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Pagamento de R$ 2,4 mi para editora ligada à CUT foi para ocultar propina, diz MPF

Procuradores da Lava Jato sustentam que contratos entre empreiteira e Editora Gráfica Atitude, em 2010 e 2013, foram feitos a pedido do ex-tesoureiro do PT João Vaccari dentro do esquema de corrupção na Petrobrás

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Por Redação
Atualização:

Por Fausto Macedo, Julia Affonso e Ricardo Brandt

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A força-tarefa da Operação Lava Jato reuniu provas como notas fiscais, quebra de sigilos bancários e confissões de envolvidos para sustentar seu novo pedido de abertura de processo criminal contra o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque - indicação do partido na estatal - pela lavagem de R$ 2,4 milhões desviados da estatal entre 2010 e 2013.

O Ministério Público Federal aponta que a Editora Gráfica Atitude foi usada para ocultar o recebimento desse valor referente à propina do PT paga pelo grupo Setal - parte das 16 empresas acusadas pela Lava Jato de cartel e corrupção na Petrobrás. O grupo Setal é do executivo Augusto Ribeiro Mendonça Neto, que virou o primeiro delator da Operação Lava Jato nesse núcleo de corruptores do esquema da Petrobrás.

Da esquerda para a direita: João Vaccari, Renato Duque e Augusto Mendonça. Fotos: Geraldo Bubniak/AGB e André Dusek/Estadão Foto: Estadão

Para desviar esses recursos de forma aparentemente legal, Vaccari e Duque teriam usado dois contratos "de prestação de serviços ideologicamente falsos" feitos entre duas empresas do Grupo Setal e a Editora Atitude. Assim, emitiram "18 notas fiscais frias" que cobriram "22 transferências bancárias fraudulentas" entre o grupo e a editora.

O destino final era o PT. "(Para) viabilizar o recebimento (lavagem) de vantagens ilícitas sob a forma de 'doações oficiais', Vaccari também foi responsável por, em conjunto com Renato Duque, no interesse próprio e do PT, receber mediante celebração de contratos frios pela Editora Atitude, uma parte da propina paga pelo Grupo SOG/SETAL à Diretoria de Serviços da Petrobrás", registra a denúncia contra o ex-tesoureiro do PT.

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Oficialmente, a Editora Atitude tem vínculos com o Sindicato dos Bancários de São Paulo e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC - ambas entidades ligadas à CUT ao PT. Para o MPF, no período entre 2010 e 2013 João Vaccari, Renato Duque e Augusto Mendonça agiram "de modo consciente, voluntário e reiterado, em comunhão de vontades e por intermédio de organização criminosa que integravam".

Contratos. A Lava Jato tem os dois contratos firmados entre a Setec Tecnologia S.A. e a Editora Atitude, do dia 1º de abril de 2010, e a SOG - Óleo e Gás S.A. e a Editora Atitude, de 1º julho de 2013. Cada um no valor de R$ 1,2 milhão.

O primeiro contrato foi assinado entre a Setal e a Editora Atitude em abril de 2010 pelo valor de R$ 1,2 milhão.

"Atendendo ao pedido de Renato Duque, em data incerta, mas próxima ao dia da celebração do primeiro contrato em 1 de abril de 2010, Augusto Mendonça encontrou-se com Vaccari, o qual lhe solicitou que, paralelamente ao repasse de propinas ao PT mediante doações oficiais, repassasse parte das propinas a tal agremiação, no valor de R$ 1,2 milhão, mediante a realização de pagamentos à Editora Atitude, sediada em São Paulo."

Segundo a denúncia, o executivo e delator realizou os pagamentos porque tinha interesse em atender aos pedidos do então diretor de Serviços da Petrobrás e do operador de propina Vaccari para depois fazer a "baixa das propinas que prometera à referida Diretoria.

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O primeiro contrato teve como objeto nominal e fictício "o incentivo da Setal, para que a Revista do Brasil, edição mensal impressa, com tiragem de 360 mil exemplares, distribuídos gratuitamente à sócios de sindicatos e comercializada em bancas de jornais e revista" fizesse a publicação de conteúdo "noticioso e opinativo sobre temas relacionados com o desenvolvimento e proteção da indústria nacional no Brasil, no tocante à área de extração de petróleo e na conversão em seus derivados".

Foram emitidas 12 notas fiscais da Setal para a Editora Atitude entre junho de 2010 e abril de 2011 que totalizaram R$ 1,2 milhão. Pelo contrato firmado, os pagamentos seriam mensais no valor de R$ 100 mil.

VEJA TABELA MONTADA PELO MPF

 

Na outra ponta foram identificas as 12 transferências feitas por duas empresas do grupo Setal, controladas por Mendonça, Tipuana e Projetec, entre junho de 2010 e novembro de 2011.

"Importante destacar, nesse sentido, que os dados entabulados, por suas características, notadamente a existência de pagamentos fora dos períodos corretos em relação às notas, três deles muito posteriores à emissão dessas, evidenciam que a emissão das notas frias se deu com o intuito de justificar formalmente ("lavar") o trânsito do dinheiro sujo", registra a denúncia.

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Segundo contrato. Em 2013, Vaccari teria novamente cobrado propina do executivo da Setal. Nesse período, Duque já não ocupava mais a Diretoria de Serviço, mas mantinha suas influências, sustentam os investigadores.

Foi feito então o segundo contrato assinado em julho de 2013. Desta vez com outra empresa controlada por Mendonça, a SOG - Óleo e Gás e a Gráfica Atitude, também pelo valor de R$ 1,2 milhão.

"A utilização do expediente acima, com a emissão de notas tão somente para dar aparência de licitude, justificando formalmente, sob prisma econômico, o trânsito (lavagem) do dinheiro sujo oriundo da empreiteira administrada pelo denunciado Augusto Mendonça, é sinalizada pela discrepância do método, pois a primeira linha da tabela retrata a transferência de valores anterior à emissão da respectiva nota fiscal, diferentemente do que ocorreu em outros meses."

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Nova acusação envolve desvios em refinarias da Petrobrás

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"A partir de tais quebras foi possível comprovar 14 depósitos mensais por elas realizados à Editora Gráfica Atitude, nos anos de 2010, 2011 e 2013", registra a denúncia.

VEJA QUADRO ELABORADO PELO MPF

 Foto: Estadão

"Por meio dessas notas e pagamentos, ocultaram e dissimularam a natureza, origem, disposição, movimentação, localização e propriedade de R$ 2,4 milhões provenientes, direta e indiretamente, de delitos de organização criminosa, formação de cartel, fraude à licitação e corrupção, por eles praticados em detrimento da Petrobrás", sustentam os procuradores da força-tarefa.

A discrepância identificada entre o valor das notas fiscais e o montante transferido se dá em decorrência do desconto de tributos, explicou o MPF.

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COM A PALAVRA, A DEFESA 

EDITORA GRÁFICA ATITUDE

Em outra ocasião, o coordenador de planejamento editorial da Gráfica, Paulo Salvador, afirmou que nunca tratou de patrocínios para a empresa com o tesoureiro do PT João Vaccari Neto. Salvador, contudo, evitou responder ao ser questionado sobre a delação do executivo Augusto Mendonça, que afirmou ter depositado valores na conta da gráfica a pedido de Vaccari. "Não recebemos nenhuma demanda da Justiça ainda."

Ele afirmou que a empresa não pertence ao PT ou à CUT, mas possui uma "afinidade política" com a sigla nos temas que aborda em suas publicações.

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COM A PALAVRA, A DEFESA DE JOÃO VACCARI NETO.

O criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, que defende João Vaccari Neto, reagiu à nova denúncia da força tarefa da Operação Lava Jato. Para ele, o Ministério Público Federal deveria ter feito um aditamento à primeira denúncia já apresentada contra o ex-tesoureiro do PT no âmbito do esquema de corrupção na Petrobrás.

"A própria denúncia diz que é um prolongamento do processo anterior que Vaccari responde. Acho estranho uma nova ação. A Procuradoria deveria promover um aditamento à primeira denúncia, naquele próprio processo", avalia D'Urso.

Sobre o teor da nova denúncia, o criminalista é taxativo. "Reitero que Vaccari não tem conhecimento, participação ou intermediação entre supostos depósitos de Augusto Mendonça (delator da Lava Jato) para quem quer que seja, especialmente a essa editora Atitude a favor de quem ele (Augusto Mendonça) teria realizado depósitos." Luiz Flávio D'Urso sustenta, ainda. "Mesmo que existiam recibos de depósitos das empresas de Augusto Mendonça para a editora Atitude isso não tem nada a ver com Vaccari, que desconhece tal operação e nunca orientou Augusto Mendonça a realiza-la."

"Nenhuma prova da participação de Vaccari nas condutas indicadas nessa nova denúncia foi trazida pelo Ministério Público Federal", afirma D'Urso. "Repito que se trata, como está no texto da própria acusação, de um prolongamento daquela primeira ação. Se é prolongamento daquela o Ministério Público Federal deveria ter aditado à denúncia, não propor uma nova ação."

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O advogado de Vaccari voltou a criticar a delação que dá base às ações contra o ex-tesoureiro do PT. "É tudo com base na palavra desse Augusto Mendonça, que é delator. Palavra de delator não é prova, é uma informação que carece de confirmação posterior. Inexiste qualquer comprovação de participação de Vaccari nos atos descritos nessa denúncia."

COM A PALAVRA, A DEFESA DE RENATO DUQUE.

O advogado Alexandre Lopes declarou: "A nova denúncia oferecida contra Renato Duque, por lavagem de dinheiro, inicialmente, é inepta, imprestável processualmente. Além disso, trata-se, no que tange a Renato Duque, de uma peça fantasiosa, criação meramente cerebrina dos Procuradores da República. Ademais, o alicerce de parte da acusação é a falsa delação de um criminoso confesso, Augusto Ribeiro, que mente para obter benefícios do Judiciário. A defesa demonstrará, com tranquilidade, que se trata de um absurdo jurídico. Duque não recebeu propina, não possui e não movimentou dinheiro fora dom pais e não fará delação premiada, pois não tem o que e/ou quem delatar."

COM A PALAVRA, A CRIMINALISTA BEATRIZ CATTA PRETA.

A criminalista Beatriz Catta Preta, do escritório Catta Preta Advogados, que defende o executivo Augusto Mendonça, disse que a denúncia contra ele já era um fato esperado. Catta Preta é a advogada que conduziu as principais delações da Operação Lava Jato, relatos que tornaram público o esquema de cartelização das grandes empreiteiras para propinas a políticos e ex-diretores da Petrobrás.

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Sob orientação de Catta Preta fizeram delação o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, os executivos Augusto Mendonça e Julio Camargo e o ex-gerente de Engenharia da estatal, Pedro Barusco. Nesta segunda feira, 27, Beatriz Catta Preta esclareceu que a denúncia contra Mendonça estava prevista no acordo de colaboração firmado pelo executivo com a força tarefa do Ministério Público Federal.

"Diante do acordo de colaboração celebrado entre o sr Augusto Mendonça e o Ministério Público Federal, o oferecimento de denúncias envolvendo os fatos revelados já era esperado", declarou Beatriz Catta Preta.

LEIA A ÍNTEGRA DA NOTA PÚBLICA DA DEFESA DE JOÃO VACCARI NETO

"A defesa de João Vaccari Neto se manifesta sobre esta nova denúncia, apresentada pelo Ministério Público Federal, nesta data, que trata de tema envolvendo o delator Augusto Mendonça. Na verdade, a defesa estranha o fato de não ter havido o aditamento da denúncia anterior, pois o episódio relatado nessa nova denúncia refere-se tão somente à versão apresentada pelo delator Augusto Mendonça. Nenhuma prova foi apresentada quanto à participação do Sr. Vaccari, que nega, veementemente, ter orientado o delator Augusto Mendonça a fazer qualquer depósito, a qualquer título, na conta dessa Editora Gráfica Atitude.

Inexiste investigação na qual o Sr. Vaccari tenha sido questionado oficialmente sobre esses supostos fatos, narrados nesta nova denúncia. Reitera-se que o Sr. Vaccari não tratou de doação ao PT em período anterior a sua posse como tesoureiro do partido. Após 2010, na condição de tesoureiro, por seu dever de ofício, solicitou doações, a pessoas físicas e jurídicas, destinadas ao Partido dos Trabalhadores, todas elas legais, por via bancária, com emissão de recibos e sob fiscalização das autoridades competentes.

Por derradeiro, o Sr. Vaccari continua confiando na Justiça, no firme propósito de colaborar para que a verdade prevaleça e sua inocência possa ser confirmada judicialmente.

São Paulo, 27 de abril de 2015

Prof. Dr. Luiz Flávio Borges D'Urso

OAB/SP 69.991"

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