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Os desafios das práticas trabalhistas de ESG

Por Letícia Ribeiro
Atualização:
Letícia Ribeiro. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O padrão ESG tem sido amplamente discutido e vem experimentando um crescimento exponencial. A letra "S" refere-se justamente à responsabilidade social e ao impacto das empresas na sociedade. A mudança de paradigmas empresariais tem gerado impactos importantes na esfera trabalhista, englobando aspectos que vão além do respeito aos direitos humanos e normas laborais e ampliando as fronteiras originais dos critérios de sustentabilidade.

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Há alguns anos, o mero cumprimento da legislação aplicável à força de trabalho, especialmente das regras de medicina e segurança ocupacional, já seria suficiente para invocar a credibilidade corporativa por práticas socialmente responsáveis.

Atualmente, tem-se demandado cada vez mais das empresas e questões como diversidade, inclusão social, remuneração adequada, qualidade de vida - sobretudo após a pandemia do COVID19 - e proteção de dados entraram na pauta das grandes organizações. Muito além do respeito às leis trabalhistas, espera-se que empregadores trabalhem para melhorar seus impactos sociais, inclusive por meio de práticas que estimulem o desenvolvimento social e valores éticos no ambiente corporativo.

Na prática, há uma transferência de responsabilidade para que entes privados desenvolvam ações que possivelmente não seriam necessárias caso as políticas públicas tivessem sido bem-sucedidas.

Isso porque, embora a Constituição Federal brasileira garanta, no artigo 5º, igualdade para todos os cidadãos, essa regra sofre várias limitações práticas. É justamente para buscar a implementação da igualdade de oportunidades e tratamento que empresas têm se socorrido de ações afirmativas. Há, no entanto, desafios corporativos internos e externos - que não estão sob o controle direto das organizações - nessa longa caminhada.

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Um dos principais desafios internos das empresas é conseguir que as práticas de ESG sejam adotadas por todos e de forma consistente. Para isso, é necessário que gestores priorizem sua implementação como parte da estratégia de desenvolvimento da reputação do negócio. Além disso, considerar o atingimento de metas relacionadas ao desenvolvimento social corporativo como parte do plano de remuneração de executivos tornou-se uma ferramenta muito eficiente nos últimos anos.

A insegurança jurídica, por sua vez, encabeça os desafios externos. Diversas iniciativas corporativas são frequentemente canceladas ou restringidas justamente pela preocupação relativa aos seus impactos legais, inclusive sobre como serão vistas pela Justiça do Trabalho. Esse sentimento de incerteza vem sendo alimentado por disputas judiciais questionando, por exemplo, a legalidade de medidas para a contratação de profissionais com representação inadequada em certos segmentos da sociedade, sob o pretexto de suposto racismo reverso.

Da mesma forma, empregadores temem que eventuais concessões a determinados perfis de diversidade, como por exemplo subsídio para o aprendizado de inglês, tornem-se não apenas um direito adquirido para esses grupos, mas também base de pedido de equiparação por outros não contemplados. Isso sem falar no risco de eventual infração da lei geral de proteção de dados ao monitorar a evolução dos programas de inclusão, especialmente em se tratando de dados sensíveis como orientação sexual e identidade de gênero.

A falta de segurança jurídica representa um verdadeiro desincentivo para empregadores adotarem práticas trabalhistas inovadoras e mais arrojadas. Ainda que não seja possível mudar a natureza litigiosa das relações de trabalho, a importância da Justiça do Trabalho na análise das práticas trabalhistas de ESG torna-se ainda mais relevante para estimular que empresas sigam na busca da mitigação de desigualdades históricas.

Nesse sentido, o Ministério Público do Trabalho (MPT) também desempenha papel importantíssimo para reforçar a importância das ações positivas destinadas à promoção de igualdade de oportunidades no mercado de trabalho, inclusive por meio de notas técnicas, contendo análises profundas e baseadas em informações relevantes, elaboradas por técnicos com amplo conhecimento sobre o assunto em discussão.

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Mais do que pela pressão social, o real desenvolvimento das práticas ESG dependerá diretamente da evolução da jurisprudência trabalhista sobre o tema. Quanto mais o judiciário prestigiar as inovações corporativas que busquem implantar uma cultura sustentável, mais elas serão desenvolvidas. A clara convergência de interesses entre os poderes público e privado pelo aumento de boas práticas sociais deve ser estimulada, especialmente pela Justiça do Trabalho, na construção de condutas isonômicas e mais inclusivas no ambiente corporativo.

*Letícia Ribeiro, sócia da prática trabalhista do Trench Rossi Watanabe

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