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O Supremo Tribunal Federal e os limites do acordo de não persecução penal

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Por Rodrigo Antonio Serafim e Jéssica Raquel Sponchiado
Atualização:
Rodrigo Antonio Serafim. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) foi inserido no Art. 28-A do Código de Processo Penal pela Lei 13.964/2019 como instrumento para se efetivar a ideia de justiça penal consensual, sendo aplicável quando o investigado tiver confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça, desde que o delito tenha pena mínima inferior a quatro anos. De outro lado, as condições a serem cumpridas de forma cumulativa ou alternativa são: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, IV - pagar prestação pecuniária à entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

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Ressalta-se que o ANPP apresenta suma relevância, pois a celebração e o cumprimento do acordo não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º do Art. 28-A, CPP, assim como, uma vez cumprido integralmente, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade.

De acordo com dados do Ministério Público Federal, os crimes de maior incidência dos acordos são: contrabando ou descaminho, uso de documento falso, falsidade ideológica, estelionato, crimes contra o meio ambiente e o patrimônio, crimes contra a ordem tributária, falsificação de documento particular, estelionato majorado, crimes do sistema nacional de armas, fraudes, crimes contra a administração ambiental.

Para além destes delitos, tem tido destaque na mídia o alcance do acordo também no âmbito de crimes eleitorais. Como ilustração, menciona-se o Acordo de Não Persecução Penal firmado entre o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, e a Procuradoria-Geral da República, recentemente homologado pelo ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal. Onyx Lorenzoni foi investigado pela prática do crime previsto no art. 350 do Código Eleitoral, que diz respeito à falsidade ideológica eleitoral, conhecida, popularmente, como "Caixa 2". A investigação partiu da homologação da colaboração premiada de executivos da J&F, os quais demonstraram repasses dos valores concernentes a R$ 100 mil, em 30/8/2012, e R$ 200 mil, em 12/9/2014, por meio de doações eleitorais não contabilizadas. Onyx confessou a prática do crime eleitoral a ele imputado, como condição de realização do ANPP, perante o qual firmou-se o compromisso de pagamento de prestação pecuniária no valor de R$ 189.145,00.

Referido caso ilustra a importância de compreensão do ANPP e do alcance de sua aplicabilidade, se, no caso mencionado, a propositura de uma ação penal resultasse em condenação, poderia torná-lo inelegível a mandatos eletivos.

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Contudo, em sentido geral, pôde-se observar que diversos temas em torno da aplicação do ANPP restaram em aberto, com determinadas ambiguidades, omissões e problematizações, tais como: a natureza jurídica da norma inserida no mencionado artigo; o cabimento da aplicação retroativa em benefício do réu; a possibilidade de aplicá-lo quando o imputado não tiver confessado anteriormente, durante a investigação ou a ação penal. Estes temas serão definidos pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 185.913/DF, cuja relatoria é do ministro Gilmar Mendes. Aguarda-se a pauta de julgamento para a decisão destas discussões em aberto, com destaque à retroatividade do instituto para condenações com trânsito em julgado.

Desse modo, aguarda-se o julgamento do Habeas Corpus perante o Plenário do STF para a definição de todas estas problemáticas que restaram não esclarecidas pelo meio legislativo.

*Rodrigo Antonio Serafim e Jéssica Raquel Sponchiado, sócios do escritório Alamiro Velludo Salvador Netto Advogados Associados

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