Os americanos têm um hobby de prever o futuro. São especialistas em elaborar as dez mega tendências para uma próxima década. Só que a futurologia é uma arte prenhe de incertezas. Difícil acertar. Por isso é que falar em tendências é menos arriscado. Não se promete nada.
A verdade é que o mundo está irreversivelmente imerso na profunda mutação derivada da Quarta Revolução Industrial. E a Quinta está no forno. Muita coisa nova em andamento. A Inteligência Artificial já alterou a forma de conviver e vai mudar muito mais.
Prevê-se que dentro em pouco chegará a vez da singularidade: a Inteligência Artificial pensará por si mesma. Por isso, acredita-se que ela seja a última invenção humana. A partir daí, a tendência seria descartar os humanos. É a era do pós-humanismo. Depois da morte de Deus, da História, chegará a hora da morte do homem.
Antes de que a humanidade provoque por outras vias a sua extinção, como está fazendo em relação à ecologia e à biodiversidade, a Inteligência Artificial poderá ajudá-la a tornar a agricultura mais eficiente, a medicina mais apurada, o planejamento mais exato.
As máquinas também conversarão entre si. Hoje elas obedecem à voz humana. Amanhã, entender-se-ão sem intervenção humana. Os eletrodomésticos se comunicarão por plataformas e os robôs domésticos lembrarão a geladeira de que ela precisa fornecer a lista de aquisições para a família. Será possível até mesmo a geladeira falar diretamente com o e-comerce e encomendar o que falta para abastecê-la.
As casas serão cada vez mais inteligentes. Não será apenas o acender de luzes quando escurecer. Mas o aquecimento quando esfriar, ou o ar condicionado quando esquentar. A abertura automática de portas ou o seu fechamento independentemente da ação humana.
Já não é novidade o equipamento eletrônico presente no relógio ou nos óculos. A tendência será embuti-lo no corpo humano. Chips subcutâneos, que permitirão ao portador conversar com quem quiser sem precisar do smartphone. Ou assistir a uma ópera, ou ouvir a sua seleção de músicas preferida. É possível também incluir um chip no cérebro e corrigir efeitos do mal de Parkinson. A tecnologia fará as pessoas enxergarem melhor, ouvirem melhor e até serem mais pacientes. Nada é vedado para a ciência. Resta saber se haverá entraves éticos. Mas como a ética está em desuso, ousa-se pensar que o mais do que admirável mundo novo será uma realidade bem próxima de nossos dias.
As redes sociais vão continuar ativas, mas vão incluir potencialidades hoje ainda indisponíveis. Por exemplo: conversar ao vivo com várias pessoas; jogar baralho à distância; jogar xadrez! Explorar a realidade aumentada, a computação quântica e exaurir as possibilidades abertas com a internet das coisas.
Tudo será costumizado. Livros poderão ser feitos em casa. Álbuns fotográficos. Roupas, tênis, objetos de uso rotineiro e obras de arte. A computação quântica resolverá macroproblemas e reduzirá ainda mais a esclerosada ideia de soberania. Todos os problemas sérios são planetários. Triste ilusão de que a realidade respeite as convenções tolas como as fronteiras. Somente a ignorância ou o fanatismo podem acreditar que fenômenos como a chuva ácida, as tempestades de gafanhotos, as pandemias, as ilhas de pet que navegam pelos mares, constituam assunto a ser solucionado à luz da soberania.
A concepção surrada de soberania já foi maltratada pelas gangues que exploram menores, contrabandeiam armas e drogas, invadem sistemas eletrônicos tidos como inexpugnáveis.
O Brasil sofrerá o impacto de todos estes avanços, embora com certo atraso. A discussão sobre o 5G ainda engatinha, esbarrando em idiotices e mesquinharias político-ideológicas. Enquanto isso, já se fala em 6G. A parte civilizada do planeta está preparada. A outra, terá de esperar.
Em síntese, a ficção científica ficou para trás, diante do progresso germinado em laboratórios, por gente que leva ciência a sério. Por governos que enxergam a pesquisa como investimento e que, portanto, estão na dianteira. Como merecem estar.
*José Renato Nalini é reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e presidente da Academia Paulista de Letras - 2021-2022