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O superpoder da República

Por César Dario Mariano da Silva
Atualização:
César Dario Mariano da Silva. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O Brasil, dos dias atuais, é composto por dois Poderes e um Superpoder da República. Isso mesmo, um Poder que ao mesmo tempo julga, administra o Brasil e legisla. Montesquieu deve estar se revirando no túmulo e pensando no que falhou ao escrever sobre a independência dos Poderes. A nossa Constituição Federal, quando diz que os Poderes da República são independentes e devem conviver em harmonia, foi reescrita pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, que dão às normas de todas as espécies o sentido que quiserem, já que no direito nem sempre dois mais dois são quatro.

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São tipos penais criados por decisão judicial, projetos de lei e medidas provisórias literalmente emendadas mediante interpretações constitucionais extremamente flexíveis.

A última foi emendar a Medida Provisória 966/2020, que traz critérios para a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19.

Como já pude comentar em post publicado no dia 15 de maio deste ano, a MP 966/2020 apenas trouxe critérios do que seja erro grosseiro, regulamentando o artigo 28 da LINDB especificamente no que tange a atos relacionados ao Covid-19. Sem essas novas regras os critérios do que seja erro grosseiro seriam criados pela doutrina e jurisprudência, ou seja, com indesejado subjetivismo e ideologia.

E, mesmo já havendo na MP a definição dos parâmetros para aferir o erro grosseiro, o STF apresentou "emenda" e incluiu outro critério, ou seja, praticar ato que seja contrário ao definido pela ciência, visando, com isso, de forma clara, alcançar alguns atos praticados pelo presidente Bolsonaro ao desconsiderar posição majoritária de órgãos internos e externos relacionados à saúde pública e acolher a outros minoritários.

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Não estou a dizer qual das posições médicas está correta, longe disso, já que não possuo esse conhecimento. O que quero dizer é que a Magna Carta traz as regras do jogo que devem ser seguidas para a conversão, ou não, de uma medida provisória em lei. Assim, o Poder Legislativo possui os instrumentos adequados para rejeitar, alterar ou mesmo deixar a medida provisória perder seus efeitos. Essa função, de acordo com a Constituição Federal, é do Poder Legislativo. Não cabe ao Poder Judiciário, por meio do STF, legislar, criando regras não previstas na MP ou em projeto de lei. Ao Órgão incumbe, dentre outras importantíssimas funções, reconhecer e declarar a inconstitucionalidade material ou formal de uma norma, mas não criar outra, mesmo que seja justa.

Quem deve dizer os parâmetros a serem adotados para o reconhecimento do erro grosseiro no final das contas é o Poder Legislativo. Todas as vezes que um Poder se imiscui em outro, quebrando a interdependência dos Poderes, é instalada crise Institucional. Os parlamentares, bem ou mal, foram eleitos para isso, que não é o caso dos Ministros do STF, que são escolhidos muito mais por razões políticas do que técnicas, trazendo cada um deles ideologia, que vai impregnar suas decisões.

Enfim, os parâmetros a serem adotados para decisão sobre a ocorrência de erro grosseiro, devem ser, em último momento, ditados pelo Poder Legislativo, segundo procedimento próprio previsto na Constituição Federal, sendo vedado ao STF, mesmo que de forma travestida de interpretação constitucional, criar normas ou leis, que não é sua função.

*César Dario Mariano da Silva, procurador de Justiça - SP. Mestre em Direito das Relações Sociais. Especialista em Direito Penal. Professor Universitário. Autor de vários livros, dentre eles Manual de Direito PenalLei de Execução Penal ComentadaProvas IlícitasEstatuto do Desarmamento Lei de Drogas Comentada, publicados pela Juruá Editora

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