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Os impactos dos mecanismos de compliance para a concessão de crédito

Os mecanismos de compliance e integridade empresarial tiveram forte impacto na forma de condução dos negócios no mercado brasileiro, sobretudo após a edição da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013). Um dos principais efeitos é o aperfeiçoamento dos mecanismos de compliance e integridade por parte das empresas brasileiras no âmbito negocial e de estruturação de negócios.

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Por Andrezza Oikawa e Clóvis Alberto Bertolini de Pinho
Atualização:

Muito embora o movimento chegue com certo atraso no Brasil, a exigência de mecanismos adequados, além de incentivado pelos movimentos anticorrupção, em decorrência sobretudo das agitações da Operação Lava-Jato, estimulou que os próprios agentes privados passassem a exigir mecanismos de compliance e integridade nas suas relações de negócios.

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Hoje, já é comum na realidade empresarial brasileira a realização de uma pesquisa reputacional de outras empresas para a celebração de parcerias comerciais e societárias, como no caso na formação de consórcios para a participação de procedimentos de contratação pública ou mesmo em contratos de fornecimento de longo prazo.

São muitas as empresas que consideram como um evento de alto risco ter sua marca e seus negócios relacionados com terceiros que não primam pela conformidade na condução de suas atividades empresariais. Conformidade essa que passa por todos os aspectos relacionados à integridade empresarial (práticas anticorrupção, relações de trabalho, obrigações fiscais, aspectos socioambientais, dentre outros).

Outro ponto de especial relevância para a implementação de mecanismos de compliance está na possibilidade de uma melhoria na imagem de uma determinada empresa na hora de concessão de crédito. Isso porque a existência de uma boa estrutura de controle de riscos transmite, em primeiro lugar, a evidência de um comprometimento da empresa para evitar situações de não conformidade.

Entretanto, a mera existência de uma estrutura de compliance não é suficiente para garantir que fraudes ou desvios não ocorram nos negócios. Para além da estrutura, deve estar clara e demonstrada a efetividade dos mecanismos de compliance por parte daquele que pretende acessar linhas de crédito. Para isso, já existem ferramentas capazes de avaliar a seriedade de um Programa de Compliance, como os critérios expostos pela ISO 37.001, que avaliam os mecanismos das empresas em situações de oferecimento de suborno a agentes públicos ou privados.

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Há uma clara tendência no mercado financeiro, especialmente para financiamentos de longo prazo voltados à realização de investimentos, pela exigência de programas de compliance como fator relevante nas análises de concessão de crédito.

No Brasil, a título de exemplo, o BNDES, desde o ano de 2016, estabeleceu, a partir da Circular SUP/AOI Nº 04/2016/BNDES, que a relação entre o Banco e os beneficiários dos Produtos BNDES Automático, BNDES Finame, BNDES Finame Leasing e BNDES Finame Agrícola deveria conter mecanismos de compliance, bem como a presença de uma cláusula anticorrupção no âmbito contratual.

Por sua vez, no âmbito internacional, vale destacar que as mais relevantes instituições financeiras multilaterais, por meio da International Financial Institutions Anti-corruption Task Force (formada pelo Bando Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Fundo Monetário Internacional, Banco Europeu de Investimento, Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento, Banco de Desenvolvimento Africano e Banco de Desenvolvimento Asiático) uniram esforços e, no ano de 2006, consolidaram uma força tarefa para o combate à corrupção no âmbito internacional.

A mencionada força tarefa definiu os parâmetros de investigação de integridade de candidatos a financiamentos internacionais. As políticas mencionadas levam em consideração a possibilidade de apoio financeiro a projetos de instituições privadas, por meio de mecanismos de compliance que devem ser observados para que as empresas tenham seus projetos contemplados.

Além disso, a International Finance Corporation (IFC), o braço do Banco Mundial com foco em financiamentos para o setor privado, conforme o documento intitulado Unique Markets, Responsible Investing - IFC's Integrity Due Diligence Process (Mercados Únicos, Investimento Responsável - Processo de Due Diligence de Integridade da IFC), a IFC, realiza processos de investigação de integridade em seus clientes e parceiros.

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As due diligences de integridade são consideradas como essenciais para garantir que a instituição trabalhe com clientes e parceiros de negócios que não colocam em risco sua reputação, atuando de acordo com os altos padrões de integridade corporativa e ética, bem como práticas de mercado adotados pela IFC. Observa-se que, mesmo após a contratação, durante todo o ciclo de um projeto financiado pela IFC, podem ser realizados novos procedimentos de análise de integridade dos seus clientes.

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Menciona-se, ainda, que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), além de realizar a investigação prévia de integridade, mantém publicada uma lista de empresas e pessoas físicas que tiveram sua reputação abalada por práticas consideradas em desconformidade com os padrões éticos e morais exigidos pela instituição.

Nesse contexto, empresas com controles frágeis, que não adotam programas efetivos de compliance, têm seus projetos avaliados como de risco elevado, o que dificulta o acesso ao apoio financeiro de instituições multilaterais.

Destaca-se que o acompanhamento de conformidade deve seguir durante todo o ciclo do investimento. Assim, desvios de conduta serão sancionados mesmos após a contratação das operações.

A incorporação e a sistematização de regras de conduta e conformidade, para além dos efeitos positivos na gestão e perpetuidade dos negócios, são importantes ferramentas de acesso ao crédito. Práticas de investigação de integridade altamente disseminadas em operações de financiamentos internacionais, já são realidade no mercado interno.

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E, considerando as implicações legais e reputacionais do envolvimento com empresas de conduta duvidosa, entende-se que as investigações de integridade serão cada vez mais presentes nas relações institucionais no mercado brasileiro. Por esse motivo, as empresas devem implementar em seus procedimentos internos de contratação, fiscalização e auditoria práticas de compliance e due diligence, de modo a garantir maior segurança jurídica na hora de obtenção de crédito.

*Andrezza Oikawa e Clóvis Alberto Bertolini de Pinho são advogados do VGP Advogados

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