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Por mais provas para fortalecer o processo penal

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Por Marcos Camargo
Atualização:
Marcos Camargo. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

É assustador que persistam no Brasil forças que tentam retrocessos capazes de fazer a legislação penal acolher práticas tão obscuras quanto o tolhimento do direito fundamental à prova -essencial para o contraditório e a ampla defesa, e também para enfraquecer o combate à impunidade.

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Uma dessas iniciativas mais lamentáveis é o relatório do deputado federal João Campos, de Goiás, sobre a reforma do Código de Processo Penal (CPP). Nosso alerta aos deputados e senadores é que, se acolhido esse texto, o Brasil será a única democracia (ou pretensa democracia) onde a análise científica de evidências poderá deixar de ser feita ou de ser levada ao processo.

Hoje, todos os crimes que deixam vestígios precisam, obrigatoriamente, passar por exame pericial. Sem isso, os processos estão sujeitos a nulidade. Pela proposta, a não realização da perícia deixará de motivar nulidade. Além disso, a solicitação desses exames dependerá apenas da vontade da autoridade policial, que também decidirá, caso seja produzida, se será ou não inserida no processo, se ficará em alguma gaveta ou mesmo se terá como destino o lixo.

Se aprovado, o projeto possibilitará, por exemplo, que uma cena de chacina não seja submetida à perícia, abrindo mão das tecnologias e dos recursos humanos brasileiros reconhecidos mundialmente por sua excelência. Por outro lado, provas circunstanciais, como depoimentos de testemunhas, de delatores e dos próprios investigadores poderão ser suficientes para embasar condenações. Ficará facilitada a formulação de teorias simples para encerrar casos complexos, como estupros e homicídios.

Os peritos oficiais (federais, dos Estados e do Distrito Federal) trabalham com ciência, de forma isenta e equidistante das partes e estão sujeitos à disciplina judiciária, podendo responder penalmente por falsa perícia. Para assegurar essa independência, o perito criminal, no exercício de suas atribuições, não está subordinado a nenhum outro servidor público ou agente político. Seu compromisso é com os métodos científicos de esclarecimento da materialidade e autoria dos crimes. O projeto em trâmite, por sua vez, tenta subordiná-lo ao condutor da investigação, suas convicções e linhas investigativas pré-determinadas.

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O CPP precisa ser modernizado para fortalecer mecanismos que garantam a indispensabilidade das perícias oficiais e assegurem a independência técnica, científica e funcional dos peritos criminais. É inaceitável extinguir essas proteções.

Legisladores e sociedade civil precisam estar alertas com relação a projetos que agridem direitos e garantias fundamentais. É preciso fortalecer as instituições de Estado, não as colocar sob o julgo de interesses corporativos. É preciso valorizar a ciência e defender a manutenção da atuação pericial isenta e equidistante das partes.

*Marcos Camargo, presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF)

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