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O que esperar do relatório final da CPI

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Por André Luís Callegari
Atualização:
André Callegari. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Finalmente chegamos ao relatório final da CPI da Covid. Após meses de trabalho, dezenas de depoimentos, análise de documentos, batalhas jurídicas para investigados permanecerem em silêncio, distinção entre testemunhas e investigados e suas consequências para cada um, produziu-se um relatório final. O que se pode esperar agora?

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Ainda que o relatório apresente uma série de imputações criminais aos investigados, por si só tais fatos não implicam responsabilidade criminal. O paralelo pode ser feito com o inquérito policial, mais tradicional no sistema jurídico brasileiro quando se trata de apuração de atividades ilícitas. Tampouco o indiciamento feito pela autoridade policial implica, necessariamente, atribuição de culpa na esfera penal.

Isso porque no ordenamento jurídico brasileiro o titular da ação penal é o Ministério Público e caberá a ele fazer o escrutínio, dentro de critérios técnicos e jurídicos do que será possível acusar, ou não, os indiciados. O norte dessa apuração determina-se por indícios de autoria e provas da materialidade delitiva em relação a cada um dos indiciados no relatório. Portanto, diante do relatório final o Ministério Público poderá adotar três caminhos: a) oferecer denúncia contra o indiciado porque está presente a prova da materialidade delitiva; b) determinar a baixa do relatório à autoridade policial para complementar as investigações, seja ouvido novamente o indiciado ou outras pessoas, seja determinando a arrecadação de documentos ou de mais provas da materialidade; c) por fim, convencido de que não há elementos suficientes para acusar um dois indiciados, pedirá o arquivamento em relação a ele, claro, sempre de forma fundamentada.

Deve-se deixar claro que muitas vezes o indiciamento, por si só, não é suficiente para a deflagração de uma ação penal. Portanto, o Ministério Público só atuará na certeza de que há material jurídico suficiente para isso, sob pena de acusações injustas que ao fim não resultarão em condenação criminal por ausência de provas.

Dentre as possibilidades jurídicas descritas tem sido mencionada por vários setores a via alternativa da ação penal subsidiária da pública, isto é, quando o Ministério Público, ao receber o caderno investigativo, fica inerte, sem tomar nenhuma posição em relação aos fatos investigados. Neste caso, poderia a vítima substituir o titular da ação penal; isto é, ela mesma faria diretamente a acusação em relação aos fatos produzidos no relatório final. Porém, essa via alternativa, inclusive debatida na CPI, só seria viável na inércia do órgão acusador; em outras palavras: se este, ao tomar ciência dos fatos enviados pela CPI, não adotar nenhum dos caminhos acima apontados.

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De qualquer sorte, a ação penal subsidiária da pública também não é de manejo usual no Brasil e parece-me, salvo melhor juízo, que foi pensada quando temos uma vítima individual, que insatisfeita com a inércia do titular da ação penal, acaba se subsumindo neste direito de acusar. Mas o caso da CPI é distinto. O relatório aponta uma coletividade de vítimas e aí residiria o problema de quem as representariam em juízo.

Esses são os breves apontamentos do que se pode esperar sobre o relatório final produzido pela Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado. Agora resta esperar que as autoridades competentes adotem os caminhos jurídicos necessários para a devida apuração dos fatos.

*André Luís Callegari é advogado criminalista, pós-doutor em Direito Penal pela Universidad Autónoma de Madrid, professor titular de Direito Penal no IDP/Brasília e sócio-fundador do escritório Callegari Advocacia Criminal

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