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Os próximos 5 anos da nossa Lei Anticorrupção

Por Renato Santos
Atualização:
Renato Santos. FOTO: Celso Doni/Cordel Imagens Foto: Estadão

Esse artigo tem como primeiro objetivo celebrar o aniversário de 5 anos da Lei 12.846/13, conhecida como Lei Anticorrupção Brasileira, mas também refletir sobre o seu futuro e o futuro do Compliance nas empresas.

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A celebração, por mais que óbvia, é necessária, uma vez que a Lei Anticorrupção foi um marco na história da gestão de empresas brasileiras. A partir dela houve uma mudança substancial da importância do tema Integridade nas pautas corporativas. Neste momento, vemos profissionais especializados em Compliance ocupando cadeiras em reuniões da cúpula da empresa e de seus Conselhos.

Há 15 anos a consultoria Korn/Ferry International publicou uma pesquisa com 212 executivos da América Latina perguntando "Quais valores você gostaria de enfatizar em sua companhia nos próximos anos?". 56% responderam que seria "Ética, Transparência e Honestidade", resultado acima de "Foco nos objetivos e Resultados" (46%), fruto de uma tendência que foi preconizada na Convenção sobre o Combate da Corrupção em vigor desde 1999 (o Brasil é um dos 39 países signatários desse acordo) dirigido pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), a qual apresenta diretrizes de boas práticas de controles internos, ética e compliance a serem observadas pelos signatários.

Daí, com o objetivo de atender os compromissos internacionais, sobretudo os previstos na Convenção da OCDE, a Lei Anticorrupção dispõe sobre a responsabilidade administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.

O avanço se dá pelo fato de que, além da sua natureza punitiva, a referida Lei também atribui especial relevância às medidas anticorrupção adotadas por uma empresa, que podem ser reconhecidas como fator atenuante em um eventual processo de responsabilização. O conjunto dessas medidas constitui o chamado Programa de Integridade e prevê em seu artigo 7.º e no seu Decreto nº 8.420/2015 de 18 de março de 2015 as diretrizes que podem auxiliar empresas a construir ou aperfeiçoar políticas e instrumentos destinados à prevenção, detecção e remediação de atos antiéticos:

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Comprometimento e apoio da alta direção: o apoio da alta direção da empresa é condição indispensável e permanente para o fomento a uma cultura ética e de respeito às leis e para a aplicação efetiva do Programa de Integridade;

Instância responsável pelo Programa de Integridade: qualquer que seja a instância responsável, ela deve ser dotada de autonomia, independência, imparcialidade, recursos materiais, humanos e financeiros para o pleno funcionamento, com possibilidade de acesso direto, quando necessário, ao mais alto corpo decisório da empresa;

Análise de perfil e riscos: a empresa deve conhecer seus processos e sua estrutura organizacional, identificar sua visão geral da área de atuação e principais parceiros de negócio;

Estrutura das regras e instrumentos: com base no conhecimento do perfil e riscos da empresa, deve-se elaborar ou atualizar o código de ética ou de conduta e as regras, as políticas e os procedimentos de prevenção de irregularidades;

Desenvolver mecanismos de detecção ou relatos de irregularidades: alertas; canais de denúncia; mecanismos de proteção ao denunciante;

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Definir medidas disciplinares para casos de violação e medidas de remediação.

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Para uma ampla e efetiva divulgação do Programa de Integridade, deve-se também elaborar o Plano de Comunicação e treinamento com estratégias específicas para os diversos públicos da empresa;

Estratégias de monitoramento contínuo: é necessário definir procedimentos de verificação da aplicabilidade do Programa de Integridade ao modo de operação da empresa e criar mecanismos para que as deficiências encontradas em qualquer área possam realimentar continuamente seu aperfeiçoamento e atualização.

Por esse prisma, a Lei Anticorrupção fomentou a discussão da "integridade" considerando-a como a intensidade de manifestação de comportamentos dignos e honestos, isto é, o quanto o indivíduo compreende o contexto e pauta suas atitudes na perspectiva moral, compreendendo a conduta de acordo com a regra (compliance) ou com o seu desvio (fraude).

Mas, qual o futuro dos Programas de Integridade? Como as empresas podem evoluir e avançar no combate a desvios éticos?

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Há caminhos por meio da abordagem sociológica para compreender as causas de fraudes, assim como os elementos de um modelo antifraude. É possível a identificação dos componentes repetitivos no comportamento de funcionários fraudadores, como por exemplo o modelo preditivo "pentágono da fraude", desenvolvido em minha tese de doutorado que prevê as 5 causas para ocorrência de fraude em uma empresa: racionalização, pressão, oportunidade, capacidade e disposição ao risco.

A partir desses componentes, é possível criar indicadores para orientar estratégias preditivas que considerem as características de cada organização, os tipos de fraude e o perfil do funcionário, criando assim um programa que aumenta o potencial para a organização influir nas contingências que podem balizar o comportamento do funcionário antes que se torne um fraudador, porque a fator humano é o que de fato dirige as decisões em cumprir ou não o que preconiza as leis, como a Lei Anticorrupção.

Nessa perspectiva, para garantir o futuro do Compliance nas empresas deve ser considerado que as decisões e ações do indivíduo são influenciadas pelo contexto social a que está inserido, sendo a má conduta também construída nas interações sociais. O contexto organizacional criado e compartilhado pelos membros da organização é a amálgama para a compreensão dos fatores influenciadores de comportamentos fraudulentos.

Então, temos que reforçar a Cultura Organizacional, com seus valores e pressupostos sobre o que é certo e errado, apresentando diretrizes para os seus membros, e estes influenciando também na constituição, mudança e reforço da cultura. E a organização pode influenciar sobremaneira na manutenção ou revisão da sua cultura, influenciando na percepção ética dos seus membros.

Se a empresa apenas implementar as ações previstas e descritas na Lei Anticorrupção sem avançar no desenvolvimento de uma cultura de Integridade real e efetiva, teremos apenas uma "lei morta" a ser seguida para minimizar impacto de punições. Nosso maior desafio começa agora: melhorar a integridade da pessoa no trabalho!

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*Renato Santos é PhD em Fraude e Assédio. Advogado, com MBA em Gestão de Pessoas, Mestre e Doutor em Administração pela PUC-SP. Autor do livro Compliance Mitigando Fraudes Corporativas. Sócio da S2 Consultoria, empresa especializada em prevenir e tratar atos de fraude e assédio nas organizações

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