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Os crimes relacionados à covid-19

Por Wagner Roberto Ferreira Pozzer e Lucas Fernando Serafim Alves
Atualização:
Wagner Roberto Ferreira Pozzer e Lucas Fernando Serafim Alves. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A pandemia de covid-19 impôs à grande parte da população drásticas mudanças nas rotinas diárias, exigindo não somente a observância de cuidados no contato físico, mas, também, o isolamento social para reduzir a rápida proliferação desse vírus.

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No dia 6 de fevereiro de 2020 foi publicada a Lei 13.979, que introduziu uma série de medidas a serem implementadas para o enfrentamento da situação emergencial de saúde pública, dentre elas o isolamento e quarentena.

O isolamento, para os efeitos da lei, consiste na separação de pessoas doentes ou contaminadas daquelas que estão sadias, para evitar o contágio ou a propagação do coronavírus, enquanto a quarentena diz respeito à restrição de atividades das pessoas que não estejam doentes para, assim, impedir a disseminação dessa infecção humana.

Essas palavras ganharam, no curso das últimas semanas, significado próprio e diferente, sendo confundidas com o distanciamento social imposto por recomendações da Organização Mundial da Saúde.

Em razão desse condicionamento comportamental, é comum o surgimento de dúvidas quanto à eficácia das normas legais editadas nas três esferas do governo, principalmente no que diz respeito ao âmbito tributário, fiscal e trabalhista, haja vista a inevitável crise financeira que advirá desse nebuloso (e incerto) período por todos vivenciado.

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Indagações relacionadas à possibilidade de retomada das atividades empresariais, ainda que seja com as portas fechadas e sem atendimento ao público, são constantemente formuladas, vez que raríssimos empresários estavam preparados para interromper a cadeia de produção ou a prestação de serviços por mais de 30 dias ininterruptos.

Nesse excepcional momento de crise, alguns cuidados devem ser observados, sobretudo, para que determinadas condutas - ainda que estejam voltadas para a preservação da empresa - não acabem sendo consideradas criminosas.

Para auxiliar, segue quadro informativo com as principais atitudes tipificadas pela legislação penal:

CRIME DE INFRAÇÃO DE MEDIDA SANITÁRIA PREVENTIVA

De acordo com o artigo 268 do Código Penal infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa poderá sujeitar o infrator à detenção de um mês a um ano, e multa. Lembremos que há vários graus de indicação pela autoridade de comportamentos a serem evitados ou serem implementados. Em primeiro lugar, há a orientação, depois passa-se à recomendação para, em seguida, se atingir a determinação, leia-se a ordem pública cujo descumprimento interessa a lei penal.

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Nessa hipótese, o agente que descumprir a determinação da Lei 13.979/2020 ou a norma do Poder Público (municipal, estadual ou federal), desde que o faça com livre consciência e vontade ou assuma o risco de produzir o resultado poderá ser responsabilizado pela violação à medida sanitária preventiva.

Importante destacar que, nesse caso, há a presunção de risco à sociedade (perigo abstrato), sendo irrelevante a demonstração de que a conduta adotada não expôs outros à contaminação de covid-19.

CRIME DE EPIDEMIA

Previsto no artigo 267 do Código Penal, esse crime é praticado quando determinada pessoa, ciente de estar contaminada pelo coronavírus, promove deliberadamente a transmissão da doença para outras pessoas.

Em razão da gravidade da conduta (tanto que é considerado crime hediondo), o infrator poderá ser apenado com reclusão de 10 a 15 anos. Se resultar na morte da vítima, a pena será dobrada.

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O legislador também constituiu esse delito na forma culposa:  aquele que praticar esse delito "ignorando o dever geral de cuidado" (elemento que constitui o crime culposo), no caso conduta difícil de imaginar: propagação de epidemia por culpa.

Para o ilícito culposo, a pena é de detenção de um a dois anos.

Caso o delito culposo resulte em morte da vítima, a penalidade aumenta para dois a quatro anos de detenção.

CRIME DE PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE

Dispõe o artigo 131 do Código Penal a conduta de praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio.

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Nesse caso, o infrator será punido com reclusão de um a quatro anos.

Esse crime exige que o agente tenha o propósito de agir, isto é, de transmitir a doença a outras pessoas.

CRIME DE DESOBEDIÊNCIA

O desrespeito à ordem de fechamento das portas, para evitar a aglomeração de pessoas em determinado local, poderá resultar na prática do crime de desobediência (art. 330, CP), sujeitando o infrator à detenção de quinze dias seis meses, e multa.

A Portaria Interministerial n.º 05 de 2020 (Ministério da Justiça e Ministério da Saúde) dispôs que a autoridade policial poderá lavrar termo circunstanciado em detrimento daquele que for flagrado praticando os crimes previstos nos artigos 268 e 330 do Código Penal.

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CRIME DE ATENTADO CONTRA A LIBERDADE DE TRABALHO

Esse crime, previsto no artigo 197 do Código Penal, restará configurado na hipótese de alguém ser obrigado, mediante ameaça ou violência, a trabalhar ou não durante o período de instabilidade.

Do mesmo modo, incidirá nesse tipo penal aquele que constranger alguém a abrir ou fechar estabelecimento de trabalho, sendo que em ambas as situações o agente poderá ser penalizado com detenção de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência.

Em suma, no atual cenário de incertezas criado por essa pandemia mundial, com redução de receitas, embora manutenção de despesas sociais, trabalhistas e tributárias, há que se adotar as cautelas necessárias para evitar o agravamento de situação cuja duração pode ser incerta.

A par do raciocínio penal e da adoção das cautelas necessárias, é fundamental dizer que essa pandemia só se enfrentará com solidariedade, respeito à dignidade, isolamento social (o conceito da OMS) e transparência dos atos da autoridade pública.

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*Wagner Roberto Ferreira Pozzer e Lucas Fernando Serafim Alves, advogados integrantes da equipe penal e sócios do escritório Rubens Naves Santos Junior Advogados

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