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Os prefeitos sem voto

Por Eduardo Damian
Atualização:
Eduardo Damian. FOTO: DIVULGAÇÃO  

Vivenciamos em 2020 uma eleição atípica, realizada em plena pandemia, com inegáveis restrições de comunicação e com atos de campanha limitados pelo Covid 19. Em virtude do momento pandêmico e, com base em estudos científicos, o Congresso Nacional, através da Emenda Constitucional 107/2020, promoveu o adiamento das eleições do dia 04 de outubro para o dia 15 de novembro. Onde teve segundo turno, os eleitores escolheram seus representantes no dia 29 de novembro. A mudança foi tomada em interlocução direta com o Tribunal Superior Eleitoral.

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No entanto, a tentativa de solução de um problema deixou outro ainda mais evidente.

Desde a eleição de 2016, o § 3º do artigo 224 do Código Eleitoral passou a prever que, nos casos de indeferimento de registro de candidato a cargo majoritário eleito, novas eleições deverão ser realizadas. Além disso, o artigo 16-A da Lei 9.504/97 (Lei das Eleições) autoriza que o candidato sub judice permaneça em campanha e com nome na urna eletrônica, até julgamento final do seu registro pelo Tribunal Superior Eleitoral. De toda maneira, o candidato mais votado somente pode ser diplomado e tomar posse, caso obtenha o aval da Justiça Eleitoral em seu registro. Assim, nesse arcabouço jurídico, diante de um período de aproximadamente 45 dias entre a data final do pedido de registro e a data da eleição, torna-se praticamente impossível ter o julgamento final de candidatos impugnados até a data do pleito.

O necessário cumprimento do devido processo legal, com o respeito aos prazos processuais fixados em lei complementar, ficou espremido pela exiguidade do período eleitoral. Isso culminou com situações esdrúxulas e, logicamente, incompreensíveis ao cidadão comum. O eleitor presencia o candidato pedindo voto, diariamente, na televisão, rádio ou internet, acolhe suas propostas e confirma o voto. O candidato escolhido é o mais votado para prefeito, porém não poderá assumir. Ele não teve registro de candidatura aceito pela Justiça Eleitoral. A solução será a realização de eleições suplementares em até 90 dias. Tudo de novo, mesmo em plena pandemia. Até a eleição suplementar, quem assume a Chefia do Executivo é o presidente da Câmara. Alguém que pediu voto e ganhou a eleição para vereador, mas será promovido a prefeito, por conta de uma lei injusta.

Apenas na eleição de 2020, segundo informações públicas, 96 prefeitos mais votados não assumiram seus cargos e esses municípios estão sendo administrados por um vereador. Por enquanto. É que outras centenas de requerimentos de registros de candidatura ainda dependem da análise do Tribunal Superior Eleitoral. Se antes da pandemia a Justiça Eleitoral já não possuía meios e prazos para julgar a tempo, com a mudança no calendário o problema ficou mais claro.

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Chegou o momento de iniciar o debate político para antecipação do julgamento dos registros de candidatura pela Justiça Eleitoral, mantendo-se o período de propaganda reduzido a candidatos elegíveis, permitindo que os fundos públicos de recursos sejam gastos com quem possa assumir um cargo eletivo, evitando, ainda, gastos com eleições suplementares. A insegurança jurídica revelada por essa distorção legislativa menospreza a vontade do eleitor e compromete a lisura do sistema eleitoral brasileiro.

*Eduardo Damian é advogado, mestre em Direito Processual pela UERJ, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB Nacional e professor da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro

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