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O povo brasileiro em 2022

Por José Renato Nalini
Atualização:
José Renato Nalini. FOTO: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Foto: Estadão

O próximo ano é pródigo em celebrações. Duas delas são as que mais despertam o interesse da lucidez tupiniquim. De 13 a 17 de fevereiro de 1922, realizou-se a Semana de Arte Moderna, que teve por palco o Teatro Municipal de São Paulo, inaugurado onze anos antes.

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Em 7 de setembro de 1822, ocorreu aquilo que se convencionou chamar o "Grito do Ipiranga", ruptura entre a colônia - Brasil - e a metrópole - Portugal.

Ambos os acontecimentos merecem várias leituras. O que há de comum entre elas: o povo não participou. Nem da façanha protagonizada pelo Príncipe Regente, Pedro, depois o Imperador Pedro Primeiro, nem das manifestações de alguns eruditos da elite paulistana e carioca, ávidos por criar um acontecimento que mudasse o rumo da cultura pátria.

A Semana de 22 nasceu por sugestão de D.Marinette, esposa de Paulo Prado. Ela sugeriu que São Paulo fizesse uma semana de atividades artísticas, assim como Deauville, na França, realizava a sua semana dedicada aos desfiles de moda.

O trio que assumiu a organização da Semana era formado por Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti del Picchia. Contavam também com a participação de Sérgio Milliet, cuja formação franco-suíça o inclinava a aderir a tudo o que lembrasse a pátria de Anatole France e Michel de Montaigne.

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Menotti era jornalista do Correio Paulistano e íntimo de Washington Luís, o Presidente do Estado de São Paulo. Conseguiu atrair a atenção da elite de cafeicultores que dominava Piratininga. Pensou-se em alugar o Teatro Municipal e uma subscrição teve início com as assinaturas de Paulo Prado e D.Olívia Guedes Penteado.

Logo chamaram Graça Aranha, que se aposentara da diplomacia e cujo "Canaã" não merecera a repercussão esperada. Também convocados a participar Plínio Salgado, Guilherme de Almeida, Anita Malfatti, Vila Lobos, Di Cavalcanti, Brecheret.

Eram exemplares muito representativos de uma intelectualidade. Não havia interesse da população. Do homem do povo.

De igual forma, a Independência do Brasil não foi objeto de grande alarido por parte da "sociedade civil" da época. Nada mudou para ela. Havia grande massa de escravos, que continuou sob a escravidão por mais sessenta e seis anos e a Constituição outorgada pelo "Defensor Perpétuo do Brasil", em 1824, estabelecia o voto censitário. Ou seja: só podia participar, mesmo assim de forma praticamente simbólica, da gestão da coisa pública, aquele que tivesse determinada renda.

De igual forma, o povo não tomou conhecimento do 15 de novembro de 1889, data em que um golpe expulsou o estadista Pedro II, fazendo-o deixar o Rio de Janeiro à noite, como um fugitivo, junto com sua família. Ele teria dito, ao ser expulso de sua terra, à qual oferecera meio século de devoção e sacrifícios, que "todos estavam loucos".

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"Loucos" também foram considerados os jovens que pretenderam acordar o Brasil para o que não se sabia bem se era "futurismo" ou "modernismo". Exposição que agredia o gosto dominante, boicotava toda espécie de classicismo ou de academicismo, poesia que falava em "sapo", uma cabeça de Cristo de trancinhas, de Brecheret, um "homem amarelo", quadro de Anita Malfatti que foi adquirido por Mário de Andrade.

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Por isso os únicos aplausos foram para Guiomar Novaes, enquanto Mário de Andrade era estrondosamente vaiado na segunda noite. Por sinal, diz a lenda que Oswald contratou estudantes para esse estrépito, que daria noticiário para o festival, até então quase ignorado pela mídia.

Agora, com a próxima comemoração de duas efemérides, que entraram para a História do Brasil, a despeito de algumas vozes dissonantes, será que o povo terá vez? Qual será a sua efetiva participação?

Será mero espectador? Ou nasceria uma outra "Semana", para sacudir a nacionalidade e mostrar que a inteligência brasileira tem condições de oferecer um novo projeto de convivência entre os humanos?

Uma nova Semana em 2022 deveria focar a harmonia, a tolerância, o respeito à diversidade, a proteção à natureza, exibir a rota para o efetivo cumprimento da promessa do constituinte, feita em nome do povo, o único titular da soberania, quanto à edificação de uma pátria justa, fraterna e solidária.

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Quem serão os jovens sonhadores, audaciosos e impetuosos que poderão elaborar e defender um projeto viável para o Brasil de 2022?

*José Renato Nalini é reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e presidente da Academia Paulista de Letras - 2021-2022

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