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Pandemia e produtividade do trabalhador

Por Roberto Dumas
Atualização:
Roberto Dumas. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Os impactos da pandemia do coronavírus aos poucos têm sido percebidos pela sociedade como uma combinação perversa de um choque de oferta a um choque de demanda, momento em que o multiplicador Keynesiano falha em estimular a demanda agregada. Adjacente à esses impactos contracionistas, nota-se obviamente um aumento no nível do desemprego.

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A PNAD COVID (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio) do IBGE, que objetiva estimar o número de pessoas com sintomas referidos associados à síndrome gripal, bem como monitorar os impactos da pandemia da COVID-19 no mercado de trabalho brasileiro, semanalmente, alcançou 11.8 milhões de desempregados entre 14 a 20 de junho ou 12,3% da população economicamente ativa. O nível percentual se mostra um pouco inferior ao da semana anterior, que ficou em 12,4%, mas acima dos 10,5% da primeira semana de referência, datada de 4 de maio. Se levarmos em conta quem não procurou trabalho, mas desejavam trabalhar, mas não saíram à procura de novos postos de trabalho, dado o isolamento ou outros aspectos inerentes à pandemia, o número de desempregados subiria para 38,1 milhões, ou seja, 26,4 milhões de pessoas, das quais 17,3 milhões não procuraram trabalho por causa da pandemia ou por falta de oportunidade de trabalho perto de suas casas.

Mesmo com o aumento esperado do número de desempregados, se esses desalentos entrarem para a força de trabalho, há de se esperar que o nível de desemprego ainda aumente em períodos de flexibilização do isolamento, pois aqueles que anteriormente não buscaram empregos, mas que em algum momento, com o fim do isolamento certamente o farão, então a população economicamente ativa aumentará e o número de desocupados comparado com os que procuram efetivamente empregos, tenderá a mostrar uma nítida deterioração.

Trata-se de um fato conjuntural adverso, que provavelmente acelerará uma tendência inexorável por parte da população em ficar mais conectada, trabalhar de casa, fazer mais pagamentos digitais, enfim, buscar fazer suas atividades rotineiras com a ajuda da tecnologia, da automação e da digitalização.

É inegável que com a pandemia passamos a mudar nossos hábitos de consumo, utilizando plataformas de grandes empresas, onde compramos bens de outras empresas bem menores e virtuais. Essa nova tendência e consequente mudança estrutural no mercado de trabalho brasileiro certamente ceifará inúmeros postos de trabalho, onde a presença física do prestador de serviço não será mais necessária. Observaremos uma nítida mudança na cultura de consumo. Não obstante, se por um lado percebemos no curto prazo um impacto negativo, afinal o desaparecimento de vários postos de trabalhos, principalmente do segmento de serviços, tende a aumentar a desigualdade de renda no país, como bem escrito pelo economista e professor José Roberto Mendonça de Barros em sua coluna no jornal O Estado de São Paulo do dia 12/julho/2020 ; "Muitas mudanças após a pandemia".

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O mercado de trabalho no Brasil e no mundo, sofrerá com os impactos conjunturais da pandemia, e também com os impactos estruturais da doença, dado o fato de que nossas necessidades serão muito mais tecnológicas e passaremos a testemunhar um mundo mais digital e interconectado. Empresas passarão por enormes transformações com vultosos investimentos em tecnologia, digitalização e o trabalhador que não estiver capacitado para acompanhar essa evolução, será posto de lado. Precisaremos certamente de profissionais mais capacitados e produtivos, às custas de muitos, que provavelmente não lograrão acompanhar o dinamismo urgente dos processos de digitalização das empresas e dos serviços (e-commerce, serviços financeiros, telecomunicações, etc.)

Nesse aspecto existirão aqueles que perecerão nessa busca do mais capacitado, aqueles que compreenderão a evolução de uma economia capitalista inovadora e mais produtiva e aqueles que buscarão em vão defender o passado, como aqueles que ainda defendem a presença de trabalhadores cobradores de tarifas de ônibus, que facilmente poderiam ser substituídos, por novas alternativas de cobrança com a ajuda da tecnologia.

Para aqueles que ainda se prendem ao passado, há de se perceber a evolução e a melhora do bem estar da maioria dos membros da sociedade. Parafraseando um dos meus ídolos Raul Seixas, com uma pequena licença poética: "Capitalismo é uma metamorfose ambulante", que busca sempre a inovação e a competição, onde os mais preparados sobrevivem para preservar ou melhorar o bem estar de uma maioria. O grande economista austríaco Schumpeter já dizia: "a essência do capitalismo é a sua instabilidade". Quanto mais formos postos à prova e à competição, maiores esforços envidaremos para prover melhores serviços para o bem da maioria. Ainda assim creio que muitos leitores possam não concordar comigo, assim como empresas, mas se sempre estivermos em nossa zona de conforto, sem sermos submetidos à competição doméstica ou externa, de que forma nós nos tornaríamos mais competitivos e inovadores? O que nos faria tornarmos mais eficientes, buscando melhorar nossas qualidades intelectuais e profissionais, resultando em uma melhoria no bem estar da humanidade? Reflitamos.

*Roberto Dumas, economista, professor do Insper e Ibmec

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