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Para acabar com caixa 2, delator da Odebrecht defende doações controladas e desvinculadas de relações políticas

LEIA O DEPOIMENTO de Benedicto Barbosa da Silva Junior, homem forte do setor de construções do grupo, ao TSE, em que declarou que 'é preciso mudar o modelo' das campanhas no Brasil e explica como eram feitos pedidos e repasses de dinheiro não declarado dentro da empresa

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Foto do author Fausto Macedo
Por Ricardo Brandt , Julia Affonso e Fausto Macedo
Atualização:
 

"O pagamento de caixa 2 era feito da seguinte forma: no momento em que você definia quanto era o caixa 2 e quais era os candidatos que ou haviam pedido ou que iam receber caixa 2, por qualquer motivo que fosse, para não criar assimetria, para não expor que você está doando mais para um do que para outro, isso era planejado ao longo das semanas que envolviam, normalmente, julho, agosto e setembro, entregue para o Setor de Operações Estruturadas, que fazia toda organização do dinheiro e informava ao suplicante, que era quem pediu a doação, qual era a forma e onde seria entregue o dinheiro. Era assim que funcionava, Doutor."

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A fala transcrita acima é quase uma aula de como funcionava o ordenamento interno de despesas da Odebrecht para financiar campanhas eleitorais por fora do sistema legal e foi dita por Benedicto Barbosa da Silva Júnior, um dos principais homens do setor de construções do Grupo Odebrecht, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

No momento em que se discute no Congresso formas de anistia ao caixa 2, Benedicto - um dos 78 nomes da mega delação da Odebrecht, fechada com a Operação Lava Jato - resumiu ao TSE a sistemática institucionalizada desde 2006 no grupo - um dos maiores da América Latina - para repassar dinheiro não declarado a partidos e políticos.

A explicação foi uma resposta à pergunta do advogado Flávio Caetano, que defende a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), na ação que pede a cassação da chapa presidencial Dilma presidente e Michel Temer (PMDB), vice, de 2014, por suposto abuso de poder econômico, que quis saber como era feito o pagamento de caixa 2 pela Odebrecht.

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 Foto: Estadão

"Nas maioria era em reais, porque era pago no Brasil; seria usado para custeio de campanhas no Brasil. Era em reais", completou o delator, ouvido no dia 2 de março.

Ao todo, os executivos afirmaram ao TSE terem acertado R$ 150 milhões de repasses à campanha de reeleição da ex-presidente Dilma. Os pagamentos eram feitos por doações oficiais, por caixa 2 ou pagamentos via terceiros, como os feitos pelo Grupo Petrópolis - dono da cervejaria Itaipava.

"Em 2014, se eu não estiver enganado foram 120 (milhões de reais) oficial, 40/50 (milhões de reais) Itaipava e 30/40 (milhões de reais) de caixa 2. Foi uma proporção dessa maneira."

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Segundo ele, na campanha de reeleição a Odebrecht teria feito a doação total de R$ 120 milhões aos partidos e candidatos, oficialmente. "Todas as campanhas: de presidente, governadores, senadores, deputados federais e deputados estaduais."

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O delator disse que Odebrecht não misturava propinas com doações oficiais a partidos e políticos. Na Lava Jato, empreiteiros confessaram em delações terem ocultado repasses de propina via doações oficiais ao partido, entre eles o dono do Grupo Setal, Augusto Ribeiro Mendonça, e o dono da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa.

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 Foto: Estadão

Mudança. O ministro relator da ação questionou o executivo da Odebrecht se ele achava possível existir contribuição empresarial a partidos e político sem caixa 2.

"É possível. É possível. tem que mudar o modelo. Tem que encontrar uma maneira para que as empresas façam doações bastante controladas e desvinculadas completamente de suas relações políticos", respondeu Benedicto. "Mas não sei como fazer. Porque, se ficar desse jeito...".

Benedicto foi presidente da Construtora Norberto Odebrecht, uma das unidades do grupo Odebrecht. O executivo - que está de licença - era um dos líderes empresariais, subordinados diretamente ao presidente da holding, Marcelo Bahia Odebrecht, que está preso desde 19 de junho de 2015, pela Lava Jato, em Curitiba.

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Como os demais líderes empresarias do grupo, o delator tinha poder para acionar o Setor de Operações Estruturadas para fazer pagamentos de propinas e outros repasses de caixa 2.

"Na condição de líder empresarial, eu focava mais nas campanhas de governadores, senadores e deputados. A campanha presidencial, na sua magnitude, era sempre levada para o Marcelo diretamente, porque ele tinha relação com as pessoas", explicou o delator ao ministro do TSE Herman Benjamin, relator da ação.

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Benedicto afirmou que era líder empresarial na área de infraestrutura da Odebrecht, até fevereiro de 2016 - atualmente está licenciado do grupo. "A minha função principal era coordenar a implantação de todos os projetos de construção de infraestrutura dentro do Brasil, sob coordenação da Odebrecht", afirmou o delator.

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O delator afirmou que criou-se um mercado nas campanhas eleitorais que precisar ser "destituído" para se acabar com o caixa 2. "Esse mercado tem que ser destituído porque aí vai sumir o caixa 2, porque vai virar um negócio... 'Olha, a campanha é isso aqui, tem que ser dessa maneira'; Tem que ter um fulcro, onde a população possa ver aquela comunicação sem o poder econômico ser abusado, como foi antes de 2016", opinou Benedicto.

"Em 2016 houve uma campanha limpa. Não vou dizer que não aconteceu o caixa 2, mas, provavelmente, foi numa dimensão e num risco que tomaram..."

 

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