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Os benefícios flexíveis e a legislação previdenciária

Por Isabel Bueno , Carolina Coimbra e Luiz Fernando Goedert
Atualização:
Isabel Bueno, Carolina Coimbra e Luiz Fernando Goedert. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A conhecida expressão "o direito vem a reboque dos fatos" se aplica bem para contextualizar o cenário dos benefícios flexíveis no Brasil. Nos últimos anos, cresceu no mercado o número de startups, fintechs e empresas de tecnologia que passaram a oferecer às companhias soluções inovadoras que possibilitam a concessão de diversos benefícios aos seus colaboradores - além dos tradicionais vale-alimentação e vale-refeição - por meio de um único cartão. Em alguns casos, inclusive, com a opção de alocar os valores creditados entre os benefícios disponíveis a critério do usuário.

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Essas inovações, muitas vezes disruptivas na forma como a solução é proposta, sem dúvida buscam atender anseios e tentar superar limitações então existentes no mercado. E isso é extremamente bem-vindo!

Em especial, em tempos como os que vivemos, com mudanças nas jornadas do expediente, nos locais de trabalho e nas rotinas pessoais e profissionais, por conta da pandemia. Muitas dessas mudanças, inclusive, permanecerão após o tão esperado fim desse cenário.

Somam-se a isso as novas formas de consumo de bens e serviços que surgiram ou se aprimoraram como respostas às imposições causadas pela pandemia e as tendências de mercado quanto à gestão de pessoas e carreiras profissionais (aqui incluímos discussões quanto à saúde física e mental dos colaboradores, iniciativas para fomentar um maior equilíbrio entre vida profissional e pessoal, entre outros). Justamente por isso, as inovações para o cotidiano têm sido recebidas com entusiasmo.

O contrário a essa euforia está na legislação, em especial a tributária e previdenciária. Como atesta a expressão citada acima, primeiro a sociedade evolui para depois o direito regular as condutas que efetiva e relevantemente acontecem. Significa dizer que muitas dessas soluções podem provocar dúvidas e receios quanto ao atendimento do que exige a legislação para se tratar os benefícios disponibilizados como isentos de tributação.

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Desde a Reforma Trabalhista de 2017, por exemplo, despesas com alimentação suportadas pelo empregador não serão consideradas remuneração, exceto se seu pagamento se der em dinheiro. Não há dúvidas - e a Receita Federal já confirmou essa interpretação - de que cartões de vale-alimentação e vale-refeição não são considerados pagamentos em dinheiro a partir de novembro de 2017.

No entanto, a leitura do Fisco poderá ser diferente se a empresa conceder o valor por meio de um cartão de débito ou de crédito vinculado a uma conta de pagamento, que pode ser livremente utilizada como preferir o colaborador.

O Fisco poderá entender que não haveria diferença entre essa concessão e a de um valor na conta corrente do colaborador para ele usar o cartão de débito do seu banco para adquirir bens e serviços em qualquer estabelecimento. A conclusão poderia ser, então, que o pagamento se deu em dinheiro. Outros benefícios só serão considerados isentos até um limite de valor, como é o caso do vale-transporte ou vale-combustível.

Além disso, nem todo benefício corporativo possui previsão legal para ser isento de tributação, trazendo a possibilidade de o Fisco interpretar que esse benefício, por não estar previsto na lei como isento, deveria ser tratado como remuneração.

Quando misturamos todos esses benefícios em um só cartão, cada qual com regras específicas para não ser entendido como remuneração, podemos sem querer gerar incertezas quanto ao tratamento tributário adequado dessa multiplicidade.

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Infelizmente, se de um lado a concessão dos benefícios flexíveis se consolidou como uma tendência em 2020, por outro a legislação previdenciária pouco avançou para atender a essas novas demandas sociais, decorrentes das novas necessidades pessoais e profissionais.

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Em vistas disso, a resposta para essa situação parece estar em analisar, caso a caso, se as exigências da legislação para fins da isenção estão sendo observadas em relação a cada um dos benefícios, a fim de evitar questionamentos quanto a regularidade do seu pagamento.

Portanto, independentemente da forma como o benefício será concedido, é importante que a empresa observe os requisitos impostos pela lei e adote o tratamento tributário próprio de cada modalidade. Pois, deixar de cumprir os requisitos ou de conferir o tratamento tributário adequado a um dos benefícios incluídos no cartão multibenefício pode implicar em risco de questionamento da totalidade dos valores lá aportados.

Por sorte, essas mesmas empresas que estão inovando com o desenvolvimento dessas soluções já estão, em sua maioria, atentas a essas questões. Muitas já oferecem alternativas para tentar superar as dificuldades impostas por essa legislação que se mostra obsoleta frente a essas novas soluções.

*Isabel Bueno é sócia do escritório Mattos Filho; Carolina Coimbra e Luiz Fernando Goedert são advogados do escritório Mattos Filho

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