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O mundo não é imbecil

Por José Renato Nalini
Atualização:
José Renato Nalini. Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO

O retrocesso da política ambiental brasileira chegou a tal dimensão, que motivou a reação de agentes insuspeitos. Não são os "ecochatos", os defensores do "mico leão", os comunistas infiltrados nas ONGs que conspiram contra o país que enxergam o futuro plúmbeo para a nossa economia. São economistas como José Roberto Mendonça de Barros ("O agronegócio ameaçado", OESP. 28.06), Pérsio Arida ("Brasil virou pária do investimento internacional", OESP 12.07) e até o ex-Ministro Roberto Rodrigues ("Ilegalidades", OESP 12.07). Todos demonstrando que o único setor exitoso nesta desgraça em que o Brasil mergulhou - o nunca tão louvado agronegócio - naufragará, se não houver urgente e profunda alteração na rota suicida da política anti-ambiental.

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A imagem do Brasil desmoronou no exterior. Enquanto os chargistas multiplicavam o resultado de sua criatividade, estimulada por inacreditáveis manifestações das altas esferas, o setor econômico enxergava mais longe. A mudança climática é o tema de maior relevância para a subsistência da espécie humana e para todas as demais formas de vida. É algo que até criança de país civilizado consegue enxergar. Não fora Greta Thumberg, louvada no planeta, à exceção dos quistos obscurantistas, uma adolescente que sacudiu a inércia mundial.

Os sinais emitidos por um governo que pretendeu ignorar essa tendência foram bem interpretados pela criminalidade organizada. O desmatamento cresceu assustadoramente. A grilagem também. Simultaneamente, o desmonte das estruturas postas a serviço da maior biodiversidade do mundo e da última grande floresta tropical na Terra.

A soltura da boiada e a baciada de ataques à natureza surtiram efeito. Mas o mundo civilizado não é imbecil. Sabe que soberania, surrado argumento dos dendroclastas, é conceito extremamente relativizado. A salvação do mundo interessa a todos. O problema da devastação, da poluição incentivada, do desmanche dos esquemas protetivos ultrapassa fronteiras. É uma ação desafinada que oferece perigo concreto a todos os viventes.

Por isso a reação dos representantes dos Fundos que administram trilhões, advertindo o Brasil de que não haverá continuidade no processo crescente de aquisição de nossas comodities, se essa indecorosa conduta tiver continuidade.

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Os tiros certeiros da comunidade internacional fizeram expressa admoestação às nossas Embaixadas. Os empresários brasileiros aderiram à reação do mercado com a urgência que essa legítima defesa da combalida economia pátria tem de fazer. O Brasil depende das exportações de países que têm sido levianamente ofendidos por quem melhor faria se os cultivasse, em lugar de lamber as botas de quem nos despreza continuamente.

Qual a resposta que se espera?

Se não houver cobro, haverá mais do mesmo. Agora como farsa. Ou seja: 1. Não é uma questão de "narrativa" ou de "falta de comunicação". O mundo inteiro enxerga as queimadas, a destruição do verde, o desrespeito às terras indígenas. A destruição e o extermínio são flagrantes; 2. Viagem de Ministro brasileiro ao exterior é turismo em momento de naufrágio. Os fatos são incontestes e versões edulcoradas não terão o condão de desmentir aquilo que todos assistem.

Há coisas concretas e efetivas que podem ser feitas sem gastar um tostão com propaganda ou com viagens internacionais. Por exemplo: 1. Chamar quem conhece o assunto. Todos os ex-Ministros do Meio-Ambiente se posicionaram. Eles têm experiência. Eles têm tradição no tema. Eles sabem perfeitamente o que custará ao Brasil matar a sua galinha dos ovos de ouro; 2. Chamar a Universidade, os biólogos, os cientistas, os representantes dos Institutos que há tantas décadas atuam na defesa ecológica, não faria mal a quem pretendesse uma súbita demonstração de estar preocupado com a cessação dos bônus de nossa balança comercial; 3. Pedir desculpas e colocar nos lugares devidos os técnicos e especialistas que foram exonerados quando se posicionaram a favor de um patrimônio universal, que nenhum membro de qualquer governo construiu, mas que o atual está a destruir com sanha facinorosa.

Quem tem ouvidos para ouvir, ouça. Não haverá muito tempo para arrependimento, quando o mundo todo se posicionar contra um País que foi padrão de consequente e pioneira tutela ambiental e atuar para por cobro à insanidade.

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Que não é com discursos, promessas vagas, "narrativas" ou turismo pelo mundo civilizado que o ambiente no Brasil voltará a ser a mais valiosa moeda de troca a nosso favor. Aquilo que seria a garantia dos tão desejáveis investimentos externos, sem os quais a queda no buraco sem fundo continuará a sacrificar os brasileiros.

A mensagem da civilização para o Brasil em marcha-a-ré foi muito explícita: é de dinheiro que estamos falando, não de ararinha azul...

*José Renato Nalini é reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e autor de Ética Ambiental, 4.ª Ed., RT-Thomson Reuters

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