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O novo Código de Processo Penal e a ameaça à Justiça

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Por Eduardo Becker
Atualização:
Eduardo Becker. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

O projeto do novo Código de Processo Penal (CPP) discutido na Câmara dos Deputados deverá ser votado em breve pelos parlamentares e trará uma série de mudanças que impactarão de forma definitiva os processos criminais. Uma das alterações propostas, no entanto, oferece um grave risco à Justiça: a dispensa a necessidade da perícia para o relatório final de uma investigação.

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Na legislação atual, o trabalho pericial é imprescindível nos crimes que deixam vestígios e a falta dessa análise pode até ser usada para pedir a anulação do processo.

O caso do menino Henry, por exemplo, poderia ter um desfecho diferente se a regra já valesse hoje. Foi graças ao trabalho da perícia criminal que foi possível indiciar a mãe e o padrasto. As provas técnicas coletadas nos celulares dos suspeitos, o exame necroscópico no corpo da criança e a reconstituição realizada que identificou a falta de veracidade nos depoimentos das pessoas, suspeitos e testemunhas, foram fundamentais para embasar a denúncia do Ministério Público. Sem elas, os responsáveis por um crime tão bárbaro poderiam sair impunes.

Retirar o trabalho pericial de uma cena de crime é permitir que inocentes sejam presos equivocadamente, enquanto culpados ficam soltos, perpetuando a injustiça e a impunidade.

Sem o trabalho da Polícia Técnico-Científica, crimes de grande comoção, como ataques em escolas, chacinas, operações policiais que resultam em mortes, entre outros, deixarão de ter a única prova material científica e isenta capaz de verdadeiramente elucidar os fatos e apontar culpados ou inocentar suspeitos.

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Outro ponto debatido pelo projeto é o uso do DNA para a identificação de criminosos. A coleta de material genético é um elemento capaz de provar a culpa ou inocência de um suspeito e garantir uma decisão justa para um processo judicial.

Trata-se de uma ferramenta mais eficaz até mesmo do que o próprio reconhecimento, pois vítimas e testemunhas, em um momento de tensão e fragilidade, podem identificar pessoas incorretamente, levando um inocente à prisão e deixando um criminoso na rua.

O novo CPP, em seu texto original, retira garantias de autonomia e independência funcional já previstas aos órgãos de perícia criminal. E isso, segundo a ONU e a Anistia Internacional, são fundamentais para garantir investigações imparciais. Segundo essas entidades, a perícia deve ter autonomia e independência para garantir provas imparciais e para neutralizar a ingerência nos laudos elaborados.

Retirar essas garantias representa um retrocesso para a sociedade brasileira e uma ameaça à democracia, pois permitiria que velhas práticas que vivenciamos durante a ditadura voltem a acontecer. E isso a sociedade não pode permitir.

*Eduardo Becker, presidente do Sindicato dos Peritos Criminais do Estado de São Paulo, é graduado em Ciências Biológicas e Segurança da Informação, tem mestrado pelo Departamento de Genética Médica da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, na área de Biomedicina. Já trabalhou na identificação humana por DNA e é especialista em crimes cibernéticos

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