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Pedido de cassação de Bolsonaro no TSE tem parecer e decisão contra uso de dados de fake news

Procurador e ex-relator afirmaram em 2019 que falsas notícias, investigadas no inquérito do STF, não são objeto da ação eleitoral, em que chapa petista acusou campanha presidencial de suposto abuso de poder econômico, por disparos de mensagens de whatsapp; parecer aponta falta de provas

Foto do author Fausto Macedo
Por Ricardo Brandt e Fausto Macedo
Atualização:

Jair Bolsonaro e Fernando Haddad (PT) Foto: FOTOS NILTON FUKUDA/ESTADÃO e GUSTAVO CABRAL/A12

O pedido do PT  para uso de dados do inquérito sobre supostas fake news aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que investiga suposto elo da rede "bolsonarista" de comunicação na internet, na ação em que pediu a cassação da candidatura de Jair Bolsonaro e do vice, Hamilton Mourão, tem contrário da Procuradoria Geral Eleitoral (PGE), dado em 2019.

O pedido de acesso aos dados da apuração do STF foi negado pelo então relator, o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Jorge Mussi, que considerou o fato objeto alheio ao alvo da ação eleitoral, em que se julga suposto abuso de poder econômico, sem apuração sobre falsas notícias - as fake news.

O parecer destaca os pedidos feitos pelos advogados da chapa petista para busca de informações sobre o inquérito 4.781, no STF, na Procuradoria Geral da República (PGR) e na Polícia Federal. "Por se tratar de informações alheias ao objeto da presente ação, que não se presta a apurar fake news nas eleições."

 

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A ação de cassação aberta no segundo turno das Eleições de 2018 foi movida pela chapa dos candidatos Fernando Haddad (PT) e Manuela D´Ávila (PCdoB), vice. Os adversários pediram a cassação de Bolsonaro e Mourão, por suposto abuso de poder econômico, com base em reportagem publicada em jornal. A coligação petista acusou financiamento ilegal de disparos em massa por whatsapp. O empresário Luciano Hang, donos das lojas Havan, teria sido o financiador.

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"Urge destacar que o arcabouço probatório dos autos é formado basicamente por matérias jornalísticas, que veiculam pretensas irregularidades e suas repercussões", registra o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, em parecer na ação, de 7 de outubro de 2019.

 Foto: Estadão

O procurador ainda  recomendou o arquivamento da ação, por falta de "prova robusta", que comprove os atos ilegais narrados pela chapa petista, nem a ligação de Bolsonaro e Mourão com possíveis fatos - o que poderia justificar a cassação e a declaração de inelegibilidade por 8 anos, conforme prevê a lei.

"Pelo conjunto probatório produzido nos autos, conclui-se pela não comprovação dos ilícitos imputados e inexistência de eventual gravidade apta a macular a legitimidade e a normalidade das eleições, o que afasta os pedidos de cassação do mandato e declaração de inexigibilidade."

O procurador destacou que "é lícito o envio de mensagens aos eleitores, inclusive veiculando opinião própria com objetivo de convencê-los". "É do jogo político, assim como é o envio de 'santinhos' pelo correio. A questão é saber quando atitude dessa natureza alcança o campo da ilicitude."

 

Turbinar. A ação da coligação O Povo Feliz de Novo, de Haddad, contra Bolsonaro estava conclusa, em outubro de 2019, para elaboração de voto e envio ao Plenário,  - conforme registra despacho do então relator do caso, o ex-ministro do TSE Jorge Mussi. No fim de 2019, foi reaberta fase de instrução, para inclusão de dados de outra ação eleitoral, sobre o mesmo fato, da coligação entre os partidos PDT e Avante.

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O PT tenta desde o mês passado  turbinar o processo eleitoral, com dados do controverso inquérito do STF, que apura ameaças, ofensas e fake news contra ministros do Supremo. A utilização de dados é tentada pelos petistas desde 2019, com citação ao inquérito conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes foi registrada nos autos. Além do acesso às provas do inquérito e de dados da PGR e da PF, os advogados da chapa Haddad solicitaram diligências de buscas em endereços dos acusados e quebras de sigilos. Os pedidos foram negados pelo relator.

 

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Mussi redigiu no início de outubro de 2019 um relatório sobre a ação, após as alegações finais dos réus. No documento, explicou os motivos da negativa. "O indeferimento da requisição a este Tribunal (TSE), à Suprema Corte (STF), à Procurador Geral da República e à Polícia Federal lastreou-se, outrossim, na circunstância de se tratar de informações alheias ao objeto da presente ação, que não se presta a apurar fake news nas eleições".

"A Ação de Investigação Judicial não se presta a apurar fake news, tendo seu objeto muito bem delineado na LC 64/90 ou seja, a apuração de abuso de poder no processo eleitoral." A referência "LC 64/90" é da Lei Complementar 64 de 1990, a Lei da Inelegibilidade, que estabelece os casos e regras para identificação e punição do tipo.

 

A decisão de Mussi, que era corregedor-geral da Justiça Eleitoral, sobre buscas e quebras de sigilos dos alvos, foi baseada no caráter extremo da medida cautelar desejada pelos autores da acusação.

No parecer da Procuradoria Eleitoral - que nessa ação atua como fiscal da lei -, Medeiros ao analisar os pedidos de quebra de sigilo e de buscas contra os alvos, feitas pelo PT,  citou a falta de elementos probatórios, como elemento que reforçaram a decisão da Justiça.

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"A fragilidade dos elementos de informação trazidos pela parte requerente revela ausência de lastro probatório mínimo, afastando-se materialidade necessária ao deferimento dos pleitos acima relatados de quebras de sigilo e fornecimento de toda documentação contábil, financeira, administrativa e de gestão das empresas."

A decisão de Mussi foi questionada pelo PT em mandado de segurança, que pedia suspensão da ação. O pedido foi julgado pelo ministro Sérgio Silveira Banhos, que entendeu que a negativa para os pedidos feitos pela acusação estavam fundamentados e que o processo deveria seguir.

Julgamento. O Plenário do TSE retomou nesta terça-feira, 9, julgamento das ações de cassação da chapa que elegeu o presidente, em 2018. Além do PT, outras coligações apontaram supostos abusos cometidos por Bolsonaro, em especial envolvendo campanha na internet. Todas pedem a cassação dos registros de candidatura, dos diplomas ou dos mandatos, além da declaração de inelegibilidade.

 

Pela Lei de Inelegibilidade, denúncias de atos que configurem abuso de poder econômico e político durante as eleições, são apuradas em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije). O Ministério Público acompanha o processo e dá parecer de mérito, se não for a parte autora, recomendando a cassação ou o arquivamento do caso. O relator dá sua decisão baseado nas provas apresentadas pela autora da ação, nas defesas e no parecer da Procuradoria.

Seis ações do tipo estão na fila para julgamento no TSE. As duas primeiras que entraram na pauta nesta terça, , tratam sobre ataques cibernéticos a um grupo de Facebook que teria favorecido Bolsonaro. O atual relator, o ministro Og Fernandes, deu seu voto ainda em novembro - os demais ministros irão agora votar. Tanto o relator, como a Procuradoria Eleitoral, consideraram improcedente as acusações, apontaram que não se comprovou vínculo do presidente e do vice com os ataques virtuais. A tendência é que a maioria siga o voto.

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Provas robustas.  A necessidade de comprovação de envolvimento dos acusados com os ilícitos e de que houve desiquilíbrio no processo eleitoral são pontos também destacados pelo vice-procurador-geral eleitoral no parecer e pelo ex-relator no TSE da Aije movida pela chapa petistas - ainda sem data para ir a julgamento no Plenário. O advogado, o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, pede reabertura da fase de instrução e o uso de dados de outros processos.

 

A PGE considera que para configurar abuso de poder econômico, com desiquilíbrio de forças entre os adversários na disputa eleitoral, é preciso "provas robustas". "Relevante mencionar ainda que mera condição de beneficiário das condutas tidas por ilícitas não suficiente para fazer incidir a sanção de inelegibilidade", escreveu Medeiros, em seu parecer.

"Não demostrada a ocorrência de abuso de poder econômico ou uso indevido de meios de comunicação social pelos requeridos", registra o parecer. "Os pedidos formulados na ação de investigação judicial eleitoral proposta merecem ser julgados improcedentes."

Segundo Martins, também não se demonstrou desiquilíbrio da disputa entre os candidatos. "Não patenteados nos autos desiquilíbrio no pleito, gravidade nos atos, anormalidade nos procedimentos, ilegalidade nas condutas, violação de liberdade e direitos, ou constrangimentos do eleitorado, entende o Ministério Público Eleitoral que não há razão para anulação da votação."

O novo relator do caso, ministro Og Fernandes, pediu para que a PGE se manifeste sobre o novo pedido de compartilhamento de provas do inquérito do STF com as Aijes.

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O ministro Og Fernandes. Foto: Ascom/STJ

Defesa. Na sexta-feira, 5, a defesa de Bolsonaro pediu que o TSE rejeite a incluir o conteúdo do inquérito das fake news nos processos eleitorais. O argumento da advogada Karina Kufa é de que as investigações no Supremo não têm relação com as ações contra a chapa.

A advogada Karina Kufa afirmou que os pedidos devem ser rejeitados porque não teriam, segundo ela, relação com o objeto original da ação de investigação judicial eleitoral. Ela disse que os conteúdos são "diametralmente opostos ao que se discute na presente ação", disse. "Em nada corrobora com esta ação a investigação capitaneada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal sobre notícias falsas direcionadas à figura dos insignes Ministros daquela Egrégia Corte."

"O objetivo da presente AIJE não é discutir fake news", disse Karina Kufa. "Em nada um perfil falso se assemelha a contratação de empresas que realizem disparos de mensagens em massa via WhatsApp, foco da presente ação", escreveu.

A advogada argumentou que seria "contraproducente" incluir provas na fase atual do processo e que isso representaria uma alteração na causa inicial da ação. Por fim, pede o encerramento da fase de instrução, quando são produzidas provas sob requisição das partes e do Ministério Público.

Na ação, a defesa sustentou em suas alegações finais que a autora "não teria sido capaz de formar acervo probatório robusto, a causar espanto a pretensão de almejar tamanhas violações com base, exclusivamente, em notícias jornalísticas" e pediu que fosse considerada improcedente a ação. Pediu ainda "aplicação de multa por litigância de má-fé" contra os petista - parecer da PGE é contrário à medida.

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Prejudica. Os advogados da chapa petista apontaram prejuízo na instrução probatória da ação, com base os pedidos negados de diligências e busca de provas em processos de outros tribunais.

"Reforçou que a investigação deficitária e a consequente impossibilidade de responsabilizar aqueles que agiram em abuso de poder econômico e uso indevido de meio de comunicação social representam obstáculo à consecução dos objetivos da AIJE e violam de forma direta os bens tutelados pela ação", registrou o ex-relator da ação.

Pediu ainda a reabertura da instrução processual, para tomada de depoimento de testemunhas, diligências de buscas, analises e compartilhamento de provas. "Informou que a utilização de notícias falsas como método de campanha foi uma marca da candidatura de Jair Bolsonaro."

O autores da ação voltaram a afirmar "não ser crível atribuir apenas à espontaneidade dos apoiadores a capacidade de produzir e disseminar com tamanha eficácia todas as notícias falsas editadas" contra a campanha petista. Citou os supostos usos de robôs para atuação na internet.

Para eles, "as condutas descritas, por se tratar de utilização ilegal de meio digital para disseminação massiva de conteúdo, tiveram o condão de atingir grande número de pessoas e, por isso mesmo, influenciar sobremaneira o resultado do pleito eleitoral". E que houve "desequilíbrio na disputa eleitoral". Pediu, por fim, "o recebimento das alegações finais e, preliminarmente, a reabertura da instrução processual, bem como, no mérito, a procedência dos pedidos formulados à inicial".

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