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Operação Lava Jato e enfrentamento da corrupção sistêmica: revisitar o passado é a chave para um futuro de sucesso

Por Hamilton Calazans Câmara Neto
Atualização:
Hamilton Calazans Câmara Neto. FOTO: INAC/DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

É bem verdade que, quando se fala em "Operação Lava Jato", há o risco de ânimos se exaltarem, muitas vezes inflados por narrativas falaciosas, voltadas unicamente à proteção de uma pequena classe de pessoas, os que querem, custe o que custar, alcançar a impunidade.

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O mais interessante é que, sob a égide de uma suposta ideia de Garantismo, fundada nos escritos do professor Luigi Ferrajoli, abre-se espaço no Brasil para a propagação de tal fundamento, como se fosse uma regra do tudo ou nada, baseando-se na visão de que você precisa estar de um lado, sendo taxado como garantista ou punitivista, não tendo disponível o lugar para quem apenas deseja ver a aplicação efetiva da Lei.

Com mais propriedade para falar da questão, Douglas Fischer e Frederico Valdez demonstram, de forma clara e inequívoca, que o Brasil tem um compromisso internacional de realizar e concretizar as chamadas obrigações processuais penais positivas, baseadas em uma persecução penal justa e efetiva, contrária aos ideais supostamente garantistas à brasileira, nos quais, a impunidade é a regra e a punição, dentro do rigor da Lei, seria a exceção.

Os casos conhecidos por Anões do Orçamento, Banestado, Satiagraha, Castelo de Areia, Farol da Colina são bons exemplos de um histórico pautado na superproteção aos agentes criminosos, talvez por gozarem de grande prestígio ou por terem à sua disposição a possibilidade de manejar recursos ad infinitum, até alcançarem uma prescrição ou até encontrarem uma falha humana, ainda que mínima, capaz de servir de fundamento para uma possível anulação de condenações, muitas vezes ricas em provas cabais de prática dos ilícitos, que contaram com um apelo interpretativo adaptável à sua respectiva situação.

A Ação Penal 470, conhecida popularmente por Mensalão, e a Operação Lava Jato, pouco tempo depois, evidenciaram um nível de corrupção sistêmica nas mais diversas esferas da política brasileira e, como consequência, das relações empresariais. Algo, neste modelo, já havia sido visto na década de 1990, na Itália, com a Operação Mãos Limpas, tendo sido a sua capital, Milão, apontada por estudiosos como "Tangentopoli", em tradução livre para o português, cidade da propina.

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O que o Mensalão e a Operação Lava Jato foram capazes de demonstrar não foi, como querem levar você a acreditar, um "plano de dominação mundial" de agentes do Poder Judiciário, lembrando que este Poder também precisa repensar a sua atuação e reprimir casos de corrupção presentes nessa esfera.

Na verdade, os marcos históricos, Mensalão e Lava Jato, revelaram um modelo de corrupção desenvolvido por agentes políticos que se diziam representantes do povo, buscando o melhor para o povo e pelo povo, quando, na verdade, serviam-se dele.

Na Itália, a resposta do sistema corrupto foi brutal, tendo desestabilizado e desencorajado, por anos, a luta efetiva contra a corrupção. No Brasil, o sistema busca vingança, normalizando "Mensalões", "Petrolões" e "Rachadinhas", como se tais práticas tivessem sido agregadas à cultura do país.

Não se pretende, com isso, criminalizar a política, pois ela já foi criminalizada por agentes que a utilizaram unicamente com o intuito de enriquecimento pessoal, fazendo-se sempre a ressalva de que há bons políticos e que, por meio deles, será possível realizar mudanças efetivas no país.

É chegado o momento de quebrar paradigmas, normalizando o pensamento e a ação coletiva de que o Brasil não é o país do "jeitinho", voltado ao favorecimento pessoal, com a troca de favores e pagamento de propina, mas um país com pessoas trabalhadoras, responsáveis por, de forma criativa e lícita, driblar o desemprego, a fome, a desigualdade, as péssimas condições da saúde pública, males amplificados como efeito da corrupção sistêmica que impregnou o nosso país, afetando a todos, independente de ser de direita, ser de esquerda ou ser de centro.

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A mudança pela qual tanto esperamos somos nós, sejamos parte da solução.

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*Hamilton Calazans Câmara Neto, advogado, professor, mestre em Direito e Desenvolvimento pelo Centro Universitário de João Pessoa, especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito, autor dos livros Lavagem de Dinheiro no Mercado de Arte: Um Novo Panorama da Criminalidade e Corrupção e Lavagem de Dinheiro: Conexão Brasil-Itália

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção

Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Acesse aqui todos os artigos, que têm publicação periódica

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