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O que os estudos de marketing social dizem sobre a vacina contra o coronavírus?

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Por Carlos Vormittag
Atualização:
Carlos Vormittag. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

À medida em que as ciências biológicas fazem seu papel no desenvolvimento de uma vacina para a doença do novo coronavírus, a sociedade volta os olhos para o desafio da sua produção, aplicação e distribuição eficaz na população. No coração do problema, a necessidade de massificar a aplicação -- e, portanto, a adesão -- das pessoas à vacina. No Brasil, a discussão pública sobre a aplicação da vacina contra a COVID-19 tem sido dominada pelo discurso legalista que associa o desafio de política pública apenas a uma controvérsia jurídica sobre a obrigação legal de indivíduos aceitarem serem vacinados pelo Estado. O enfoque, além de pouco eficaz, vai na contramão até mesmo das mais recentes recomendações da Organização Mundial da Saúde sobre a não obrigatoriedade da vacina. Tão crucial quanto o próprio desenvolvimento bioquímico de soluções médicas contra a COVID-19, enfrentar a resistência que muitos têm a tomar atitudes, como o uso de máscaras, lavar as mãos, respeitar as normas de distanciamento social e ser vacinado, é etapa indispensável ao sucesso de qualquer solução de saúde pública.

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Mas, senão pela força, como viabilizar a necessária disseminação em massa da vacina? É aqui que entra o marketing social. Para Alan Andreasen, professor de marketing da Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos, o marketing social significa a aplicação de tecnologias de marketing desenvolvidas no setor comercial para a solução de problemas sociais onde o resultado final é a mudança de comportamento.

Assim, nos Estados Unidos, os ex-Presidentes Barack Obama, George W. Bush e Bill Clinton se voluntariaram para serem os primeiros a, em público, receberem suas doses da vacina contra o novo coronavírus, num gesto de construção de credibilidade sobre a segurança e eficácia da medida contra a doença.  A ideia dos ex-Presidentes não é nova, muito menos ousada. Na literatura de marketing social, é unânime o valor dado ao engajamento da população nos processos de mudança social, uma vez que, por maior que venha ser o esforço do administrador público, haverá sempre a necessidade de colaboração -- mesmo da participação -- do público-alvo. Neste sentido, por exemplo, Nancy Lee e Philip Kotler, no seu livro "Marketing social: influenciando comportamentos para o bem", falam já há muito tempo da importância da participação de celebridades em campanhas de vacinação, para ajudar a convencer a população dos benefícios e da segurança das vacinas.

Ao fim e ao cabo, marketing social é uma estratégia de mudança do comportamento. Trata-se de um conjunto de técnicas que combinam os melhores elementos das abordagens tradicionais da mudança social num esquema integrado de planejamento e ação, aproveitando os avanços na tecnologia das comunicações e na capacidade de marketing.

Em "Marketing social: estratégias para alterar o comportamento público", Philip Kotler e Eduardo L. Roberto vão além na explicação, tornando ainda mais evidente a aplicabilidade das técnicas do marketing social no esforço sanitário de vacinação contra a COVID-19. Para os autores, a solução de problemas sociais envolve mudança social, isto é, a alteração da forma de viver das pessoas e dos grupos pela transformação de práticas negativas ou prejudiciais em práticas produtivas, pela mudança de valores e atitudes nas comunidades e em sociedades inteiras, e pela criação de novas tecnologias sociais que suscitem as mudanças desejadas e elevem a qualidade de vida das pessoa, é o que dizem, no seu livro.  Estes autores ainda dizem que a mudança de comportamento visa a induzir o indivíduo a alterar o seu comportamento perante situações que, em geral, lhe são prejudiciais ou afetam um grupo social qualquer. Neste contexto, podem ser citadas campanhas para desencorajar o vício do fumo, do álcool, do uso de entorpecentes, de energia elétrica, entre outros.

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Leve-se ainda em consideração que as ações de marketing social são mais eficazes quando têm duração permanente. Assim, campanhas de vacinação não devem ser feitas apenas em determinadas épocas do ano, mas durante o ano todo, para que a idéia da proteção da vacina permaneça na mente das pessoas: caso contrário, esta idéia pode ser esquecida, ou até mesmo contestada, como ocorre atualmente no mundo inteiro. Afinal, se mesmo a propaganda de marcas consagradas como Coca-Cola é feita constantemente nos principais veículos de comunicação do mundo, com muito mais razão, uma vacina deveria ser lembrada constantemente por campanhas elaboradas pelas autoridades competentes.

Em resumo, a discussão que vem sendo feita, no Brasil no mundo, a respeito da obrigatoriedade da vacina contra o coronavírus -- ou contra qualquer outra doença -- está fora de lugar. O debate público precisa se dar nos termos de conscientização, mais do que de imposição. É, portanto, falar e praticar mais marketing social.

*Carlos Franciso Vormittag, engenheiro e doutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e professor da Faculdade do Comércio de São Paulo (FAC-SP)

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