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Pai de auditor do TCU é amigo de Bolsonaro e tem cargo na Petrobrás

Coronel do Exército,  Ricardo Silva Marques conhece o presidente desde os tempos da Academia Militar das Agulhas Negras

Por Lauriberto Pompeu/BRASÍLIA
Atualização:

A amizade do auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques com os filhos do presidente Jair Bolsonaro vem de família. O pai de Alexandre é o coronel do Exército Ricardo Silva Marques - formado na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), na mesma turma de Bolsonaro, em 1977 -, que hoje ocupa um cargo de diretor da Petrobrás.

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O TCU decidiu, nesta quarta-feira, 9, pelo afastamento cautelar de Alexandre por um prazo de 60 dias, além de pedir a abertura de inquérito policial sobre o caso e proibir a entrada do servidor nas dependências da Corte. Alexandre foi o servidor que produziu um levantamento não oficial apontando"supernotificação" de mortes por covid-19 no País. O relatório foi inserido no sistema do TCU sem que constasse de qualquer processo do órgão. O presidente Jair Bolsonaro citou o documento na segunda-feira, 7, na tentativa de comprovar sua tese de que metade das mortes registradas por covid-19 não eram relacionadas à doença. O tribunal o desmentiu no mesmo dia.

Ministros do TCU receberam a informação de que o pai de Alexandre é amigo de Bolsonaro. O servidor admitiu à chefia imediata que o coronel forneceu os dados para o presidente. Ricardo Silva Marques exerce hoje o cargo de gerente executivo de Inteligência e Segurança Corporativa na Petrobras.

Antes, Silva Marques trabalhou na assessoria especial da Olimpíada do Rio e foi gerente de segurança corporativa do bondinho do Pão de Açúcar. Desde maio de 2019, primeiro ano da gestão Bolsonaro, o coronel é gerente da Petrobrás.

A peça produzida por Alexandre foi inseridano sistema do TCU sem que constasse de qualquer processo do tribunal. A exemplo do pai, o auditor também ia serbeneficiado pela proximidade com a família Bolsonaro - um de seus melhores amigos é o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente. Alexandre chegou a ser indicado por ele para assumir a diretoria de Compliance  do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mas foi barrado pelo regimento interno do tribunal.

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À época, o então presidente do TCU, José Múcio Monteiro, chamou a atenção para o fato de que um servidor do tribunal não poderia ser cedido para uma instituição que pudesse ser alvo de apuração da Corte de Contas. "O regimento não permite, é a coisa mais simples", disse Múcio ao Estadão.

 

No currículo de Alexandre consta que ele é primeiro-tenente fuzileiro naval reserva da Marinha. Ele é formado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e bacharel em Ciências Navais pela Escola Naval. Em Brasília, já trabalhou nos ministérios da Justiça e do Planejamento.

O auditor tem uma página no Facebook na qual divulga vídeos expondo opiniões sobre política. Na rede social, o servidor conta que nasceu e cresceu no Rio, mas mora desde 2015 em Jundiaí (SP). Ele é casado com Nara Stuart de Pieri, enfermeira e filha do vereador paulistano Eliseu Gabriel, filiado ao PSB, partido de oposição a Bolsonaro.

O vereador classificou o genro como um profissional brilhante, estudioso, trabalhador e patriota, mas não "bolsominion". Gabriel diz ter sido pego de surpresa com a repercussão do 'vazamento' do material produzido por Alexandre que, segundo ele, não foi feito de má-fé nem em nome do Tribunal de Contas do Município (TCU).

"Até liguei pra ele para conversar a respeito. E ele me explicou que estava estudando se existia uma subnotificação ou mesmo sobrenotificação dos casos de covid-19. Mas estava fazendo isso por conta própria. Era um debate interno que acabou vazando", afirmou.

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Segundo o parlamentar, o que foi divulgado não representa a posição de Alexandre. "Ele estava pesquisando somente, levantando dados. Não era para publicar nada, era uma coisa interna mesmo."

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Em seu perfil pessoal, Alexandre endossa narrativas espalhadas pelo governo, como a recomendação do tratamento precoce com medicamentos sem eficáciacomprovada no combate à covid-19. No dia 12 de março, por exemplo, o auditor compartilhou uma notícia de TV dizendo que "autoridades médicas defendem o uso de ivermectina no tratamento da covid".

Outra tese de Bolsonaro que conta com a simpatia doservidor é a do "isolamento vertical". Vista com ceticismo pela comunidade médica e minoritária entre cientistas, a teoria consiste na separação daqueles que estão no grupo de risco à exposição ao vírus, como maiores de 60 anos e portadores de doenças crônicas. "Medicina é uma ciência, assim como a Economia. Uma não pode se sobressair a outra", escreveu Alexandre em 26 de março do ano passado, no início da pandemia.

Publicação do auditor em seu perfil no Facebook. Foto: Reprodução/Facebook

O corregedor do TCU, ministro Bruno Dantas, afirmou que "os fatos são graves e será necessário aprofundamento para avaliar a sua real dimensão". De acordo com Dantas, o auditor precisa ser punido caso confirmada a irregularidade. "Se ficar comprovado que o auditor utilizou o cargo para induzir uma linha de fiscalização orientada por convicções políticas, isso será punido exemplarmente", observou Dantas.

Em nota, o TCU destacou que o documento inserido por Alexandre no sistema se referia a uma "análise pessoal de um servidor do tribunal compartilhada para discussão", sem constar de quaisquer processos oficiais da Casa. "Ressalta-se, ainda, que as questões veiculadas no referido documento não encontram respaldo em nenhuma fiscalização do TCU", afirma o comunicado.

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O Estadão tentou contato com o auditor, mas foi informado pelo TCU de que ele não quer se manifestar.

COLABOROU ADRIANA FERRAZ

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