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Obrigação da vacina e as contradições brasileiras

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Por Antoine Abed
Atualização:
Antoine Abed. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Uma nova discussão tomou conta dos brasileiros nos últimos meses: tomar ou não a vacina da Covid-19. Os mais diversos argumentos foram elaborados, a favor e contra, com sofisticação ou pobreza de ideias, gerando, assim, uma grande polêmica em torno do tema.

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A decisão gerada pela última instância judiciária brasileira, decidiu, por maioria, que "por um bem coletivo" a vacina seria obrigatória para todos os brasileiros, aplicando-se sanções àqueles que se negassem a receber a vacina.

Segundo o noticiário da CNN Brasil, o Ministro Luís Roberto Barroso afirmou que o Estado pode proteger as pessoas, em situações excepcionais, mesmo contra a sua vontade e, em um trecho de sua decisão, disse que: "A vacinação é importante para a proteção de toda a sociedade, não sendo legítimas as escolhas individuais que afetam gravemente os direitos de terceiros...". Até aqui, não haveria problema algum, pois ninguém seria contra o argumento que foi decidido, ou seja, o melhor para o coletivo.

Porém, se usássemos esse mesmo entendimento para aplicar a outras situações que ocorrem diariamente em nosso pais, será que, dependendo para onde sopra o vento, definiríamos o que é correto ou não para a coletividade?

Vejamos alguns casos que afligem há décadas nossa sociedade para, depois, analisar se é essa a "verdade" que buscamos como sociedade livre e madura.

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Andando por qualquer cidade brasileira encontramos problemas sociais causados pelo uso de drogas.  Não é segredo que toda grande cidade brasileira possui uma região, geralmente uma parte deteriorada do centro, onde centenas de pessoas vivem de maneira precária e completamente à parte da sociedade. Essas regiões, chamadas de cracolândia, concentram um número cada vez maior de indivíduos. Um ambiente nocivo para eles mesmos e perigoso para quem os cerca. Explico melhor: são relatados frequentes roubos e arrastões praticados por viciados para sustentar seu vício. Sem falar dos prejuízos causados para toda a comunidade ao redor, que veem seus imóveis desvalorizar, obrigando-os a procurar outro local para viver.

Outro exemplo terrível, mas que já virou corriqueiro, é a situação de crianças largadas nas ruas fora das escolas. O que esperar de uma sociedade que permite que se tire a inocência das crianças transformando-as em pedintes nos sinais de trânsito?  Impedidas de sonhar com um futuro melhor, qual será o destino dessas crianças daqui a 5 ou 10 anos? Será que elas se tornarão homens e mulheres que participarão e contribuirão para uma sociedade melhor? Ou, usando as palavras do ministro, será que essas escolhas individuais irão afetar gravemente os direitos de terceiros?

Poderia falar ainda sobre a população de rua, indivíduos com problemas mentais jogados à própria sorte, bem como outras contradições que observamos em nossa sociedade. Tudo confirma que estamos no caminho errado, como o nefasto caso do pedido do STF de 7 mil doses de vacina para atender sua prioridade em detrimento do restante da população.

São esses exemplos que nos mostram que a sociedade está cada vez mais imune à capacidade de indignação e, por isso, os escândalos já não produzem reação, seguimos firmes e fortes no caminho do egoísmo e parcialidade. Não consigo enxergar justificativas para me fazer crer que estamos no caminho certo.

O uso do poder para alcançar e perpetuar aquilo que lhes convém continua sendo a regra na política brasileira em que sofismas são usados para convencer o público cego, desorientado e cansado de tantas decepções.

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Por isso entendo que só avançaremos como sociedade quando a seletividade e parcialidade acabarem, principalmente nos formadores de opinião, políticos, professores....

Por fim, Carl Sagan continua mais certo do que nunca quando afirmou que "As nossas preferências não determinam o que é verdade".

*Antoine Abed é presidente-fundador do Instituto Dignidade e autor da obra Ensaio Sobre a Crise da Felicidade

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