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PEC 45/19: haverá irremediáveis transtornos para a sociedade, se aprovada

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Por Marcelo da Silva Prado
Atualização:
Marcelo da Silva Prado. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Diante da reforma tributária que se avizinha estão sendo "vendidas" várias ideias para a sociedade, uma delas quer fazer crer que os prestadores de serviços pagam pouco imposto. Se fizermos as contas, veremos que não é bem assim. É preciso muito cuidado com o que vem sendo propalado sobre a simplificação do sistema tributário brasileiro. É imprescindível muita atenção para as propostas apresentadas. Por exemplo, a PEC 45/19, que pretende acabar com cinco e criar dois impostos, um sobre bens e serviços (Imposto sobre Bem e Serviços), nos moldes dos impostos sobre valor agregado cobrados na maioria dos países desenvolvidos; e um específico sobre alguns bens e serviços.

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A referida PEC nos preocupa e nos chama bastante atenção pelos equívocos nela contidos. Vale ressaltar que seus defensores são excelentes marqueteiros, têm espaços regulares em jornais de grande circulação, conseguem transmitir suas ideias numa linguagem fácil sobre um tema que é inegavelmente bastante complexo, além de estarem abrigados em uma das mais importantes instituições do País.

É fundamental que a sociedade compreenda detalhadamente o que está acontecendo e sendo discutido para que seja construída uma proposta de reforma tributária que não venha a ser um desastre sem volta.

É óbvio que todo mundo com um mínimo de bom senso defende a redução da carga tributária, a simplificação dos impostos e que se faça a cobrança de tributos à semelhança dos países desenvolvidos e é esta a primeira bandeira que levantam os defensores da PEC 45.

Há anos discutimos uma reforma e por incrível que pareça a matéria ainda não está madura, longe disso. Faz-se necessário atentar para as frases de efeito e, principalmente, por tratar-se de um assunto que implica contas e envolve números, observar tudo isso com redobrada atenção antes de qualquer adesão.

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Agora, foi instalada a Comissão da Reforma Tributária composta por 25 deputados e 25 senadores, que vai analisar duas propostas de emenda à Constituição: a PEC 45/19 e a PEC 110/19. Ambas criam dois impostos, um sobre bens e serviços (IBS), nos moldes dos impostos sobre valor agregado e um imposto específico sobre alguns bens e serviços, além de sugestões do Executivo.  A Comissão tem um plano de trabalho, com audiências públicas e debates, e prevê a votação do relatório em maio. Posteriormente, o texto será analisado pela Câmara e pelo Senado.

Quero deixar aos leitores deste prestigiado espaço uma breve e sintética reflexão sobre os equívocos da PEC 45/19 para que sejam levados em consideração:

  1. Alíquota única no Imposto sobre Bem e Serviços (IBS) - talvez seja o maior problema na proposta da PEC 45 (da Câmara), que causará uma regressividade evidente no principal tributo do sistema que será o IBS (ele aglutinará o ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS) tributando o feijão, a carne, o leite e todos os produtos da cesta básica de forma similar ao caviar e as trufas brancas. Além disso, pretende tributar serviços essenciais que hoje são isentos com a mesma alíquota sem distinção. Escola, serviços médicos, transporte coletivo, por exemplo, passarão a pagar uma alíquota de 25% ou 27% gerando um incrível aumento nos preços desses serviços.
  2. O setor de serviços em geral, que hoje é tributado pelo PIS, COFINS e ISS, será muito penalizado com a mudança, pois o IBS nada mais é do que um Imposto sobre o Valor Agregado clássico, ou seja, tributa-se o valor adicionado e as operações anteriores geram créditos que reduzem o valor a ser pago no final. Sucede que o setor de serviços tem como custos mais relevantes a folha de salários (com encargos trabalhistas e contribuições previdenciárias) e não geram créditos no regime do IBS, causando uma tributação muito maior do que nos setores industrial e do comércio, em que a folha de salários é muito menor como proporção dos custos.
  3. As alternativas para corrigir esse problema estrutural são: a criação de alíquotas diferenciadas (três ou quatro) deixando o setor de serviços com alíquotas intermediárias, bem como no caso dos alimentos essenciais (cesta básica) conferindo a isenção a alguns serviços (como escolas, saúde e transportes) terem alíquotas menores. Esse é o modelo europeu.
  4. O risco de inflação com alíquota única. Haverá aumento generalizado de produtos que compõem fortemente os índices, alimentos e serviços terão aumentos superiores a 25% com a mudança.
  5. Outra possibilidade é a autorização do creditamento das contribuições patronais incidentes sobre a folha de salários do valor devido a título de IBS. Isso seria um estímulo à formalização do emprego e geraria uma infinidade de vantagens, permitindo que setores com grande empregabilidade como são os serviços em geral (construção civil por exemplo) não sejam tão penalizados com a mudança tributária.
  6. Por fim, o projeto tem uma transição de absurdos dez anos, tornando a vida do contribuinte um inferno, pois ele terá que conviver com o sistema atual mais o novo sistema do IBS ao mesmo tempo por toda essa transição.

A sociedade tem que estar atenta para os problemas que a PEC 45/19 causará caso seja aprovada e isso merece ser destacado nas discussões na Comissão da Reforma Tributária.

*Marcelo da Silva Prado é advogado tributarista e presidente do Instituto de Pesquisas Tributárias - IPT

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