, entre tantos outros, são falácias que nos impedem na construção de políticas para remover, efetivamente, as barreiras da desigualdade que mantêm as pessoas com deficiência à margem da participação da vida em sociedade.

O Brasil possui amplo arcabouço de proteção à educação inclusiva voltada aos PcD's, demonstrando que o assunto está longe de ser uma mera tendência sobre o viés do "inclusivismo". Já de partida, a Constituição Federal prevê a educação como direito de todos e dever do Estado e da família, sendo o ensino norteado, entre outros, pelo princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, o que, em tese, já seria suficiente para o desenho de políticas públicas equitativas.

Publicidade

Ainda, o país assumiu compromisso perante a Comunidade Internacional, ratificando a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ganhando essa o status de emenda constitucional (Decreto n. 6.949/2009). Da leitura da Convenção percebe-se que o Brasil reconhece o direito das pessoas com deficiência à educação, assegurando o sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida.

Nessa mesma toada é a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) que assegura sistema educacional inclusivo em todos os níveis de ensino, por meio de oferta de serviços e de recursos que eliminem as barreiras e promovam a inclusão plena.

É perceptível que o debate público não deveria flertar com o retorno da segregação, mas, lamentavelmente, o que se vê são investidas ao arrepio do ordenamento jurídico. Esse é o caso do Decreto nº 10.502/2020 que instituiu a Política Nacional de Educação Especial, mas que está suspenso cautelarmente pelo STF (ADI 6590), sob o fundamento que o ato normativo inova no ordenamento jurídico, nos termos do voto do Relator, Ministro Dias Toffoli:

A Política Nacional de Educação Especial questionada contraria o paradigma da educação inclusiva, por claramente retirar a ênfase da matrícula no ensino regular, passando a apresentar esse último como mera alternativa dentro do sistema de educação especial. Desse modo, o Decreto nº 10.502/2020 pode vir a fundamentar políticas públicas que fragilizam o imperativo da inclusão de alunos com deficiência transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na rede regular de ensino. (ADI 6590 MC. DJE nº 54, divulgado em 19/03/2021)

Aos que insistem em criar pós-verdades, deixando de encarar com seriedade a educação inclusiva, constatações de pedagogos sobre os benefícios da convivência diária como desenvolvimento de solidariedade, estimulação à criatividade e resolução de problemas, respeito a diferença, entre tantos outros, desmontam as infundadas alegações   sobre a impossibilidade de convivência.

Publicidade

*Janaina Rodrigues, advogada e sócia da Covac Sociedade de Advogados na área de Terceiro Setor. Foi secretária-geral da Comissão de Terceiro Setor da OAB-DF e assessora na Secretaria do Direito da Pessoa com Deficiência em Campinas

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.