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O passeio de motocicleta e a fuga do método científico como forma de convencimento

Por Paulo Dutra Costantin e Rodrigo Augusto Prando
Atualização:
Presidente Jair Bolsonaro durante motociata em São Paulo. FOTO: ALEX SILVA/ESTADÃO  

O Presidente da República, Jair Bolsonaro, participou de um passeio de moto pelo estado de São Paulo no último dia 12 de junho, organizado por grupos de motociclistas e religiosos. Durante e ao final do evento, foram apresentadas informações nas mídias sociais e tradicionais, que, em grande parte, graças ao clima político polarizado, mostram-se deficitários de racionalidade e verdade. Trataremos, num primeiro momento, de um aspecto quantitativo, o número de motos divulgados; depois, do aspecto qualitativo, relacionado ao discurso do "eu vim de graça", dito pelos presentes e apoiadores do presidente. Vamos, portanto, à razão e aos números.

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A primeira hipótese é o número de motociclistas. As redes sociais de indivíduos e grupos pró-governo indicaram cerca de 1.324.532 motociclistas inscritos no passeio. Sendo mais conservador nos números, tomemos, como exemplo, "apenas" 1.000.000 de motocicletas. A segunda hipótese é a dimensão média das motos e o espaço ocupado por elas. O comprimento médio desses veículos é de 2 metros e, para manter a segurança mínima em deslocamento, há necessidade de distância de 0,5 metro das motos à frente e atrás. Temos o total de 3 metros. A distância lateral de segurança, considerando 0,9 metro do condutor e 0,5 metro de distância lateral, de ambos os lados, é de 1,9 metros. A terceira hipótese é considerar que a rodovia dos Bandeirantes possui 5 faixas em todo o percurso entre São Paulo e Jundiaí e cada pista possui 7,5 metros, podendo estimar 20 motos lado a lado. A quarta hipótese, por fim, é considerar que a distância percorrida do ponto de concentração inicial, na Zona Norte de São Paulo até a cidade de Jundiaí, retornando a São Paulo e deslocando-se até o parque do Ibirapuera, totaliza 150 Km. Lembrando-se: a distância entre São Paulo e Jundiaí pela rodovia dos Bandeirantes é de 57,3 Km.

Terminadas as hipóteses, podemos começar as contas. Um milhão de motos vezes três metros são três milhões de metros. Dividindo três milhões de metros por mil metros (um quilômetro) é igual a três mil quilômetros. Dividindo três mil quilômetros por vinte (correspondendo às motos lado a lado), são cento e cinquenta quilômetros, que corresponde a distância entre as cidades de São Paulo e Limeira. Esta distância teria que ser totalmente preenchida com as motocicletas. Como o passeio foi equivalente a esta distância, indo até Jundiaí e retornando, totalizando 150 quilômetros, toda esta distância teria que ser preenchida de forma ininterrupta e, quando as primeiras motocicletas chegassem ao parque do Ibirapuera, as últimas estariam saindo da concentração inicial. Este fato não foi verificado.

No que se refere ao elemento qualitativo, é evidente a falta de compromisso com a verdade, especialmente, pelos que gritavam "eu vim de graça", fazendo alusão ao pão com mortadela que, muitas vezes, era usado como crítica aos manifestantes da esquerda cooptados pelo lulopetismo. Nada é gratuito. Nada é de graça. Neste passeio de motocicletas, somente o estado de São Paulo teve gastos de, aproximadamente, R$1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais). Superestimando a quantidade de motocicletas, considerarei 20.000 (já que os dados da Polícia Militar indicaram 12 mil), o custo de cada motocicleta para os cofres públicos foi de, no mínimo, R$60,00.

Conclui-se que, em relação às mídias sociais, o método científico e a lógica pura e simples não confirma os números superlativos apresentados pelos bolsonaristas e simpatizantes do governo. Não raro, promotores e apoiadores destes eventos desprezam a ciência, a lógica e os fatos da realidade. À guisa de finalização: você - leitor - é a favor de utilizar recursos públicos escassos para promover políticos que representem ou não seus interesses?

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*Paulo Dutra Costantin, professor doutor e coordenador do Curso de Ciências Econômicas da Faculdade Armando Alvares Penteado (Faap)

*Rodrigo Augusto Prando, professor doutor da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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