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'O presidente não diz que deixou de ouvir ou que ouviu', diz OAB

Claudio Lamachia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, deve levar esta semana à Câmara pedido de impeachment de Michel Temer sob alegação de que chefe do Executivo deveria ter comunicado aos órgãos de investigação crimes revelados pelo executivo Joesley Batista, da JBS

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Por Fausto Macedo , Luiz Vassallo e Julia Affonso
Atualização:

Cláudio Lamachia. Foto: Nilton Fukuda/Estadão

A Ordem dos Advogados do Brasil deve protocolar ainda esta semana na Câmara o pedido de abertura de processo de impeachment do presidente Michel Temer. A denúncia está sendo redigida pela Comissão formada pelo Conselho Federal da OAB que atribui a Temer crime de responsabilidade - violação ao artigo 85 da Constituição. No sábado, 20, por 25 votos a 1, a OAB disse 'sim' ao impeachment.

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O argumento central do pedido de impeachment é o conteúdo da conversa gravada pelo executivo Joesley Batista, da JBS, com Temer na noite de 7 de março no Palácio do Jaburu.

O diálogo mostra que o presidente ouviu uma sucessão de crimes narrados por seu interlocutor - Joesley falou no mensalinho de R$ 50 mil para o procurador da República Ângelo Goulart e na mesada milionária para o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha.

Temer alega que o áudio foi adulterado, mas a OAB entende que o presidente, ao ouvir narrativa de crimes de seu interlocutor, deveria ter adotado imediatas medidas junto a órgãos responsáveis por investigações, como o Ministério Público Federal.

A denúncia chegará à Câmara pelas mãos de Claudio Lamachia, presidente da entidade máxima da Advocacia. Ele ainda não definiu se vai levar a denúncia acompanhado de outras instituições e entidades.

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Em pouco mais de um ano na presidência da OAB - assumiu o cargo no dia 1.º de fevereiro de 2016 -. esta é a segunda vez que Lamachia vai à Câmara pedir o impeachment de um presidente.

No ano passado, a Ordem pediu o afastamento de Dilma.

ESTADÃO: Quando o sr. leva a denúncia contra Temer à Câmara?

CLAUDIO LAMACHIA, PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DA OAB: Está sendo preparada a peça para ajuizamento da inicial de denúncia contra o presidente Michel Temer por violação ao artigo 85 da Constituição (crime de responsabilidade). A peça tem que ser embasada na decisão do Pleno do Conselho Federal da Ordem. A partir da conclusão do trabalho, quando a denúncia estiver pronta, vamos definir a data para protocolar o pedido na Câmara. Será muito provavelmente esta semana.

ESTADÃO: Outras instituições acompanharão a Ordem?

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LAMACHIA: Ainda não definimos se vamos convidar outras instituições e entidades para este ato de grande importância para o País, o pedido de impeachment.

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ESTADÃO: Na sessão do Pleno da OAB o presidente teve assegurado o direito de defesa?

LAMACHIA: Evidentemente, autorizamos a sustentação oral para a defesa do presidente, a exemplo de como procedemos um ano atrás, mais ou menos, quando José Eduardo (Cardozo, ex-ministro da então presidente Dilma). Simetria total entre um procedimento e outro, justamente para não alegarem favorecimento mais aqui do que ali, benefício desse partido e prejuízo do outro. Na preliminar (na sessão de sábado, 20) bateram muito na ideia de suspensão dos trabalhos por alguns dias para provar que o áudio (da conversa de Joesley Batista com Temer) é falso. O Plenário decidiu não dar (mais prazo). Rejeitamos a preliminar porque não houve violação ao direito de defesa. Além disso, na Câmara dos Deputados é que vai se estabelecer o contraditório.

ESTADÃO: O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, é aliado de Temer. A Ordem teme um eventual engavetamento do pedido de impeachment?

LAMACHIA: A Ordem acredita e espera que o presidente da Câmara dos Deputados use da sua prerrogativa de forma absolutamente responsável, dando curso ao processamento do pedido de impeachment, onde o presidente da República poderá exercer na plenitude o seu direito de defesa, o contraditório, portanto, a sua tese. Rodrigo Maia tem a prerrogativa e espero que utilize essa responsabilidade de forma a dar curso ao pedido de impeachemnt, oportunizando inclusive ao presidente da República que, no foro competente, faça valer o seu direito de defesa.

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ESTADÃO: É a segunda vez, em pouco mais de um ano, que o sr. leva à Câmara pedido de impeachment presidencial.

LAMACHIA: Eu estou muito triste com o fato de ter que ajuizar dois pedidos de impeachment em menos de um ano e meio de mandato. Assumi no dia primeiro de fevereiro de 2016. Meu primeiro ato na gestão do Pleno do Conselho Federal foi pedir o afastamento, e depois o impeachment, de Eduardo Cunha (ex-presidente da Câmara, preso na Lava Jato desde outubro de 2016). Naquele momento do pedido de afastamento, Eduardo Cunha era o todo poderoso do Brasil, inclusive presidente da Câmara. Ficou provado que ele estava destruindo o País.

ESTADÃO: A conclusão da Ordem é que o presidente violou o artigo 85 da Constituição, ou seja, cometeu crime de responsabilidade?

LAMACHIA: Sem dúvida, sem dúvida.

ESTADÃO: O presidente alega que o áudio da conversa dele com o executivo Joesley Batista foi adulterado.

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LAMACHIA: Se o áudio foi adulterado ou não, se foi cortado ou não, isso é um detalhe que não tem peso na decisão da Ordem. A Comissão da Ordem que examinou previamente o caso levou em conta, nessa decisão do Plenário do Conselho Federal, o que já se conhece do áudio e que não é negado pelo presidente. O ponto central de tudo não está na questão do áudio que, eventualmente, possa ter sido manipulado nesse ou naquele trecho. E sim no fato de que o presidente da República, quando se manifesta sobre o áudio, não nega o fato. Portanto, o próprio presidente não nega o fato, aquilo que está posto ali. Por via de consequência é muito grave o próprio presidente, quando se defende publicamente, quando faz pronunciamento público, e diz que foi gravado de forma indevida, que teve montagem no áudio.

ESTADÃO: Ele diz que recebeu um empresário conhecido dele.

LAMACHIA: Mas ele não diz, em nenhum momento, que deixou de ouvir ou que ouviu. O presidente não afirma em nenhum momento que deixou de ouvir o que ouviu. Foi o que pesou na decisão do Conselho Federal. Independentemente de uma eventual anulação da gravação, por uma suposta adulteração, o próprio presidente não nega que ouviu tudo o que está no áudio, tudo o que foi dito para ele. O que é muito grave. As coisas ditas ali são extremamente graves. O presidente deveria ter tomado medidas imediatas numa situação de tamanha gravidade como essa. Recebendo empresário sabidamente investigado em diversas situações, recebido numa condição fora de agenda, o presidente, no mínimo, deveria ter encaminhado esse tema para os órgãos competentes.

ESTADÃO: O presidente pediu ao Supremo suspensão do inquérito

LAMACHIA: Eu espero só agilidade do Poder Judiciário para que a sociedade brasileira tenha uma reposta sobre os fatos, garantindo ao presidente da República o contraditório e a sua defesa.

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